Quando os protestantes perseguiram, censuraram, torturam e mataram em nome do seu deus: as Inquisições de Lutero e Calvino
Inquisição protestante
Na Inquisição, assim como os católicos, os protestantes também
perseguiram os fiéis - com direito a torturas, execuções e espionagem da
'polícia da fé'
por Angelo Adriano Faria de Assis*
O teólogo e reformador João Calvino, o 'papa de Genebra', promoveu
até espionagens e visitas às residências para vigiar a fé dos fieis.
Imagem: Wikimedia Common
A Inquisição não foi o único caso de intolerância movida em nome de Deus
na Época Moderna. Embora não houvesse a institucionalização de
tribunais similares aos do Santo Ofício, também foram usadas estratégias
de controle da fé nos locais em que o protestantismo era dominante,
levando à perseguição por crimes como adultério, discordância dos dogmas
protestantes e bruxaria.
Na Alemanha, o líder protestante Martinho Lutero (1483-1546) exigiu
perseguições aos anabatistas, grupo cristão mais radical da Reforma,
porque, entre outras questões, eles não aceitavam as regras da Igreja
Evangélica e divergiam sobre o batismo. A decisão causou a expulsão, o
encarceramento, a tortura e a execução de milhares de pessoas. Lutero
também divulgou textos com críticas aos judeus – embora sem maiores
repercussões na época, estes escritos acabariam utilizados pela Alemanha
nazista, em pleno século XX.
Polícia da fé
O teólogo e reformador João Calvino, o 'papa de Genebra', promoveu até
espionagens e visitas às residências para vigiar a fé dos fieis. Imagem:
Wikimedia Commons
Em Genebra, um dos berços da Reforma Protestante e onde ela se mostrou
bastante radical, funcionou uma verdadeira “polícia da fé”. João Calvino
(1509-1564), devido à sua autoridade sobre os protestantes suíços, era
conhecido como o “papa de Genebra”. Ao organizar a Igreja Presbiteriana,
instaurou comissões compostas de religiosos e leigos: a Venerável
Companhia, responsável pelo magistério, e o Consistério, que zelava pela
disciplina religiosa. Para isso, promovia confissões, denúncias,
espionagens e visitas às residências, levando muitos à prisão, à
tortura, ao julgamento e, em alguns casos, à morte.
A população era proibida de cultivar certos hábitos, como jogar, dançar e
representar. Alguns pensadores foram perseguidos, como o médico e
humanista espanhol Miguel Servet Griza. Ele foi preso, condenado e
queimado em efígie – representado por um boneco. Fugiu em direção à
Itália, mas acabou preso em Genebra, onde foi processado pelo Conselho
presidido por Calvino e queimado por causa de proposições vistas como
antibíblicas e heréticas, entre outras culpas.
Na Inglaterra, uma verdadeira caça às bruxas levou à morte centenas de
mulheres acusadas de feitiçaria. A experiência persecutória inglesa foi
ainda “exportada” para as colônias na América do Norte, como no famoso
episódio das “bruxas de Salem”, ocorrido em Massachusetts, em fins do
século XVII, em que várias adolescentes foram mortas, acusadas de
promover reuniões em torno de uma fogueira nas quais, supostamente,
invocavam espíritos.
Sem dúvida, não são poucos os exemplos de intolerância religiosa nos
variados espaços que vivenciaram a Reforma Protestante, mas nada que
representasse o equivalente dos estruturados tribunais inquisitoriais
católicos.
*Angelo Adriano Faria de Assis é professor da Universidade Federal de Viçosa e co-organizador de Religiões e religiosidades: entre a tradição e a modernidade (Edições Paulinas, 2010).
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Saiba mais:
Livros:
- DELUMEAU, Jean. Nascimento e afirmação da Reforma. São Paulo: Pioneira, 1989.
- LEVACK, Brian P. A caça às bruxas na Europa Moderna. 2ª ed. Rio de Janeiro: Campus, 1988.
- SANTOS, João Henrique dos. Da conciliação possível à ruptura. Uma análise dos documentos de 1520 de Martinho Lutero. Tese de doutorado, UFJF, 2009.
Filmes:
“As Bruxas de Salem”, de Nicholas Hytner, 1996.
“Lutero”, de Eric Till, 2003.
*Opensadordaaldeia
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