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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quarta-feira, fevereiro 27, 2013

Cabra marcado para morrer



 

Um jornal australiano obteve um documento do governo americano em que Julian Assange e o Wikileaks são classificados como “inimigos do Estado”.
Assange no terraço da embaixada equatoriana em Londres
Assange no terraço da embaixada equatoriana em Londres
“Inimigos do Estado” é a mesma categoria em que estão catalogados o Talibã e a Al-Qaeda, por exemplo. Na prática, pela legislação de segurança americana, significa que eles podem ser presos sem processo formal por tempo indeterminado.
Podem também ser executados. Mortos. Eliminados. Como se estivéssemos vivendo o seriado 24 horas.
Onde, no Brasil, o repúdio à perseguição movida pelo governo americano a Assange? Ninguém se importa com ele? Algum colunista brasileiro o defendeu? Assange foi alvo de um único editorial? Ou, por criticar os Estados Unidos, ele não pode ser defendido?
Não só a perseguição americana já passou dos limites. Também a intransigência inglesa em não dar a ele salvo conduto para que pegue um avião rumo ao Equador vai passar para a história como um dos maus momentos da história recente do Reino Unido, em seu alinhamento com a política externa americana.
Assange está confinado na modesta embaixada equatoriana em Londres. Ontem, numa fala na ONU, o ministro das relações exteriores do Equador, Ricardo Patiño, alertou para os riscos físicos que Assange enfrenta em sua presente situação. Lembremos que o pretexto para isso é o sexo que duas suecas fizeram consensualmente com ele.
Por teleconferência, Assange também falou ontem num fórum da ONU. Como sempre, num gesto de elegância, falou menos de si mesmo e mais do soldado Bradley Manning. (Também numa atitude admirável, Assange recusou um prêmio de “liberdade de expressão” concedido pela editora argentina Perfil — que no Brasil é sócia da Abril na Caras — quando soube que também estava sendo homenageado um jornalista do Equador que recebe subvenções americanas e trata a patadas o governo constitucional de Rafael Correa.)
Manning é acusado de ter passado ao Wikileaks os documentos americanos que, entre outras coisas, mostravam a Guerra do Iraque como ela era e é, não como os Estados Unidos fingiam que era.
Manning está preso à espera de julgamento, e pode ser condenado à morte por traição. Até que ativistas fizessem pressão, ele foi submetido a condições degradantes numa cadeia militar americana. Estava privado de qualquer contato com outros presos, e durante boa parte do tempo era impedido de vestir qualquer roupa. Tecnicamente, como lembraram os ativistas, estava sob tortura contínua.
E agora: o mundo vai esperar o quê para gritar pela libertação de Assange? Que ele morra?
Paulo Nogueira No Diário do Centro do Mundo
*comtextolivre

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