Cabra marcado para morrer
Um jornal australiano obteve um
documento do governo americano em que Julian Assange e o Wikileaks são
classificados como “inimigos do Estado”.
“Inimigos do Estado” é a mesma categoria em que estão catalogados o
Talibã e a Al-Qaeda, por exemplo. Na prática, pela legislação de
segurança americana, significa que eles podem ser presos sem processo
formal por tempo indeterminado.
Podem também ser executados. Mortos. Eliminados. Como se estivéssemos vivendo o seriado 24 horas.
Onde, no Brasil, o repúdio à perseguição movida pelo governo americano a
Assange? Ninguém se importa com ele? Algum colunista brasileiro o
defendeu? Assange foi alvo de um único editorial? Ou, por criticar os
Estados Unidos, ele não pode ser defendido?
Não só a perseguição americana já passou dos limites. Também a
intransigência inglesa em não dar a ele salvo conduto para que pegue um
avião rumo ao Equador vai passar para a história como um dos maus
momentos da história recente do Reino Unido, em seu alinhamento com a
política externa americana.
Assange está confinado na modesta embaixada equatoriana em Londres.
Ontem, numa fala na ONU, o ministro das relações exteriores do Equador,
Ricardo Patiño, alertou para os riscos físicos que Assange enfrenta em
sua presente situação. Lembremos que o pretexto para isso é o sexo que
duas suecas fizeram consensualmente com ele.
Por teleconferência, Assange também falou ontem num fórum da ONU. Como
sempre, num gesto de elegância, falou menos de si mesmo e mais do
soldado Bradley Manning. (Também numa atitude admirável, Assange recusou
um prêmio de “liberdade de expressão” concedido pela editora argentina
Perfil — que no Brasil é sócia da Abril na Caras — quando soube que
também estava sendo homenageado um jornalista do Equador que recebe
subvenções americanas e trata a patadas o governo constitucional de
Rafael Correa.)
Manning é acusado de ter passado ao Wikileaks os documentos americanos
que, entre outras coisas, mostravam a Guerra do Iraque como ela era e
é, não como os Estados Unidos fingiam que era.
Manning está preso à espera de julgamento, e pode ser condenado à morte
por traição. Até que ativistas fizessem pressão, ele foi submetido a
condições degradantes numa cadeia militar americana. Estava privado de
qualquer contato com outros presos, e durante boa parte do tempo era
impedido de vestir qualquer roupa. Tecnicamente, como lembraram os
ativistas, estava sob tortura contínua.
E agora: o mundo vai esperar o quê para gritar pela libertação de Assange? Que ele morra?
Paulo Nogueira
No Diário do Centro do Mundo*comtextolivre
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