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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, julho 09, 2013

A reforma possível



Dilma Rousseff tinha algumas alternativas para responder às manifestações populares. Todas variavam de acordo com o posicionamento que o governo federal assumiria em relação aos protestos.

O sonho da imprensa oposicionista era (continua sendo) a presidenta vestir a carapuça de alvo dos ataques, defendendo-se deles e depois os confrontando até centralizá-los contra si. Habilmente, porém, Dilma preferiu adotar as demandas genéricas das ruas: assimilou sua natureza reformista e seu anseio por melhores formas de representação.

A idéia da reforma política não apenas coaduna com as expectativas professadas pelos descontentes, mas acima de tudo evidencia seus próprios limites no Estado democrático de Direito. Apenas o imediatismo golpista acredita em soluções abruptas, verticais e impositivas para um dilema dessa envergadura.

Qualquer pessoa com entendimento básico dos Poderes republicanos sabe que as difusas transformações estruturais pleiteadas, inclusive a própria maneira de adotá-las, cabem ao Congresso Nacional. Nada mais justo do que Dilma lhe entregar a incumbência de atender aos desejos dos eleitores. E nada mais coerente, da parte dos indignados, que focar suas reivindicações onde elas podem ser atendidas.

Sem uma Assembléia exclusiva, a única possibilidade de mudança real no regramento da atividade política viria de um plebiscito que provocasse ou norteasse os legisladores. Um eventual referendo posterior serviria apenas para endossar as alterações tímidas e paliativas que os parlamentares julgassem convenientes. Não haveria reforma alguma.

É tolice fabricar frustrações por causa dos prazos e das vigências da consulta popular. Mesmo que ela incida sobre as eleições de 2016, representará uma conquista histórica para a agenda progressista, eternamente ignorada pelo Congresso. E o tempo maior de discussão pública solidificaria sua legitimidade.

Enxergar na dilatação do prazo uma derrota do governo federal equivale a chamá-lo de oportunista na hipótese de aplicação instantânea. Ambos são discursos prontos da mídia corporativa para abafar o inevitável ganho político do governo federal com a materialização da proposta.
*GuilhermeScalzilli

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