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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, janeiro 11, 2013

Manifestação maciça da população em apoio ao governo venezuelano, para a mídia, é golpe de Estado. O seqüestro do presidente, em 2002, sim, era a "volta da democracia". Mas o povo derrubou essa "democracia", botou as elites golpistas pra correr e trouxe o presidente eleito de volta. E agora o apóia, mesmo com a mídia em histeria convulsiva.

Venezolanos se concentraron en los alrededores de Miraflores para apoyar al presidente Hugo Chávez. FOTO: Alberto Corro
Nas manifestações políticas do Brasil, os fotógrafos dos movimentos sociais precisam buscar ângulos que não deixem aparecer a pouca quantidade de manifestantes, os vazios da suposta multidão, que revelariam a incapacidade de mobilização social dos tais movimentos - que ainda não aprenderam a falar a língua da população, cegos em seu fanatismo ideológico que os divide em pequenos grupos inimigos e praticamente estéreis. As "conquistas das lutas populares" tão ao gosto destes ceguetas, como a jornada de oito horas de trabalho, o 13º, as férias remuneradas e outras, foram todas obtidas durante uma ditadura, a de Vargas, no objetivo de cooptar a massa trabalhadora. Objetivo alcançado com sucesso, haja visto a eleição de Vargas anos depois, apesar da pesada campanha da parte mais reacionária das elites brasileiras. Mas os crentes da ideologia fazem parecer que são frutos da "sua" luta (um ponto comum entre esses grupelhos é se arrogarem a representação dos "legítimos interesses" da população como um todo. Pretendem-se guias das massas, conhecedores das verdades universais e dos caminhos da revolução, acusando os que não lhes comungam os dogmas de traidores do povo, de vendidos, de pelegos ou de demônios, o que dá tudo no mesmo. Sua arrogância impede a visão da sua própria esterilidade social - sempre digo que, com seu linguajar e seus preconceitos, a única maneira desses caras conduzirem as massas é ir entregar pizzas, pães, bolos e tortas).

Poucas manifestações puderam ser fotografadas de longe, como as das diretas já, densas e massivas - já com meio apoio empresarial, que pressionava pela retirada dos militares do governo. A sociedade já estava sob controle do poder econômico, As forças armadas já tinham cumprido sua função e começavam a atrapalhar os grandes lucros das multinacionais, com o nacionalismo de alguns setores militares e as trapalhadas que a repressão burra estava fazendo. A escola pública já estava destruída, as comunicações dominadas, o povo ignorantizado, desinformado e conformado havia algumas gerações, os focos de resistência dizimados. Então, saíram os militares e entraram as marionetes da falsa democracia. Não entendo pessoas instruídas e informadas falando em "redemocratização", quando o que me parece óbvio é que a ditadura apenas colocou a máscara de democracia e tirou a cara feroz dos militares, por conveniência dos poderes reais - muito acima dos institucionais. A ditadura continua, muito pior, aliás, porque travestida de democracia reconhecida até mesmo pela mais ferrenha oposição institucionalizada, que colabora, talvez inconscientemente, com a construção do cenário que simula essa falsa democracia.

As manifestações de ontem, na Venezuela, levam ao desespero e à mais aberrante histeria as elites locais, defensoras dos interesses mega empresariais, sobretudo os estrangeiros que as sustentam em seus privilégios como pagamento pelos seus serviços no saque das riquezas naturais, do patrimônio público e na exploração do povo. Fotografias puderam ser tiradas dos altos dos prédios, revelando a dimensão dessa movimentação que levou milhões a Caracas, de todas as partes do país e do mundo, aumentando o ódio explícito da mídia defensora dos mega-exploradores multinacionais.

Venezolanos se concentraron en los alrededores de Miraflores para apoyar al presidente Hugo Chávez. FOTO: AFP

Eu estava no bar aqui em frente, ontem, e assisti, estarrecido, à fala do famoso ipanemense da mídia, afirmando mentiras absurdas, com ódio incontido, contra toda a movimentação latinoamericana em favor da revolução bolivariana que trata de resgatar o Estado para sua própria população. Qualquer pessoa que busque informações além da mídia percebe as incríveis distorções e falcatruas, os arghumentos malabaristas e as mentiras explícitas daquele verme elitista. Ele não fala para esses poucos e não tem pudor diante dos que sabem. É muito bem pago pra formar opinião da massa sabotada em instrução e informação, sem condições de consciência pra se defender dessas mentiras, e da classe média anestesiada, que precisa justificar sua alienação e seu consumismo predatório com esses ataques a qualquer tentativa de diminuir os abismos sociais que transformam a sociedade nesse inferno em que vivemos, exceto nas bolhas privilegiadas, embora estas precisem se armar de defesas contra a barbárie, vítimas preferenciais da criminalidade oriunda das situações de miséria e ignorância provocadas pela ditadura financeira.

Venezolanos se concentraron en los alrededores de Miraflores para apoyar al presidente Hugo Chávez. FOTO:@tmaniglia

Na sua crônica ele minimiza a massa apoiadora do governo venezuelano, hipertrofia uma oposição elitista e desmoralizada, acusa o chanceler brasileiro de ir a Cuba "receber as ordens dos irmãos Castro", denuncia ridiculamente um golpe na Venezuela - um absurdo jurídico que ficará, como sempre, impune - e acena dramaticamente com o fim do mundo, "estamos perdidos", o que se aplica, espero, ao predomínio das elites sobre as populações da América Latina, tão sacrificadas, saqueadas, massacradas, espoliadas e exploradas durante séculos de colonização institucional, política e econômica. Fácil de entender, difícil não se revoltar com o descaramento da mídia e seus porta-vozes sem caráter. Não há o menor compromisso com a verdade, apenas com os interesses empresariais mais desumanos, mais perversos, mais covardes e criminosos. Sem o menor constrangimento, a aberração midiática fantasiada de comentarista afirma que há 60 mil guerrilheiros cubanos na Venezuela prontos pra atacar a oposição. Uma oposição anêmica, caricata, ridícula, sem força nem expressão, derrotada repetidamente e em vias de extinção, que se destrói por si mesma e está desmascarada em seu país - tratado até a chegada de Chávez à presidência como sua propriedade privada. O que Cuba tem na Venezuela são professores e médicos, cerca de 40 mil, com o que o governo fez chegar à massa da população excluída o ensino e a medicina que até então haviam sido negados. Essa é a força do governo venezuelano e da revolução bolivariana. A tomada de consciência de grandes parcelas da população que perceberam qual é o papel do Estado na sociedade e porque este não cumpria suas obrigações constitucionais.

Venezolanos se concentraron en los alrededores de Miraflores para apoyar al presidente Hugo Chávez. FOTO: Reuters


Artigo de Altamiro Borges, no Blog do Miro, comentando as posições da mídia a respeito da Venezuela:
http://altamiroborges.blogspot.com.br/2013/01/quem-sao-os-golpistas-na-venezuela.html

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