No Tijolaco
A Comissão da Verdade está em crise. Dos sete integrantes nomeados por
Dilma, dois já desistiram, e a comissão tem se notabilizado por um
burocratismo excessivo, falta de transparência e, sobretudo, ausência de
uma estratégia de comunicação, fundamental para que se transforme em
algo realmente instrutivo e producente.
Entretanto, talvez o principal entrave a bloquear os trabalhos da
Comissão seja a sua falta de vontade de investigar o papel da mídia na
ditadura. Morando no Rio, perto do centro, eu tive o privilégio de
frequentar a Biblioteca Nacional e ler as edições dos principais jornais
brasileiros nas semanas que antecederam o golpe militar. Houve uma
construção deliberada, de jornais como O Globo, a Folha e o Estadão,
para criar uma atmosfera de golpe. Há inúmeros estudos que revelam a
articulação, muitas vezes patrocinada por agências norte-americanas,
para orientar a mídia brasileira numa direção antitrabalhista,
antinacional e antigoverno.
Nacionalismo e trabalhismo, no Brasil, sempre estiveram associados à
esquerda, visto que nossa direita é, historicamente, vendida ao
imperialismo americano.
A Comissão não pode ser usada apenas para culpar velhinhos de noventa
anos que torturaram subversivos quarenta anos atrás. Estes deveriam sim
ser condenados, como fizeram nossos vizinhos. Mas os tubarões, aqueles
que efetivamente contribuíram para o golpe, foram grandes empresas, com
ênfase nas empresas de mídia. O Brasil precisa conhecer a maneira pela
qual essas empresas se consolidaram e assumiram uma posição hegemômica
no setor de comunicação social.
A concentração da mídia e do mercado de publicidade é um fenômeno
mundial, que aconteceria com ou sem ditadura. Mas com a ditadura, ele se
deu de maneira muito mais brutal, com artificialismo e enorme
interferência estrangeira.
A Comissão investigará, por exemplo, o apoio dos Estados Unidos às Organizações Globo, antes e depois da ditadura?
Se quiser se conhecer a si mesmo, o Brasil precisa enfrentar essas
questões. Não por revanchismo, mas por razões acadêmicas, históricas e
políticas. O Brasil merece a verdade. O Brasil merece saber, em
detalhes, de que lado a Globo ficou quando a democracia brasileira foi
brutalizada, e de que lado permaneceu enquanto ela foi torturada.
Seguramente há muitas histórias de corrupção por trás da consolidação do
império global durante o regime, que nossos jovens precisam conhecer.
Até para que as novas gerações não cometam os mesmos erros das antigas,
de se deixarem levar por campanhas midiáticas agressivas, moralizantes,
de cunho antidemocrático.
A Comissão da Verdade, se não quiser ser conhecida como Comissão da Covardia, precisa responder às ruas, que estão gritando:
A verdade é dura, a Globo apoiou a ditadura!
Por: Miguel do Rosário
*ajusticeiradeesquerda
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