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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, abril 04, 2014

O que é um “auto de resistência”?


O auto de resistência é uma medida administrativa criada durante a Ditadura Militar para legitimar o extermínio protagonizado pelas forças policiais. Ou seja, naquela época, quando a polícia entrava em conflito com um “bandido”, um comunista, ou seja lá o que fosse, ela eventualmente o matava e alegava que houve resistência a prisão. Procedimento padrão.
O problema é que a Ditadura acabou (?), e a prática do “auto de resistência” continuou firme e forte. Os números de mortes violentas envolvendo ações patrocinadas pelo Estado é assustador. Com uma população quase oito vezes menor que a dos Estados Unidos, o Estado de São Paulo registrou 6,3% mais mortes cometidas por policiais militares do que todo os EUA em cinco anos (2005/2009), levando em conta todas as forças policiais daquele país. Dados divulgados pela Secretaria de Segurança Pública de São Paulo contabilizam 2.045 mortes.
Agora, tratando especificamente de ações policiais registradas como “autos de resistência”, de 2010 a 2012, 2.882 pessoas foram mortas , isso em São Paulo, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul e Santa Catarina. É claro que resistências acontecem, em diversos casos existe o confronto, mas isso precisa ser investigado, não basta apenas um documento da polícia dizendo que fulano morreu porque resistiu.
Diante desse cenário surgiu o Projeto de Lei 4.471/12, que prevê a investigação de qualquer morte violenta envolvendo forças policiais.
O Projeto também veta o transporte de vítimas em confronto com agentes policiais, já proibido no Estado de São Paulo, isso porque, curiosamente, no mesmo Estado, durante o ano de 2012, 95% dos feridos em confrontos policiais transportados pela polícia ao hospital, morreram no trajeto.
Tão importante quanto combater a violência policial e práticas criadas pela Ditadura, é mudar a visão da população, e nesse sentido o Projeto foi bem inteligente, trocando o nome de “auto de resistência” para “morte decorrente de intervenção policial”.

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