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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quarta-feira, janeiro 23, 2013

  A mídia como exército regular



Buscar a presença de diversidade e pluralismo nos meios de comunicação significa se irritar todos os dias com a ausência deles.

João Brant, via Brasil de Fato

Quando se analisa a ligação entre comunicação e política, a tendência é olhar para a cobertura do período eleitoral ou para os escândalos políticos. São, de fato, dois bons termômetros. Mas entre uma eleição e um escândalo há o noticiário do dia a dia, aquele que fala dos fatos de hoje que serão esquecidos depois de amanhã, mas que ajudam a consolidar o entendimento de cada um sobre o mundo.

Não dá para falar de como os meios de comunicação contribuem para a disputa de hegemonia sem olhar para esse “varejo”. Quase todos os especialistas ouvidos pelos noticiários de televisão têm pensamento alinhado com o da emissora – em geral, liberal do ponto de vista econômico e conservador no campo político. Os mesmos nomes se repetem em várias emissoras, muitas vezes sem especialidade alguma sobre o assunto.

Pois bem, escrevo esse texto no dia em que assisti a um programa de debates da GloboNews sobre a situação política da Venezuela. Os três convidados tinham abordagens diferentes, mas todos em torno de um certo ponto de partida comum, que enxerga Chavez como um ditador e o chavismo como um fenômeno a ser derrotado. Nenhum deles ousou ao menos se perguntar por que será que o povo apoia Chavez e suas políticas.

Já há mais de 15 anos que estudo os meios de comunicação e é evidente que essas coisas não me surpreendem mais, como não devem surpreender a nenhum leitor deste Brasil de Fato. Mas o problema está justamente aí. A exclusão de determinadas vozes do noticiário e dos raros programas de debate é tão comum que nós já naturalizamos este fato. Buscar a presença de diversidade e pluralismo nos meios de comunicação significa se irritar todos os dias com a ausência deles. Nestes casos, não é raro a resignação se tornar uma autodefesa.

É claro que a experiência pessoal de cada um e os espaços alternativos de informação, em especial na internet, ajudam a contrabalançar este quadro. Mas o cenário ainda é muito desigual. Como avaliou outro dia o sociólogo Emir Sader, “eles têm o exército regular, nós só contamos com a guerrilha”.

João Brant é coordenador do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social.

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