A mídia como exército regular
Buscar a presença de diversidade e pluralismo nos meios de comunicação significa se irritar todos os dias com a ausência deles.
João Brant, via Brasil de Fato
Quando se analisa a ligação entre comunicação e política, a tendência é
olhar para a cobertura do período eleitoral ou para os escândalos
políticos. São, de fato, dois bons termômetros. Mas entre uma eleição e
um escândalo há o noticiário do dia a dia, aquele que fala dos fatos de
hoje que serão esquecidos depois de amanhã, mas que ajudam a consolidar o
entendimento de cada um sobre o mundo.
Não dá para falar de como os meios de comunicação contribuem para a
disputa de hegemonia sem olhar para esse “varejo”. Quase todos os
especialistas ouvidos pelos noticiários de televisão têm pensamento
alinhado com o da emissora – em geral, liberal do ponto de vista
econômico e conservador no campo político. Os mesmos nomes se repetem em
várias emissoras, muitas vezes sem especialidade alguma sobre o
assunto.
Pois bem, escrevo esse texto no dia em que assisti a um programa de
debates da GloboNews sobre a situação política da Venezuela. Os três
convidados tinham abordagens diferentes, mas todos em torno de um certo
ponto de partida comum, que enxerga Chavez como um ditador e o chavismo
como um fenômeno a ser derrotado. Nenhum deles ousou ao menos se
perguntar por que será que o povo apoia Chavez e suas políticas.
Já há mais de 15 anos que estudo os meios de comunicação e é evidente
que essas coisas não me surpreendem mais, como não devem surpreender a
nenhum leitor deste Brasil de Fato. Mas o problema está justamente aí. A
exclusão de determinadas vozes do noticiário e dos raros programas de
debate é tão comum que nós já naturalizamos este fato. Buscar a presença
de diversidade e pluralismo nos meios de comunicação significa se
irritar todos os dias com a ausência deles. Nestes casos, não é raro a
resignação se tornar uma autodefesa.
É claro que a experiência pessoal de cada um e os espaços alternativos
de informação, em especial na internet, ajudam a contrabalançar este
quadro. Mas o cenário ainda é muito desigual. Como avaliou outro dia o
sociólogo Emir Sader, “eles têm o exército regular, nós só contamos com a
guerrilha”.
João Brant é coordenador do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social.
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