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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

segunda-feira, janeiro 21, 2013

Presidente do Uruguai rejeita residência oficial e vive sem regalias



Vários líderes mundiais vivem em palácios. Alguns gozam de regalias como ter um mordomo discreto, uma frota de iates ou uma adega com champanhes vintage.E há José Mujica, o ex-guerrilheiro que é presidente do Uruguai. - Matéria do jornal New York Times

Ele mora numa casa deteriorada na periferia de Montevidéu, sem empregado nenhum. Seu aparato de segurança: dois policiais à paisana estacionados em uma rua de terra.Em uma declaração deliberada a essa nação pecuarista de 3,3 milhões de pessoas, Mujica, 77, rejeitou a opulenta residência presidencial de Suárez y Reyes, com seus 42 empregados, preferindo permanecer na casa onde mora há anos com a mulher, num terreno onde eles cultivavam crisântemos para vender em mercados locais.

Seu patrimônio líquido ao assumir o cargo, em 2010, era equivalente a cerca de US$ 1.800 -o valor do Fusca 1987 estacionado na sua garagem.Ele nunca usa gravata e doa cerca de 90% do seu salário, principalmente para projetos de habitação popular.Seu radicalismo discreto -notavelmente diferente da época em que ele empunhava armas para tentar derrubar o governo- exemplifica a emergência do Uruguai como o país mais liberal da América Latina em questões sociais.

O governo Mujica chamou a atenção por tentar legalizar a maconha e o casamento homossexual, por colocar em vigor uma das mais abrangentes leis da região sobre o direito ao aborto e por ampliar fortemente o uso de recursos renováveis, como as energias eólicas e de biomassa.Para que a democracia funcione adequadamente, argumenta Mujica, os líderes eleitos deveriam ser postos um degrau abaixo. "Temos feito todo o possível para tornar a Presidência menos venerada", disse ele.

Poucos poderiam imaginar que Pepe, como é conhecido, chegaria a esse cargo. Ele foi líder da guerrilha urbana Tupamaros, responsável por sequestros e assaltos a bancos.A polícia o capturou em 1972, e ele passou 14 anos preso, sendo mais de uma década em confinamento solitário, às vezes num buraco no chão. Passava mais de um ano sem tomar banho, e seus companheiros, segundo conta, eram uma perereca e ratos com os quais ele partilhava migalhas de pão.

Mujica raramente fala sobre a sua época na prisão, que diz ter sido um tempo para refletir. "Aprendi que sempre se pode recomeçar."

Ele entrou para a política e, em 2009, ganhou a eleição por ampla margem.

As doações que faz o deixam com um salário em torno de US$ 800. Mujica disse que ele e a mulher, a senadora Lucía Topolansky, uma ex-guerrilheira que também esteve presa, não precisam de muito para viver.O Uruguai aparece consistentemente entre os países mais seguros, menos corruptos e menos desiguais da região. Sua economia continua crescendo confortavelmente, a uma taxa de 3,6% ao ano. Mas nem todos aprovam o estilo de Mujica.

As pesquisas mostram que a popularidade dele está em baixa. Mas Mujica diz "não estar nem aí para isso".

"Se eu me preocupasse com as pesquisas, não seria presidente", diz ele.

Mujica lamenta que tantas sociedades priorizem o crescimento econômico, o que vê como "um problema para a nossa civilização", devido à demanda sobre os recursos do planeta.

Os olhos de Mujica se iluminam ao evocar uma passagem de "Dom Quixote" em que o cavaleiro errante toma vinho de um chifre e come carne de cabra salgada com seus anfitriões pastores, fazendo uma arenga contra "a pestilência da galanteria".

"Os pastores de cabras eram as pessoas mais pobres da Espanha", disse Mujica.

"Provavelmente", acrescentou, "eram as mais ricas". 
*Osamigosdopresidentelula

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