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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

domingo, abril 29, 2012

Ouro, a morte do Dólar

 

do Informação Incorrecta

No passado mês de Março, o México comprou 16.8 toneladas de ouro.
No mesmo mês, a Turquia comprou 11.2 toneladas de ouro.
Em Abril, a Rússia comprou 16.5 toneladas de ouro.
O Cazaquistão 4.3 toneladas, a Ucrânia 1.2, o Tajikistão 0.4.

Moral: há uma corrida para comprar ouro. Porquê?
O ouro é o bem-refugio por excelência,  algo em que se deposita, as esperanças quando tira um ar feio. Uma guerra? Um cataclismo?

Uma guerra se calhar não, mas um cataclismo poderia ser. Não natural, mas financeiro. De facto, circula uma ideia: e se o Dólar deixasse de ser a moeda das trocas internacionais? E se o Dólar deixasse de ser a moeda para pagar o petróleo?
Seria um cataclismo, como afirmado. Um cataclismo para os Estados Unidos que continuam a utilizar o Dólar; para os outros, pelo contrário, poderia ser uma boa notícia. Aliás: mais do que boa.

Mas será este o "tremor de terra financeiro" que justifica a corrida do ouro? Pode ser, há alguns sinais neste sentido.

A Rússia, por exemplo, não apenas comprou 16.5 toneladas de ouro, mas com este metal substituiu boa parte das reservas em Dólares. Antes da última aquisição, a Rússia já possuía mais de 850 toneladas de ouro, o que fez foi utilizar os Dólares das suas reservas para comprar o metal amarelo. Livrou-se da moeda americana e ficou com o precioso metal.

Não podemos esquecer um pormenor: a Rússia é um dos BRICS, os Países das economias emergentes. Tal como BRICS é também a China, cuja moeda, o Yuan, ainda está em guerra com o Dólar por causa do real valor no mercado (Pequim mantém o valor da própria moeda artificialmente baixo para favorecer as exportações).

Será que os BRICS estão a avaliar um sistema monetário independente da influencia do Dólar? Faz sentido que este assunto tenha sido tratado no recente encontro em Fevereiro. E mesmo que não seja para já, uma tal independência não pode não ser um objectivo no médio prazo.

O governador do Banco Mundial, Robert Zoellik, apoia a ideia chinesa de criar um banco mundial "alternativo. E este banco seria a plataforma de lançamento para o Yuan qual moeda de reserva mundial, em substituição do Dólar; ou até duma nova moeda internacional (ideia que todavia não parece muito consistente).
De tal forma, os Países emergentes não seriam mais dependente da moeda de Washington e ficariam ligados à moeda chinesa.

Um cenário que pode satisfazer os que contrariam as escolhas dos Estados Unidos, mas que não esconde alguns riscos. Entre os quais, aquele de passar simplesmente dum "dono" para outro.

O facto é que não parece existir alternativa. O Dólar sofre do efeito da crise ainda não acabada, do próprio deficit e da subida do preço do petróleo. O Euro está à espera do próprio funeral. Quem sobra? Exacto, o Yuan. Se a ideia for substituir o Dólar, só a moeda chinesa representa um sério candidato.

Se for este o próximo futuro, então fica claro porque a China tornou-se o primeiro produtor mundial de ouro. E explicaria também a corrida para o ouro dos Países emergentes ou ligados: internacionalizar o Yuan num mundo económico inimigo (pois o coração da finança ainda fica em Wall Street) significa apresentar não apenas apresentar a moeda chinesa como substituto do Dólar, mas também enriquecer esta escolha com um forte valor "nas costas" da moeda.

Isso tornaria o Yuan uma moeda com uma sólida cobertura aurífera, algo que transmite confiança, dado que o ouro é a única moeda que ninguém recusa.

Mas se assim for, quando?
Não já. Todos os BRICS têm ainda grandes reservas de Dólares e não tencionam pôr-los no mercado logo. Isso enfraqueceria o valor da moeda americana e as consequências nos mercados seriam pesadíssimas. Os Chineses tencionam "ocupar" o mercado, não tomar posse dos destroços dele.

O próximo passo será mesmo afastar-se do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional.
Desta forma, os BRICS terão uma estrutura completa que poderá realmente propor-se como alternativa ao domínio norte-americano. E a base será o ouro, que terá como função estabilizar o valor do Yuan. Coisa que o petróleo não consegue fazer com o Dólar.

Não será um trabalho tão rápido. Mas se pensarmos que a China se tornou uma potência industrializada no prazo de uma geração, então podemos afirmar que tudo estará acabado em alguns anos.
Quando os produtos da China serão avaliadas em Yuan e já não em Dólares, então a transição será um facto.

Ironia da História: o ouro, que as moedas ocidentais fizeram sair pela porta, volta pela janela duma moeda comunista. Se é que a China ainda se pode definir assim.


Ipse dixit.

Fonte: Chicago Blog
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