A covardia europeia contra o presidente Evo Morales
Os europeus, os campeões da defesa da democracia, do Estado de Direito e da liberdade, demonstraram que suas relações com a Casa Branca estão acima de tudo e que podem pisotear os direitos de um avião presidencial caso isso seja preciso para que o grande império não se incomode com eles. Um rumor infundado sobre a presença no avião presidencial boliviano do ex-espião estadunidense Edward Snowden, conduziu a um sério incidente diplomático aeronáutico entre Bolívia, França, Portugal e Espanha. Por Eduardo Febbro.
Eduardo Febbro no CARTA MAIOR
Paris -
Os europeus são incorrigíveis. Para não ficar mal com o império
norteamericano são capazes de violar todos os princípios que defendem
nos fóruns internacionais. O presidente boliviano Evo Morales foi o
último a experimentar as consequências dessa política de palavras
solidárias e gestos mesquinhos. Um rumor infundado sobre a presença no
avião presidencial boliviano do ex-membro da Agência Nacional de
Segurança (NSA) norteamericana, o estadunidense Edward Snowden, conduziu
a um sério incidente diplomático aeronáutico entre Bolívia, França,
Portugal e Espanha.
Voltando de Moscou, onde havia participado da segunda cúpula de países
exportadores de gás, realizada na capital russa, Morales se viu forçado a
aterrissar no aeroporto de Viena depois que França, Portugal e Espanha
negaram permissão para que seu avião fizesse uma escala técnica ou
sobrevoasse seus espaços aéreos. Os “amigos” do governo norteamericano
avisaram os europeus que Morales trazia no avião Edward Snowden, o homem
que revelou como Washington, por meio de vários sistemas sofisticados e
ilegais, espionava as conversações telefônicas e as mensagens de
internet da maioria do planeta, inclusive da ONU e da União Europeia.
O certo é que Edward Snowden não estava no avião de Evo Morales. No
entanto, ante a negativa dos países citados em autorizar o sobrevoo do
avião presidencial, Morales fez uma escala forçada na Áustria. As
capitais europeias coordenaram muito bem suas ações conjuntas para
cortar a rota de Evo Morales. Surpreende a eficácia e a rapidez com que
atuaram, tão diferente das demoradas medidas que tomam quando se trata
de perseguir mafiosos, traficantes de ouro, financistas corruptos ou
ladrões do sistema financeiro internacional.
Segundo a informação da chancelaria boliviana, o avião havia obtido a
permissão da Espanha para fazer uma escala técnica nas Ilhas Canárias.
Essa autorização também foi cancelada e, finalmente, o avião teve que
aterrissar no aeroporto de Viena. Segundo declarou em La Paz o chanceler
boliviano David Choquehuanca, “colocou-se em risco a vida do presidente
que estava em pleno voo”. “Quando faltava menos de uma hora para o
avião ingressar no território francês nos comunicam que tinha sido
cancelada a autorização de sobrevoo”. O ministro pediu uma explicação
tanto da França quanto de Portugal, país que tomou a mesma decisão que a
França.
“Queremos nos amedrontar. É uma discriminação contra o presidente”,
disse Choquehuanca. Em complemento a esta informação, o portal de
Wikileaks também acusou a Itália de não permitir a aterrisagem do avião
presidencial boliviano. Em Paris, o conselheiro permanente dos serviços
do primeiro-ministro Jean-Marc Ayrault disse que não tinha nenhuma
informação sobre esse assunto. Por sua vez, a chancelaria francesa disse
que não estava em condições de comentar ocaso. Bocas fechadas, mas atos
concretos.
Ao que parece, todo esse enredo se armou em torno da presença de Snowden
no aeroporto de Moscou. Alguém fez circular a informação de que Snowden
estava no aeroporto da capital russa com a intenção de subir no avião
de um dos países latino-americanos dispostos a lhe oferecer asilo
político. Snowden é procurado por Washington depois de revelar a maneira
pela qual o império filtrava as conversações no mundo. O chanceler
boliviano qualificou como uma “injustiça” baseada em “suspeitas
infundadas sobre o manejo de informação mal intencionada” o cancelamento
das permissões de voo para o avião de Evo Morales. “Não sabemos quem
inventou essa soberana mentira; querem prejudicar nosso país”, disse
Choquehuanca. “Não podemos mentir à comunidade internacional e não
podemos levar passageiros fantasmas”, advertiu o responsável pela
diplomacia boliviana.
Em La Paz, as autoridades adiantaram que não receberam nenhum pedido de
asilo por parte de Edward Snowden. Evo Morales havia evocado a
possibilidade de conceder asilo a Snowden, mas só isso. O mesmo ocorreu
com outra vítima da informação e da perseguição norteamericana, o
fundador do Wikileaks, Julian Assange. O mundo ficou pequeno para Edward
Snowden.
Assange está refugiado na embaixada do Equador em Londres e Snowden
encontra-se há dez dias na zona de trânsito do aeroporto de
Sheremétievo, em Moscou. Segundo Dmitri Peskov, o secretário de imprensa
do presidente Vladimir Putin, o norteamericano havia solicitado asilo a
Rússia, mas depois “renunciou a suas intenções e a sua solicitação”.
Peskov esclareceu, porém, que o governo russo não entregaria o fugitivo
para a administração norte-americana: “o próprio Snowden por sincera
convicção ou qualquer outra causa se considera um defensor dos direitos
humanos, um lutador pelos ideais da democracia e da liberdade pessoal.
Isso é reconhecido pelos ativistas e organizações de direitos humanos da
Rússia e também por seus colegas de outros países. Por isso é
impossível a entrega de Snowden por parte de quem quer que seja a um
país como os EUA, onde se aplica a pena de morte.
Quando se referiu ao caso de Snowden em Moscou, Evo Morales assinalou
que “o império estadunidense conspira contra nós de forma permanente e
quando alguém desmascara os espiões, devemos nos organizar e nos
preparar melhor para rechaçar qualquer agressão política, militar ou
cultural”. Os europeus, os campeões da defesa da democracia, do Estado
de Direito e da liberdade, demonstraram que suas relações com a Casa
Branca estão acima de tudo e que podem pisotear os direitos de um avião
presidencial caso isso seja preciso para que o grande império não se
incomode com eles.
Tradução: Marco Aurélio Weissheimer
*Turquinho
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