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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, maio 22, 2012

DESMATAMENTO E TRABALHO ESCRAVO ALIMENTAM CADEIA DE AÇO


Greenpeace - 17 de maio de 2012
O estudo "Carvoaria Amazônia”, produzido pelo Greenpeace, mostra irregularidades na cadeia de produção do ferro gusa. Siderúrgica envolvida contesta acusações. A cada quatro horas, ativistas do Greenpeace se revezam pendurados na corrente da âncora do navio Clipper Hope. Nesta quarta-feira (16/05), a ação, que tem prazo indeterminado, completa 48 horas. O cargueiro impedido de trafegar está a serviço da empresa maranhense Viena Siderúrgica e tenta ancorar na baía de São Marcos, a 20 quilômetros de São Luís, no Maranhão, para receber um carregamento estimado de 30 mil toneladas de ferro gusa. -"Não pretendemos sair daqui”, disse por telefone Paulo Adário, que lidera a ação pelo Greenpeace. Ele conversou com a DW Brasil a bordo do navio Rainbow Warrior, usado pela ONG em protestos em todo mundo.
A ação dos ativistas quer chamar a atenção para a cadeia de produção do ferro gusa, matéria-prima do aço, que tem deixado um rastro de destruição na Amazônia, denuncia a organização ambientalista. Simultaneamente ao protesto, a ONG lançou o relatório "Carvoaria Amazônia: como a indústria de aço e ferro gusa está destruindo a floresta com a participação de governo”, que coletou informações ao longo de dois anos sobre a atividade no Norte do Brasil.
Carvão: a raiz do problema
O estudo do Greenpeace afirma que a cadeia de produção do ferro na região amazônica do país inclui desmatamento, trabalho escravo e desrespeito a povos indígenas. E ainda: gigantes como Ford, General Motors, Nissan, Mercedes, BMW e a produtora de equipamentos agrícolas John Deere teriam participação indireta nessas irregularidades. Cerca de 80% de todo o ferro gusa ligado à devastação da região são exportados para os Estados Unidos para abastecer essas marcas.
A matéria-prima é extraída em Carajás, nos territórios do Pará, Amazonas e Tocantins. A região se tornou um polo de produção de ferro a partir da década de 1980 – de lá para cá mais de 40 altos-fornos se instalaram no local, operados por 18 empresas guseiras. A demanda por carvão para alimentar os altos-fornos deu origem a inúmeras carvoarias.
"O que sobrou de mata amazônica no Maranhão está dentro de áreas protegidas ou são terras indígenas. E essas áreas têm sido invadidas por madeireiros que buscam madeira para exportação e consumo interno e para produção de carvão”, acusa Adário. Dados oficiais mostram que 75% da floresta original que cobria o estado já foram desmatados.O uso de mão de obra análoga à escrava em carvoarias isoladas no meio da mata é, segundo a Comissão Pastoral da Terra, de conhecimento das autoridades: entre 2003 e 2011, foram libertados mais de 2.700 trabalhadores em situação degradante. Muitas dessas carvoarias, diz o relatório, usam madeira obtida de forma ilegal para produzir o carvão. Esse combustível irá, mais tarde, aquecer os altos-fornos para transformar o ferro gusa.No final de 2011, o Ibama comprovou que as maiores siderúrgicas do Pará utilizam carvão ilegal na produção do ferro-gusa. "Mais do que isso, as siderúrgicas fomentam o desmatamento da floresta amazônica em todo o sul e sudeste paraense para obter o carvão de que precisam, acobertando essa origem irregular com Guias Florestais fraudadas”, afirmou Luciano da Silva, coordenador da operação que foi batizada como Saldo Negro.O Ibama estimou, por exemplo, que o consumo de carvão vegetal da Siderúrgica do Pará, empresa de porte médio, correspondeu nos últimos cinco anos a 370 quilômetros quadrados de desmatamento ilegal.
Viena Siderúrgica contesta acusações
Outra empresa problemática, afirma Paulo Adário, é a Viena Siderúrgica. O navio Clipper Hope, impedido de atracar pelos ativistas do Greenpeace, será carregado com ferro gusa obtido nos altos-fornos dessa companhia e seguirá para os Estados Unidos.Questionada, a Viena Siderúrgica disse que foi surpreendida com o teor do relatório Carvoaria Amazônia. "Documentos em poder da empresa, tais como licença de operação e comprovação de regularidade no sistema DOF administrado pelo Ibama, comprovam a regularidade dos fornecedores no período em que a Viena manteve negociações com estes”, escreveu Wanderley M. dos Santos, advogado da siderúrgica, em resposta à DW Brasil.Ainda segundo o advogado, "a siderúrgica repudia todas as práticas citadas pelo relatório, reafirmando que sempre trabalhou para ser reconhecida pelas práticas socioambientais adequadas, por projetos de transformação social nas comunidades próximas à empresa e pela transparência de suas ações”.
Solução para o problema
Para o Greenpeace, não basta que o governo brasileiro combata as ilegalidades sociais e ambientais. "As montadoras, construtoras e outros consumidores de aço precisam identificar se os fornecedores de ferro gusa processado com carvão vegetal respeitam as leis brasileiras”, exige a ONG.Esse grandes consumidores, adiciona Paulo Adário, precisam adotar procedimentos para monitorar se sua cadeia de suprimento não destrói a floresta, não contém matéria-prima proveniente de áreas protegidas ou de terras indígenas, nem emprega mão de obra análoga à escrava.

Nádia Pontes
*educomambiental

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