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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, agosto 19, 2011

Raça Humana (2009)



(Brasil, 2009, 42min.- Direção: Dulce Queiroz - TV Câmara)
Sinopse Oficial: O país do orgulho da miscigenação, apregoado por Gilberto Freire e Darcy Ribeiro, se deparou há alguns anos com uma questão espinhosa: a adoção de cotas raciais nas universidades. Se falar de racismo no Brasil já era tabu, falar de cotas, então, se transformou num daqueles temas sobre os quais é melhor nem iniciar conversa. A menos que estejamos em um grupo onde todos são favoráveis ou todos contrários. Aí, sim, dá para desabafar os inconformismos, de um lado e de outro.
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É neste clima de “assunto proibido”, discutido só entre os pares, que os entrevistados do documentário Raça Humana, produzido pela TV Câmara, começam a desfiar o intrincado novelo das cotas. Durante três meses, a equipe que trabalhou no documentário acompanhou a rotina de uma das maiores universidades do país: a Universidade de Brasília-UnB, que de forma tão ousada quanto isolada adotou o sistema de reserva de vagas com recorte puramente racial.
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No documentário, alunos cotistas e não-cotistas, professores, movimentos organizados, partidos políticos e representantes da instituição falam abertamente sobre o “tabu” das cotas raciais, seja defendendo ou condenando o sistema. Ao mesmo tempo, o documentário mostra ações externas à universidade que permeiam ou influenciam a discussão, como a votação do Estatuto da Igualdade Racial, em tramitação no Congresso - também cercada de muita polêmica, protestos e impasses.
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No documentário, questões seculares e mal-resolvidas da história do Brasil vão ressurgindo, tendo como pano de fundo a discussão das cotas raciais. Ao refletir sobre a reserva de vagas para negros no ensino superior, os entrevistados revelam que a discussão vai muito além: envolve o papel das universidades brasileiras; as falhas do sistema educacional; a questão da meritocracia nos vestibulares; o racismo e, principalmente, o papel do negro na estrutura sócio-educativa do país. É nesse caldeirão de questões que o documentário Raça Humana mergulha e mostra que, para além das reações muitas vezes apaixonadas, raivosas ou até intolerantes, está em pauta no Brasil uma discussão histórica, que não pode ser desprezada.
...)
A situação vivida hoje pela UnB é, ao mesmo tempo, peculiar e universal – uma amostra do Brasil contemporâneo, ainda cheio de preconceitos, mas também capaz de refletir sobre a sua história e reconstruí-la a partir de novos parâmetros. Atualmente, o sistema de cotas da UnB está sendo contestado no Supremo Tribunal Federal pelo partido Democratas e deve ter seu futuro definido ainda em 2010. Embora a ação de Descumprimento de Preceito Fundamental seja direcionada apenas à UnB, a decisão a ser tomada pela Corte vai valer para todas as universidades que adotem algum tipo de cota racial em seus vestibulares.
*Docverdade

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