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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

segunda-feira, novembro 21, 2011

Marta anuncia apoio a Haddad e diz que estilo de “ir na jugular” a fez desistir das prévias


Marta Suplicy: senadora afirma que se engajará na campanha de Haddad e tentará resgatar marcas de sua gestão

Por Raymundo Costa | VALOR
De Brasília
Após conversar durante uma hora e meia com o ministro Fernando Haddad (Educação), em Brasília, a senadora Marta Suplicy anunciou ontem que vai apoiar e se engajar na campanha do candidato escolhido pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para disputar a Prefeitura de São Paulo, nas eleições municipais do próximo ano.
Marta desistiu porque Haddad é o nome preferido de Lula. Ela não assegura que venceria a prévia contra a dupla Haddad-Lula. “É uma interrogação”, diz. Mas de uma coisa ela se diz absolutamente convencida: a disputa “estralhaçaria” o PT.
Ela defende o instituto das prévias, mas reconhece que a disputa, desta vez, seria diferente da que foi obrigada a disputar em 1998 para sair candidata ao governo do Estado, quando teve como adversário um companheiro, Renato Simões, minoritário no partido. Serviu para ela conhecer o Estado e a militância.
“Eu não sou uma pessoa que faz o debate numa “nice”. Eu vou na jugular”, diz Marta, para explicar sua desistência. “Pra que que eu ia fazer um trabalho para os adversários”? Segundo a senadora, isso seria inevitável numa disputa entre ela, Haddad e os deputados federais Jilmar Tatto e Carlos Zarattini, os pré-candidatos às prévias canceladas do PT.
“Se eu ganhasse, sobraria um partido rachado, com ódio mortal dos apoiadores do Haddad; e se o Haddad ganhasse sobraria uma pessoa também bastante avariada”. A senadora afirma: “Eu não podia fazer isso com o meu partido, porque tem o ‘day after’. O que é que iria acontecer, depois, com ele ou comigo? Aí a gente acabaria com a chance de o PT ir para a prefeitura”.
Em entrevista ontem ao Valor, Marta deixou claro que a campanha de Haddad recorrerá muito ao fato de que o ministro terá mais condições de governar a cidade do que o PSD ou PSDB, por ser um aliado da presidente da República. “Outras cidades importantes, como o Rio de Janeiro, se beneficiaram enormemente com recursos federais, em várias áreas”, diz a senadora, depois de criticar o atual prefeito, Gilberto Kassab, que, segundo a senadora, não quis ou não soube como carrear dinheiro federal para São Paulo.
Na conversa com o ministro, a senadora também combinou o “resgate” das marcas do governo do PT na cidade, ou seja, do governo de Marta (2001-2005), como a retomada do conceito original dos CEUs. “Eu acho que esse legado tem que ser resgatado. Porque a gente tem que mostrar que sabe fazer, tem que mostrar que o outro finge que faz e tem que mostrar o novo”, diz.
Mostrar o que é o novo é o desafio de Haddad, segundo Marta. O dela é “como colocar essas marcas [de seu governo] em outra candidatura [de Haddad]. Mas é um desafio que eu vou me empenhar em fazer”.
Para que isso aconteça, o PT vai precisar de tempo de rádio e de televisão para contar o “passado” e apresentar o “novo” – a administração de Fernando Haddad no Ministério da Educação. Marta está convencida de que PT e PMDB farão uma aliança para a eleição, só não está segura se isso ocorrerá no primeiro ou no segundo turno.
Para a senadora, este é um assunto a ser resolvido pelo vice-presidente, Michel Temer, e o deputado federal Gabriel Chalita, que se filiou ao PMDB na expectativa de ser o candidato a prefeito da sigla, em São Paulo, em 2012. O Valor apurou com outras fontes do PT que Lula, antes de se recolher para tratamento de saúde, trabalhava no sentido de que Chalita fosse indicado candidato a vice na chapa de Haddad. Quando disputou a reeleição, em 2004, Marta dispensou o apoio do PMDB.
A senadora se recusa a falar sobre a eventualidade de compor o ministério da presidente Dilma Rousseff, na reforma prevista para 2012, mas é certo que seu nome faz parte do leque de opções da presidente.
Apesar da “frustração” que sentiu ao deixar a disputa paulistana, Marta é só elogios, quando fala de Dilma, ao modo como ela conseguiu imprimir uma marca própria ao governo e como tem lidado com as sucessivas crises no ministério. “Acho que ela conseguiu uma forma particular, muito dela, de deixar os próprios partidos perceberem quando retirar os seus ministros, e manter a sua base, sem a qual ela não aprova um projeto em quatro anos”.

Entrevista: Marta anuncia apoio a Haddad e critica gestão de Kassab

Por Raymundo Costa | Valor
BRASÍLIA – A senadora Marta Suplicy (PT-SP) virou a página. Não nega um certo sentimento de “frustração” por ter renunciado à disputa pela Prefeitura de São Paulo em favor do ministro Fernando Haddad (Educação), um noviço na política apoiado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas a ex-prefeita acredita que a manutenção de seu nome nas prévias do PT, que estavam previstas para o dia 27, “estraçalhariam” o partido. “Eu faria uma prévia na jugular. Eu não podia fazer isso com o meu partido, porque tem o ‘day after’”. E o dia seguinte seria o ódio dos partidários de Haddad, se ela vencesse as prévias, ou exatamente o contrário, caso o ministro fosse o vencedor. Marta acertou os termos de seu apoio numa conversa com Haddad, em Brasília, na noite de quarta-feira. Nesta entrevista ao portal Valor, ela fala ainda da possibilidade de aliança com o PMDB e critica acidamente o ex-prefeito José Serra (PSDB) e seu sucessor, Gilberto Kassab (PSD).
Valor – Como a sra. avalia o fato de o PT trocar uma candidata que lidera as pesquisas, em São Paulo, por um nome desconhecido?
Marta – Para mim, ter saído da disputa é página virada. No momento em que se toma uma decisão como eu tomei, o engajamento na campanha do escolhido pelo partido é total. Eu sou uma pessoa absolutamente partidária, sempre me portei assim.
Valor – A sra. vai se engajar na campanha de Fernando Haddad?
Marta – Daqui para frente é um outro momento. O Haddad é o candidato. Ontem conversou comigo e ele é o candidato. Não sobrou ninguém para candidato. [A senadora ri numa referência à “desistência” de todos os candidatos para apoiar o nome indicado por Lula]. E no momento em que eu me comprometi apoiar quem fosse o candidato do partido, ele é o meu candidato e eu vou me engajar para que ele fique mais conhecido para que nós possamos chegar na Prefeitura de São Paulo. O que me interessa agora é ver o PT de volta à prefeitura e levar minha cidade para um outro momento, longe de um governo medíocre que foi o governo Kassab. Serra-Kassab. Foi um governo muito ruim para a cidade de São Paulo.
Valor - Por quê?
Marta – Enquanto o Brasil cresceu enormemente e cidades muito menos poderosas que São Paulo tiveram um benefício muito grande por parte do governo federal,  a cidade de São Paulo, por absoluto descaso e falta de interesse do prefeito, não realizou nenhum convênio importante com o governo federal. Outras cidades importantes, como o Rio de Janeiro, se beneficiaram enormemente com recursos federais, em várias áreas.  Além disso, a dificuldade do prefeito de gastar os recursos de São Paulo também é bastante incompreensível. Por que um governo que tem a carência que tem na área de saúde, a cidade esburacada, suja e o povo de rua em um número gigantesco, tem R$ 7 bilhões aplicados no mercado financeiro, como ele tem mantido durante sua gestão? É incompreensível.  Nenhum governo com tantas carências como tem São Paulo pode deixar superávit e dinheiro parado no banco.
Valor – Por exemplo?
Marta - São Paulo tinha um projeto antigo, da minha gestão, de renda mínima. Esse projeto depois foi transformado no Bolsa Família, com ajuda federal. Só que 150 mil pessoas poderiam estar cadastradas, e a cidade de São Paulo não moveu uma palha. Tem o mesmo número da época em que eu era prefeita (2001-2005). E não é porque a cidade de São Paulo se tornou mais rica. Há uma parte da população de São Paulo extremamente miserável. Poderia estar sendo beneficiada, mas o prefeito Kassab não fez nenhum gesto para incluir o programa Brasil Sem Miséria. O (governador Geraldo) Alckmin está começando a implementar essa parceria de maneira mais forte, que também está vagarosa. A cidade de São Paulo poderia ter feito vários convênios na área da Educação, Justiça. Não houve isso. Esses oitos anos de Serra e Kassab são anos em que o Brasil teve crescimento extraordinário, comparado com a época anterior, da qual eu fui prefeita.
Valor – A sra. quer dizer que foram anos perdidos?
Marta - O que aconteceu nesses oito anos? O Brasil teve enorme crescimento, as receitas começaram a se ampliar, tanto é que o Kassab hoje trabalha com o orçamento três vezes maior do que o que eu trabalhava, R$ 37 bilhões. Desde o começo, ele não tem uma marca na cidade. E nos trabalhamos primeiro com R$ 9 bilhões – depois com R$ 13 bilhões – e deixamos marcas na educação, no transporte público – criamos o bilhete único e acabamos com as máfias – começamos a fazer os corredores de ônibus que a cidade precisava, deixamos 300 quilômetros planejado, e ele fez um quilômetro. Não é que ele fez dois, fez zero. E a desculpa que ele coloca é que tem muito carro. É evidente que tem muito carro, porque tem “boom” econômico e o brasileiro vai comprar carro. Estaria difícil o transporte? Estaria. Mas não nesta dimensão. Nós, sem um tostão, conseguimos deixar marcas na cidade. É que as pessoas esquecem. Nós tiramos o PAS da cidade (programa de Paulo Maluf). A saúde era privada. Ele tirou o SUS, São Paulo não recebia o recurso federal. Fora não receber, era privado e absolutamente corrupto. Nós levamos dois anos para conseguir trazer o SUS de volta para a cidade
Valor - Mas essas são marcas associadas à sua gestão.
Marta – Esse é o grande desafio, como é que nós vamos agora colocar essas marcas em outra candidatura. Mas é um desafio que eu vou me empenhar em fazer.
Valor – O Haddad se comprometeu com essas marcas ou foi apenas uma conversa breve?
Marta – Não, foi uma conversa longa de uma hora e meia sobre a cidade de São Paulo, o que é a experiência de governar a cidade e o que eu considero que vão ser os grandes desafios que a cidade terá de enfrentar e que ele, como candidato e depois como prefeito, vai ter que dar continuidade ou inovar. Insisti muito para ele que, primeiro, é um resgate do bem feito que foi na cidade para a população; do fingir que fez, como o que o PSDB fez com os CEUs – faz propaganda de que nós fizemos 21 e eles fizeram 25, mas esquecem de dizer que os 25 que fizeram foi terreno que nós deixamos comprados e que 21 foram feitos em quatro anos. Eles fizeram 25 em oito. E o conceito, isso é o mais grave, foi mudado. Porque o CEU não é para ser um grande escolão. O CEU é para ser uma janela de oportunidade para quem não tem nenhuma janela de oportunidade na vida, que mora numa favela onde os pais, muitas vezes, nem alfabetizados são. O CEU é isso, tem o esporte e a cultura absolutamente agregados para fazer com aquela criança uma formação holística que ela não teria oportunidade de ter em outro lugar; de aprender a tocar um violino até aprender a tocar numa big-band, hidroginástica para mãe e avó; ioga e teatro do primeiro mundo. Isso era o CEU. Isso tem de ser desmistificado. Porque essa é a diferença nossa com o PSDB. Então, eu coloquei. Eu acho que esse legado tem que ser resgatado. Agora, ninguém ganha a eleição com o passado.
Valor – Mas ajuda?
Marta – Ajuda, porque a gente tem que mostrar que sabe fazer, tem que mostrar que o outro finge que faz e tem que mostrar o novo, e esse é o grande desafio para você. Agora, para o nosso partido é pensar o novo, porque a continuidade você pode facilmente assumir esse compromisso, com todo o nosso empenho.
Valor – A sra. concorda que é preciso uma cara nova na eleição?
Marta – Eu não concordo nem discordo. Para mim, são águas passadas. Acabou. Eu queria ter sido [candidata], achei que teria o reconhecimento da população, que está muito saudosa do governo. Eu ando na rua e vejo, eu pego o avião e vejo. Isso é uma realidade, não tem como negar. Agora, não foi assim? Não foi assim. Quero que o PT volte à prefeitura porque amo a minha cidade? Quero. Vou me esforçar para viabilizar a candidatura petista? Vou.
Valor - A sra. vai efetivamente se engajar na campanha?
Marta - Vou. Eu viro a página. O meu sentimento foi um sentimento de frustração. Agora, eu virei a página. Ele é o candidato, agora tem que trabalhar o candidato. Ele é o prefeito de volta na prefeitura para fazer o que tem que ser feito na minha cidade, porque os outros candidatos não vão fazer o que nós fizemos.
Valor – Então vamos falar pra frente. A sra. foi criticada, em 2004, por não fazer uma aliança com o PMDB. Como vê agora a possibilidade de o deputado Gabriel Chalita ser o vice de Haddad?
Marta – Aquela falta de aliança com o PMDB tem uma história muito complicada, que eu não vou entrar de novo porque é página virada. Acho o PMDB um parceiro muito importante para o PT em São Paulo, seja para o primeiro turno, se for possível. Se não for, no segundo. É muito importante. Principalmente, pela possibilidade de mostrar o que já fizemos, ao dar maior visibilidade ao nosso candidato, que ainda não tem esse conhecimento todo. Então, quanto mais tempo de televisão a gente tiver para poder mostrar o que foi a gestão do Haddad no ministério e as coisas positivas que ele conseguiu realizar, melhor. Porque você vai levar para a população um nome novo, mas um nome que tem uma bagagem. Se não tem esse tempo, como é que vai apresentar um candidato novo?
Valor – E a possibilidade de ser o Chalita?
Marta - O Temer e o Chalita é que vão avaliar. Eu acredito que a aliança vira, ou no primeiro ou no segundo turno. A palavra final é do PMDB.
Valor – A possibilidade de aliança com o PSD é nula mesmo?
Marta – Nunca! A base petista não aceitaria nunca. Não tem hipótese. Zero. Que campanha você vai fazer se põe o Kassab dentro do teu partido? Não tem sentido nenhum. Não tem possibilidade nenhuma.
Valor – Por que a sra. está tão convencida de que o Serra vai ser candidato?
Valor – Pelos motivos óbvios de quem lê nas entrelinhas políticas. Ele tem um script. Está repetindo o roteiro: o seu aparecimento cada vez maior, a defesa da parceria com o PSD, o pedido do senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) de adiamento das prévias, tudo faz parte do mesmo quadro. Vai ser de novo PSDB versus PT.
Valor - A “solução paulista” parece que será estendida ao país: o PT, que sempre fez prévias, agora tem outra postura. A sra. acha boa essa opção?
Marta - As prévias são um instrumento bastante interessante. Eu mesma posso dizer, quando disputei as prévias para governador do Estado com o Renato Simões, que tinha poucas chances de ganhar porque eu tinha o apoio majoritário. A mim fizeram muito bem. Porque eu percorri o Estado inteiro conversando com a militância, discutindo e aprendendo. E assim como esses 35 encontros zonais que nós fizemos, e que não eram prévias, tinham outra característica, esse contato com a militância… Eu dou risada quando o PSDB diz ‘nós temos que empolgar a militância’; eles não têm militância, eles vão ter que catar gente para fazer essa prévia. Se fizerem algum dia. O PT, não. O PT tem uma militância aguerrida, que se eu fosse até o final das prévias e tivesse me empenhado realmente, teria… Era um ponto de interrogação o que iria acontecer. Esses contatos mostraram a todo mundo isso.
Valor – Então o que lhe fez desistir?
Marta - Fora o apelo da Dilma e do Lula, também foi que estraçalharia o partido. Eu não sou uma pessoa que faz o debate numa “nice”. Eu vou na jugular. Pra quê que eu ia fazer um trabalho para os adversários. A prévia de que eu participei foi uma coisa de aprendizado. Uma prévia com o Jilmar Tatto (deputado federal), com o Haddad e com o outro (deputado federal Carlos Zaratini) seria uma prévia na jugular. O que sobraria dessa prévia para quem ganhasse? Se eu ganhasse, sobraria um partido rachado, com ódio mortal dos apoiadores do Haddad. E se o Haddad ganhasse, sobraria uma pessoa também bastante avariada. Eu não sou pessoa que faria uma prévia parceira. Eu faria uma prévia na jugular. Eu não podia fazer isso com o meu partido, porque tem o “day after”. O que é que iria acontecer, depois, com ele ou comigo? Aí, a gente acabaria com a chance de o PT ir para a prefeitura. Não teria sentido. Teria sido um bom treino para ele. Mas não era o caso.
Valor - E a imposição desse modelo para todos os Estados?
Marta – Depende da situação. Em São Paulo, certamente não seria um bom caminho [as prévias].
Valor – Que contribuições, a partir de agora, Marta Suplicy pode dar ao partido e ao país?
Marta - A grande contribuição eu acabei de dar. Você quer maior?
Valor – O governo Dilma lhe empolga?
Marta – Acho que ela está indo bem. Era muito difícil suceder o Lula. Acho que ela tem duas vantagens: primeiro de ser mulher e ter as características específicas de personalidade dela, e depois de ter um governo bem arrumado, um governo do qual ela participou de seu plano estratégico de desenvolvimento. Então, ela ser mulher e ter uma personalidade absolutamente diferente do Lula, e ser percebido isto de forma clara desde o primeiro segundo, a diferenciou. Ninguém iria exigir dela as coisas que o Lula faz, que são dele. O carisma, o desempenho. Ela, não. Ela é mulher e tem outro jeito, sim. Então, isso ajudou muito, para ela. A outra questão foi ter participado de todo o planejamento estratégico do governo Lula. Ela sabia a direção que o Brasil tinha que caminhar.
Valor – Essa queda seriada de ministros não prejudica o governo?
Marta – Eu acho que ela está sendo de uma habilidade extraordinária e surpreendendo até os seus adversários. Porque não é fácil você governar do jeito que a eleição do Brasil é, e a constituição do Congresso. Precisa ser trapezista, ter uma habilidade extraordinária para conseguir a aprovação de projetos importantes para o Brasil e, ao mesmo tempo, não pactuar com o que aparece. Ela tem sido extraordinária nessa questão. Acho que ela conseguiu uma forma particular, muito dela, de deixar os próprios partidos perceberem quando retirar os seus ministros, e manter a sua base, sem a qual ela não aprova um projeto em quatro anos.
(Raymundo Costa | Valor)

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