Páginas

Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, setembro 21, 2012

A obsessão da mídia

 

Por: Mino Carta, no CartaCapital 
Lula-227x300Por que Lula se tornou a obsessão da mídia nativa? Por que tanta raiva armada contra o ex-presidente? Primeiro é o ódio de classe, cevado há décadas, excitado pelo operário metido a sebo, tanto mais no país da casa-grande e da senzala. Onde já se viu topete tamanho? Se me permitem, Lula é personagem de Émile Zola, assim como José Serra está nas páginas de Honoré de Balzac. O sequioso da emergência que chegou lá.
Depois vem a verdade factual, a popularidade de Lula, avassaladora. E vem o confronto com os tempos de Presidência tucana, e o triste fim de Fernando Henrique Cardoso, o esquecido, no Brasil e no mundo. Assim respondem os meus meditativos botões às perguntas acima. E as respostas geram outra pergunta.
Por que a mídia nativa, intérprete da casa-grande, goza ainda de prestígio até junto a quem ataca diária e obsessivamente se seus candidatos perdem os embates eleitorais decisivos? Memento 2002, 2006, 2010. Mesmo agora, véspera dos pleitos municipais, as coisas não estão bem paradas para os preferidos de jornalões e revistões. Será que o jornalismo brasileiro dos dias de hoje faz apostas erradas? Defende o indefensável?
Na semana passada publiquei os números da verba publicitária governista distribuída entre as empresas midiáticas. Mais de 50 milhões para a Globo. Para nós, pouco mais de 100 mil reais. E sempre há quem apareça para nos definir como “chapa-branca”… E a Editora Abril, então? Na compra de livros didáticos, fica com a parte do leão em um negócio imponente que em 2012 já lhe assegurou a entrada de 300 milhões. Pode-se imaginar o que seus livros ensinam. Enquanto isso, a Petrobras acaba de cancelar um contrato de 11 milhões que estava para ser fechado com a casa do Murdoch brasileiro. Vem a calhar, a confirmar-lhe tradições e intentos, a última capa da sua querida Veja, ponta de lança na estratégia da guerra contra Lula.
A revista de Policarpo Jr., parceiro de Carlinhos Cachoeira em algumas empreitadas, produz esta semana mais uma obra-prima de antijornalismo. Formula acusações gravíssimas contra Lula sem esclarecer quem as faz (Marcos Valério ou seus pretensos apaniguados?), mas nome algum é citado, e o advogado do publicitário mineiro desmente a publicação murdoquiana. Ricardo Noblat (porta-voz de Veja?) informa no seu blog que a Abril vai divulgar o áudio de uma entrevista com Valério, e horas depois comunica que Policarpo Jr. convenceu a direção da Abril a deixar para lá, ao menos por ora.
Quanta ponderação, por parte de Policarpo… Suas relações com Cachoeira CartaCapital provou com documentos tão irrefutáveis quanto inúteis: a CPI não vai convocá-lo para depor, como seria digno de um país democrático, porque o solerte presidente-executivo abriliano foi ter com o vice-presidente da República para lembrá-lo de que se Veja for julgada, todos os demais da mídia nativa entram na dança.
Este específico enredo prova as dificuldades de governar o país da casa-grande e da senzala. É preciso recorrer a alianças que funcionam como a bola de ferro atada aos pés do convicto e padecer como vice o representante de um partido pronto a ceder diante das pressões da Abril. E da Globo, como CartaCapital relatou ao longo da cobertura da CPI do Cachoeira. Resta o fato: a mídia nativa é bem menos poderosa do que os graúdos supõem, inclusive os do próprio governo.
Uma exceção talvez seja São Paulo, com sua capital dos shoppings milionários, da maior frota de helicópteros do mundo depois de Nova York, de favelas monstruosas a rodear os bairros endinheirados, de mil homicídios anuais (5 mil no estado). Refiro-me à cidade e ao estado mais reacionários do Brasil. Aqui tudo pode acontecer. De todo modo, os senhores, de um lado e do outro, caem na mesma esparrela dos jornalistas que os apoiam ou os denigrem. Os jornalistas e seus patrões, na certeza da ignorância da plateia, acabaram por assumir o nível mental que atribuem a seus leitores, ouvintes e assistentes. Os graúdos apoiados agarram-se em fio desencapado, os ofendidos temem um poder em vias de extinção. E não percebem que a tentativa de demonizar Lula consegue é endeusá-lo. 
*Ocarcará

Nenhum comentário:

Postar um comentário