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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, novembro 13, 2012

Mundo do Trabalho: Mais exploração, mais doenças mentais

 Mais exploração, mais doenças mentais

Relações degradantes no ambiente profissional têm resultado no aumento dos casos de trabalhadores com transtornos mentais  



Michelle Amaral - Brasil de Fato



Os motoristas de ônibus estão entre os trabalhadores mais afetados por
transtornos mentais causados pelo trabalho - Foto Roosewelt Pinheiro/Abr



Desânimo, apreensão e angústia. Esses eram os sentimentos que tomavam conta de João* diariamente quando saía de casa para ir ao trabalho. “Cada dia que ia trabalhar era uma tortura, me sentia muito mal quando entrava na empresa”, conta o supervisor de uma central de telemarketing em São Paulo. O que, para ele, parecia apenas uma insatisfação com a função exercida e as pressões do trabalho, acabou se intensificando e, ao procurar ajuda médica, foi diagnosticado como depressão.     
O caso de João não é isolado. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a depressão será a segunda causa da incapacidade para o trabalho até 2020. Atualmente, segundo dados do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), os transtornos mentais e de comportamento ocupam o terceiro lugar em número de benefícios concedidos. “Os transtornos mentais, como as depressões, têm sido uma das principais causas de afastamento do trabalho no Brasil”, relata Myrian Matsuo, psicóloga e pesquisadora da Coordenação da Saúde no Trabalho da Fundacentro, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).   
Em 2011, a Previdência Social concedeu mais de 15 mil aposentadorias por invalidez a trabalhadores vítimas de adoecimento mental. Já os auxílios-doença concedidos por causa de quadros depressivos chegaram a 82 mil em todo o país. “Fiquei alguns dias afastado, tomei remédios e fiz sessões de terapia, o que amenizou um pouco os sintomas da depressão”, conta João. Segundo ele, um fator determinante para sua melhora foi a mudança nas relações em seu ambiente de trabalho. “Minha chefe não nos via como ser humano e, sim, como número para atingir as metas a qualquer custo. Isso mudou quando ela foi substituída por alguém mais compreensível, mais humano”, descreve.       
Péssimas condições de trabalho, jornada de trabalho prolongada, pressão por metas e produtividade, falta de tempo para a realização das tarefas laborais, ausência de pausas para descanso, pouca valorização do trabalhador, participação insatisfatória destes nas decisões das empresas e o medo do desemprego são fatores que contribuem para o aumento da incidência de distúrbios psíquicos entre os trabalhadores, segundo Myrian.     
Assujeitamento
A psicóloga explica que os transtornos mentais relacionados ao ambiente de trabalho atingem funcionários de todos os níveis de hierarquia de empresas públicas e privadas.     
Isto porque, conforme analisa o pesquisador do Centro de Tecnologia e Informação Renato Archer, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Informação (CTI-MCTI), Marco Antônio Silveira, a atividade profissional ocupa uma posição central na construção da identidade do indivíduo e o fato de as instituições serem importantes espaços de socialização, sobretudo nas grandes cidades. “Hoje passamos mais tempo nas empresas do que em casa. Portanto, a forma como o trabalho está organizado e, principalmente, a qualidade das relações humanas impactam fortemente os estados mentais e emocionais das pessoas”, pondera.     
Outro aspecto que contribui para o adoecimento mental dos trabalhadores é a ideia de que o indivíduo deve doar-se completamente à atividade profissional. “As empresas e boa parte da mídia têm se empenhado para mostrar que cada vez mais há menos interesses conflitantes entre trabalhadores e empresas, o que dificulta o estabelecimento do limite subjetivo do trabalhador”, afirma a médica do trabalho e pesquisadora da Fundacentro, Maria Maeno. Essa condição faz com que as contradições existentes no trabalho sejam sentidas pelos trabalhadores como “uma traição” à empresa, gerando neles a culpa por não conseguirem doar mais de si mesmos e, consequentemente, surge o sofrimento psicológico e emocional. “Os ‘fracassos’ são individualizados e os próprios trabalhadores se culpam por não corresponder às expectativas. A individualização e a culpabilização pela impossibilidade de ‘dar conta’ [do trabalho] são aspectos altamente adoecedores”, descreve a médica do trabalho.        
Dessa forma, conforme explica a psicóloga Renata Paparelli, os fatores que levam ao desgaste mental estão relacionados com o grau de assujeitamento ao qual o trabalhador é submetido no processo de trabalho. “Quanto menos controle houver sobre o trabalho, quanto menos possível for adaptá-lo às características de quem o realiza, mais penoso ele será, já que será mais difícil o respeito ao limite subjetivo de cada um”, relativiza.    
Mudanças
A psicóloga defende a necessidade de se colocar limites à exploração da força de trabalho, para que se impeça a precariedade no ambiente laboral e seja permitido ao trabalhador transformar a atividade profissional de modo a respeitar o seu limite pessoal. “Essa possibilidade implica, muitas vezes, em diminuição da produtividade. Daí a importância de estimular políticas que coloquem a saúde dos trabalhadores como fator de competitividade entre as empresas, de modo a transformar os contextos de trabalho adoecedores”, defende Renata.   
De acordo com Myrian, “o empresariado deve repensar o modelo de gestão nas empresas, que visa apenas a produtividade e o lucro em detrimento da vida dos trabalhadores”. Para isto, Silveira afirma que é preciso que se transcenda a contradição inerente aos modelos econômico e empresarial vigentes que, há séculos, têm levado ao conflito capital- trabalho. “[Deve-se] migrar da visão engessada da ‘mais valia absoluta’, que enxerga o trabalhador como ‘mão de obra’, para a situação da ‘mais valia relativa’, onde a qualidade do trabalho e os conhecimentos do trabalhador são considerados”, defende.
Sintomas do adoecimento mental por trabalho
Fadiga crônica, tristeza, irritabilidade, falta de motivação, insônia, isolamento, dificuldade de concentração, déficit de atenção, ansiedade e a sensação de que o fim de semana não é sufi ciente para descansar. 
Caso os sintomas sejam verificados, procure ajuda médica. Uma opção são os Centros de Referência em Saúde do Trabalhador, equipamentos públicos especializados em atender pessoas com problemas de saúde relacionados ao trabalho.
*Mariadapenhaneles

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