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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quinta-feira, julho 02, 2015

Com nova manobra de Cunha, Câmara aprova redução da maioridade penal


Presidente da Câmara coloca tema em pauta novamente, provoca polêmica e bate-boca com deputadosre
Gustavo Lima / Câmara dos Deputados
Eduardo Cunha
Presidente da Câmara colocou em pauta nova emenda sobre o tema e foi acusado de passar por cima da democracia
Um dia depois de rejeitar a redução da maioridade penal, a Câmara dos Deputados analisou o tema novamente e decidiu, nesta quinta-feira 2, diminuir de 18 para 16 anos a idade penal no Brasil no caso específico de crimes como homicídio doloso, lesão corporal seguida de morta e atos infracionais hediondos. A votação foi possível por conta de manobra orquestrada, mais uma vez, pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Com a ajuda da oposição, o deputado colocou em pauta uma emenda aglutinativa sobre o mesmo assunto, com trechos da proposta já rejeitada no dia anterior e apenas algumas mudanças. Nesta segunda votação, 323 parlamentares votaram a favor e 155 contra e a emenda acabou aprovada. Apesar disso, a proposta precisa ser analisada de novo em segundo turno antes de seguir para o Senado.
O texto aprovado sugere que adolescentes podem ser punidos como adultos, a partir dos 16 anos, se cometerem crimes com “violência ou grave ameaça, crimes hediondos, homicídio doloso, lesão corporal grave ou lesão seguida de morte”. A diferença em relação ao texto rejeitado na madrugada desta quarta-feira 1º é que foram excluídos da redução os crimes de tráfico e roubo qualificado. Para os deputados, Cunha passou por cima do regimento interno e deveria ter colocado para votação, na verdade, o texto original (que reduz a maioridade penal para todos os crimes). 
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Por isso, a emenda acirrou os ânimos e provocou críticas de deputados do PT, PCdoB, PSOL, PSB e até do PMDB.  “Não podemos votar texto morto. Não pode montar aglutinativa com texto rejeitado. Os incisos 4 e 5 fazem parte do texto principal dessa emenda aglutinativa, mas foram rejeitados ontem”, criticou a deputada Jandira Feghalli (PCdoB-RJ). “Não podemos jogar o regimento no lixo. A presidência não pode atropelar a decisão deste Plenário. Não pode querer ganhar no tapetão”, complementou.
O deputado Glauber Braga (PSB-RJ) chegou a bater boca com o Cunha ao dizer que pretende levar o caso ao Supremo Tribunal Federal (STF). “Isso aqui é o parlamento, não é a casa de Vossa Excelência, onde o senhor manda e desmanda”, ironizou. Mas o presidente da Câmara seguiu rebatendo e interrompendo os argumentos contrários, de forma impaciente. “A Presidência não admite a falta de respeito por parte do parlamentar. Vossa Excelência tem direito de ir ao STF, como vários de vocês têm feito sem êxito”, minimizou o deputado.
O PSOL chegou a divulgar uma nota explicativa sobre o que chamou de “golpe de Eduardo Cunha”. “Essa emenda aglutinativa somente poderia ser votada após a votação do texto principal, desde que ele fosse aprovado. Para que a emenda fosse votada antes do texto principal, deveria ter sido feito, antes da votação de ontem, um destaque de preferência para sua votação. Esse destaque, no entanto, não foi feito”, diz comunicado publicado pelo partido.
Apesar de dizer que a manobra respeita o regimento interno da Câmara, antes do início da sessão, Eduardo Cunha admitiu à imprensa “raiva” e vontade de “reinterpretar” o regimento para poder colocar o assunto em votação novamente, como de fato conseguiu. “Eu estou com raiva que eu não posso votar. Eu pretendo que se reinterprete o regimento para que eu possa votar”, disse Cunha ao portal G1.
Sem conseguir retirar a proposta da pauta, alguns partidos encaminharam obstrução no momento da votação para "não legitimar" a manobra de Cunha, em forma de protesto. Esse foi o caso do PCdoB e do PSOL. PT e PV também chegaram a fazer essa orientação, mas voltaram atrás e optaram pelo "não" à redução da maioridade penal. Como justificativa, o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) classificou a emenda de "um estupro do regimento interno da Câmara".
Debate entre oposição e governo
O deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS) foi voz dissonante dentro do próprio partido. Perondi disse que a mudança vai repercutir mal nos tribunais e não vai resolver a questão da criminalidade. “A saída é o Estatuto da Criança e do Adolescente. Não adianta vender carne de picanha e oferecer carne de terceira”, disse Perondi, que também pediu aos deputados que não ouçam “à imbecilidade da internet”.
Algum tempo depois, o líder do PMDB, deputado Leonardo Picciani (RJ), salientou que respeita as posições divergentes do partido, mas defendeu que jovens entre 16 e 17 anos que cometem crimes hediondos sejam julgados e condenados como adultos. “O PMDB vai reafirmar a sua posição. A proposta é equilibrada, ela é restrita e é a resposta que a sociedade anseia não por capricho, mas porque não aguenta mais a impunidade”, disse.
O clima também ficou tenso entre deputados do governo e da oposição. Houve empurra-empurra depois que o parlamentar Aliel Machado (PCdoB-PR) disse em discurso que um projeto social o salvou da "delinquência", Isso porque o deputado Ildo Rocha (PMDB-BA) perguntou de forma irônica, na sequência, quantas pessoas ele havia "matado".
*cartacapital

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