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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quarta-feira, fevereiro 08, 2012

PM: Entulho autoritário

Pesadelo difícil de acabar...



Do Viomundo

Crise na Bahia: papel da PM precisa ser revisto, dizem especialistas

Violência de policiais militares em greve por reajuste salarial na Bahia reabre debate sobre necessidade, organização e atuação de segurança pública fardada. Segundo sociólogo especializado em PM, caso expõe ‘crise estrutural’ das polícias no Brasil. Para o antropólogo Luiz Eduardo Soares, ex-secretário Nacional de Segurança Pública no primeiro ano de governo do ex-presidente Lula, mais do que discutir a legitimidade ou não desta greve específica, é preciso acabar com o vínculo entre polícias militares estaduais e Exército.

por Najla Passos, na Carta Maior

Brasília – Homicídios, roubos, saques. Confrontos entre manifestantes e forças policiais federais. A violência explode nas ruas da Bahia, enquanto policiais militares de capuz na cabeça e armas em punho amotinam-se na Assembleia Legislativa, atrás de aumento salarial. As notícias que chegam do estado assustam e reacendem debate sobre o papel da polícia militar (PM), organização que tem no DNA a repressão popular e foi fartamente utilizada pela ditadura de 64 contra adversários.

O Brasil precisa de policiamento ostensivo feito por pessoas com cabeça e treinamento militar? PMs devem ter o direito à organização sindical como outras categorias, algo negado a militares? São perguntas com respostas difíceis e que desafiam até governos trabalhistas, como é o caso na Bahia, onde as negociações parecem não avançar.

Para o antropólogo Luiz Eduardo Soares, ex-secretário Nacional de Segurança Pública no primeiro ano de governo do ex-presidente Lula, mais do que discutir a legitimidade ou não desta greve específica, é preciso acabar com o vínculo entre polícias militares estaduais e Exército.

“A estrutura organizacional da segurança pública no Brasil, herdada da ditadura, é um arranjo negativo para todos, que prejudica a sociedade, os governos e os próprios trabalhadores policiais”, afirma. “Se o cordão umbilical da PM com o Exército não for cortado, teremos sempre o grito das ruas, a chantagem e o acuamento dos governos.”

Segundo ele, apesar de as PMs terem funções diversas das atribuídas às Forças Armadas, elas são subordinadas não só aos governos estaduais, mas ao próprio Exército. E isso implica proibição de organização sindical. Sem liberdade para se organizarem de forma democrática, às vezes insatisfações funcionais explodem em praça pública.

“E quem acaba liderando essas explosões não são lideranças legítimas, qualificadas, com experiência política, mas quem fala mais alto, consegue mobilizar as paixões e não se intimida em chantagear os governos para alcançar seus objetivos”, afirma.

Para o antropólogo, não é com vandalismo, armas e máscaras que trabalhador deve se organizar. Mas ele acredita que os governos também são culpados, ao fazer “vista grossa” a reivindicações dos PMs.

Especializado em polícias militares, o sociólogo Romeu Karnikowski lembra que elas surgiram depois da proclamação da República como milícias a serviço de oligarquias locais. “A baiana, inclusive, participou ativamente da repressão à Canudos”, afirma, em referência ao movimento de caráter religioso liderado por Antônio Conselheiro no fim do século 19.

Segundo o sociólogo, com a centralização do poder militar no Exército, sob controle federal, as polícias militares assumiram a exclusividade do policiamento ostensivo nos estados. “As polícias militares deveriam ter sido extintas, mas foram reativadas pela ditadura para atuarem como forças repressivas, e não como polícias de segurança”.

A violência contra a casta mais baixa dos PMs só se agravou no período. “A submissão dos praças sempre foi tão grande que, até a Constituição de 1988, eles não tinham sequer o direito de votar nas eleições”, conta.

Mas o “desaquartelamento” da corporação trouxe benefícios, na opinião do estudioso. “Jogados no policiamento ostensivo, os policiais ficaram mais expostos ao contato com a população civil e começaram a desenvolver outra percepção de cidadania. A capacidade reivindicatória cresceu. A luta de classes dentro das polícias, que estava latente, só se intensifica”, afirma.

Para Karnikowski, é neste contexto que a greve da PM baiana precisa ser analisada. “Mais do que um movimento reivindicatório, é uma manifestação da crise estrutural das polícias brasileiras e uma luta social que, infelizmente, parte da esquerda não sabe como lidar. Um exemplo disso é o governador Jacques Wagner [PT] enviar tropas para cercar a Assembleia Legisltiva da Bahia, tensionando ao limite essa crise”.

O governador estava no exterior em viagem com a presidenta Dilma Rousseff, quando o motim começou.

O comando do Exército na jurisdição dentro da qual está a Bahia, a VI região militar, pertence ao general Gonçalves Dias. O general foi chefe da segurança do ex-presidente Lula durante os oito anos de mandato do petista. G.Dias, como era conhecido nos tempos de Presidência, é quem está à frente das operações militares hoje na Bahia contra os amotinados.
*Tecedora

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