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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

domingo, novembro 27, 2011

O impeachment do prefeito Kassab

Para descobrir quem são os doadores da campanha de um candidato, não é preciso ser um grande conhecedor de política. Basta olhar quais empresas “vencem” as “licitações” e enriquecem em seu mandato. No caso de Gilberto Kassab, essa empresa foi a Controlar. Depois de ter despejado uma dinheirama na campanha do atual prefeito, a empresa foi generosamente recompensada com o contrato milionário de inspeção veicular e saciou apetites de políticos da base aliada (como Eduardo Jorge, do PV, secretário de meio ambiente) e de vários empresários envolvidos.
Para beneficiar amigos, vale qualquer negócio, até mesmo ressuscitar um contrato caduco de 1996, ceder irregularmente terrenos da prefeitura para a empresa se instalar e ainda dar R$ 900 mil dos cofres da prefeitura para ela investir. Entre as mais de 30 fraudes encontradas, o prejuízo aos cofres públicos chegam a R$ 1,1 bilhão.
Filiado ao PL pelas mãos de Guilherme Afif, Gilberto Kassab foi eleito vereador em 1992 e integrou o “centrão”, núcleo do toma-lá-dá-cá na câmara. Mais tarde, em 1997, já pelo DEM (então PFL), Kassab foi secretário de planejamento do governo Celso Pitta, uma das administrações mais desastrosas que a cidade de São Paulo já viu. Até que, em 2004, se tornou vice na chapa de José Serra nas eleições municipais.
Dois anos depois, quando Serra abandonou a prefeitura para disputar o governo do estado, Kassab ganhou de presente o cargo de prefeito. Nas eleições municipais de 2008, escudado por Serra, concorreu a reeleição. Mentiu descaradamente, maquiou os problemas de São Paulo, investiu pesado na rejeição da ex-prefeita Marta Suplicy e conseguiu se eleger para mais quatro anos. O resultado é uma espécie de segunda gestão Pitta.
A incompetência já era conhecida. Nenhum plano de contenção contra as enchentes, falta de investimento em transporte público, semáforos constantemente quebrados, aumento da tarifa de ônibus. De certa forma, dadas as baixíssimas expectativas, era até esperado. Mas foi agora, no ano de 2011, que Kassab definitivamente perdeu a vergonha e mostrou quem realmente é. Primeiro largou a cidade para trás para cuidar da fundação de seu novo partido, o PSD, filho legítimo da falta de caráter com o fisiologismo (teve fraude até em assinaturas nas filiações). Depois fez novos amigos lá na CBF e no Corinthians, participando ativamente dos conchavos para financiar o Itaquerão. E, para consumar a tragédia, adulterou o valor do próprio salário e depois aumentou-o sem nenhum pudor.
Kassab nunca me enganou quanto a falta de escrúpulos, mas conseguiu me enganar quanto ao estilo. Achei que ele seria o próximo Maluf da política paulistana. Errado: Kassab está muito mais para Sarney do que para Maluf. É o tipo de político profissional que entra para a política pela porta dos fundos, que puxa os sacos e tapetes certos e chega ao poder por elevação.É o tipo de político que conhece a sordidez do sistema e opera muito bem pelos bastidores, seja para atingir adversários, seja para costurar acordos.
Dessa vez, o ministério público entregou provas concretas, que dão base jurídica para um pedido de impeachment. O bom senso nos diz que a única alternativa digna ao prefeito seria pedir para sair. Mas nada disso vai acontecer. Mestre da cooptação, Kassab, a essa altura, já deve estar se reunindo com o MP para costurar um acordo que seja vantajoso para ambas as partes. Se tudo der certo para ele, suas contas serão aprovadas por alguma manobra jurídica.
E como tudo sempre pode piorar, em 2014 ele ainda poderá concorrer ao governo do estado, contando com a amnésia e com o analfabetismo político do povo.Governantes escarnecendo cidadãos faz parte de nosso cotidiano, mas fazia tempo que o paulistano não era chamado de otário tantas vezes seguidas. Será que dessa vez ele vai reagir? Gostaria muito de acreditar nisso, mas o nosso histórico de obediência, apatia, egoísmo e conivência mostra que os fatos apontam para a direção contrária…
*Amigos do Presidente Lula

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