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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quinta-feira, janeiro 17, 2013

Marta rechaça elitismo 

 

Por Altamiro Borges

Na quinta-feira passada (10), a Folha publicou um editorial raivoso contra o chamado “Vale-Cultura”, rotulado de “vale-populismo” já no título, e abusou dos adjetivos para desqualificar a ministra Marta Suplicy. Na visão elitista do jornal, a nova lei “é mais um exemplo do uso equivocado de dinheiro público na área cultural do país”. A Folha prefere que a grana dos impostos seja usada somente para bancar os juros dos rentistas. Ela também adora os milhões de reais que recebe de publicidade do governo – que só serve para alimentar cobras!

Pela nova lei, trabalhadores que recebem até cinco salários mínimos poderão receber o “Vale-Cultura” de R$ 50 mensais. Desse valor, R$ 45 serão subsidiados pelo governo por meio de renúncia fiscal. “Estima-se que serão beneficiados 10 milhões de assalariados”, diz a Folha, para torpedear: “O argumento fácil da ‘democratização da cultura’ sempre pode ser esgrimido para justificar o espetáculo populista. Mas parece óbvio que essa não é a melhor estratégia para empregar tais verbas públicas”.

O editorial elitista da Folha, que inclusive afirmou preconceituosamente que o dinheiro seria usado para “livros de autoajuda”, deve ter gerado chiadeira dos seus leitores – pelo menos da parcela que ainda tem senso crítico. Tanto que hoje o jornal abriu espaço para a ministra da Cultura, Marta Suplicy, defender o projeto. Reproduzo a resposta na íntegra:

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"A gente não quer só comida"

A Folha publicou editorial ("Vale-populismo", 10/1) crítico do Vale-Cultura (VC). Chama de "populismo" e promoção pessoal e eleitoreira projeto de lei que buscava aprovação desde 2009. Com a regulamentação do VC, empresas poderão passar R$ 50 a seus funcionários que recebam prioritariamente até cinco salários mínimos (R$ 3.390) para gastarem em cultura.

O Brasil nos últimos anos, com Lula e agora Dilma, tem dado passos gigantescos para acabar com a miséria. Não preciso citar os números dos que hoje comem nem dos que hoje entraram na classe média. O Bolsa Família, trucidado pela oposição, hoje é comprovadamente um instrumento de erradicação da pobreza.

O Vale-Cultura pode, sim, ser o "alimento da alma". Por que não? Pela primeira vez o trabalhador terá um dinheiro que poderá gastar no consumo cultural: sejam livros, cinema, DVDs, teatro, museus, shows, revistas...

Lembro que, quando fizemos os CEUs (Centro Educacional Unificado), na pesquisa (2004) realizada no primeiro deles, na zona leste, 100% dos entrevistados nunca tinham entrado num teatro e 86%, num cinema. Quando Denise Stoklos fez seu espetáculo de mímica, a plateia se remexia inquieta até entender a linguagem e não se ouvir uma mosca no teatro, fascinado.
*Ajusticeiradeesquerda
Fomento ao teatro, aquisição de conhecimento e bagagem cultural! Não foi à toa que Fernanda Montenegro ficou pasma com a plateia dos CEUs. Essas pessoas, se tiverem criado gosto, finalmente poderão usufruir e escolher mais do que hoje podem.
E os que não têm CEU têm televisão e conhecem o que é oferecido para determinado público. Sabem também o que aparece no bairro. E sabem que não podem ir.
Existe toda uma multidão de brasileiros (17 milhões) que hoje ganha até cinco salários mínimos (R$ 3.390) que potencialmente poderão, além de comer, alimentar o espírito. Este é um projeto de lei que toca duas pontas: o cidadão que vai consumir e o produtor cultural que terá mais público para sua oferta.
Quando chegarmos nesse potencial, serão R$ 7 bilhões injetados na cultura. Nossa previsão é atingir R$ 500 milhões neste ano.
Em 2008, o Ibope realizou pesquisa sobre indicadores de cultura no Brasil e mostrou que a grande maioria da população está alijada do consumo dos produtos culturais: 87% não frequentavam cinemas, 92% nunca foram a um museu; 90% dos municípios do país não tinham sala de cinema e 78% nunca assistiram a um espetáculo de dança.
Segundo a Folha, estaremos incentivando blockbusters e livros de autoajuda. Visão elitista. Cada um tem direito de consumir o que lhe agrada. Não esqueço quando, visitando um telecentro, fiquei indignada que a maioria dos jovens estava nos chats de um reality show. Fui advertida pela gestora: "Esse é um instrumento que eles estão aprendendo a usar. Depois, poderão voar para outros interesses. Ou não".
Não custa lembrar que a fome pelo acesso à cultura é enorme, o que ficou evidente nas filas quilométricas na mostra sobre impressionistas quando apresentada gratuitamente pelo Banco do Brasil.
O que a Folha também menosprezou é a enorme alavanca que o VC pode representar e desencadear na economia. A cadeia produtiva da cultura é o investimento de maior rentabilidade a curto prazo. Para uma peça de teatro, você vai desde os artistas, ao carpinteiro, cenógrafo, vestuário, iluminador...
Quanto ao recurso ir para formação e atividades de menor sustentação comercial, citadas como prioritários pela Folha, os editais do ministério, os Pontos de Cultura, têm exatamente essa preocupação, assim como os CEUs das Artes e Esporte que são, no momento, 124 em construção no país.
"A gente quer comida, diversão e arte." (Titãs)

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