O esquema Cachoeira e o governo Serra
CPI e Ministério Público investigam como o grupo do bicheiro
Carlinhos Cachoeira atuou em São Paulo através de contratos da
construtora Delta com a Prefeitura e o Estado em obras na marginal Tietê
CONEXÃO
Em conversas telefônicas, Cachoeira (acima) fala sobre
contratos públicos em São Paulo nas gestões de Serra e Kassab
Os desdobramentos da Operação Monte
Carlo, que investiga as relações do bicheiro Carlinhos Cachoeira com
governos estaduais e municipais, chegaram ao principal bunker da
oposição: o Estado de São Paulo. Em Brasília, parlamentares que compõem
a “CPI do Cachoeira” já tiveram acesso a conversas telefônicas
gravadas com autorização judicial entre junho do ano passado e janeiro
deste ano. Elas apontam que a construtora Delta, braço operacional e
financeiro do grupo do contraventor, foi favorecida nas gestões de José
Serra (PSDB) e de seu afilhado político Gilberto Kassab (PSD) na
prefeitura e também quando o tucano ocupou o governo do Estado. Em 31
de janeiro deste ano, por exemplo, Carlinhos Cachoeira telefona para
Cláudio Abreu, o representante da empreiteira na região Centro-Oeste,
atualmente preso sob a acusação de fraudar licitações e superfaturar
obras. Na ligação (leia quadro na pág. 43), o bicheiro pergunta se
Abreu teria conversado com Fernando Cavendish, oficialmente o dono da
construtora, sobre “o negócio do Kassab”. Em seguida, diz a Abreu que o
prefeito de São Paulo “triplicou o contrato”. Essa conversa, segundo
membros da CPI e do Ministério Público de São Paulo, é um dos indícios
de que a organização de Cachoeira também teria atuado com os tucanos e
seus aliados em São Paulo. “Os depoimentos de Cachoeira e Abreu serão
fundamentais para que se descubra o alcance das relações entre a
empreiteira e políticos”, diz o relator da CPI, deputado Odair Cunha
(PT-MG).
A Delta começou a prestar serviços à
capital paulista em 2005, quando Serra assumiu o comando do município.
Inicialmente, os contratos somavam R$ 11 milhões. A partir de 2006,
quando Serra deixou a prefeitura e venceu as eleições para governador,
os negócios da empreiteira com o município se multiplicaram, em muitos
casos sem licitação. Em 2010, ano em que o tucano disputou a
Presidência, os repasses chegaram a R$ 36,4 milhões. Entre 2008 e 2011,
os pagamentos da prefeitura para a Delta ultrapassaram R$ 167
milhões. O que chama mais a atenção da CPI e do Ministério Público de
São Paulo, porém, é o fato de a Delta ter vencido em outubro do ano
passado uma concorrência para limpeza urbana no valor de R$ 1,1 bilhão.
O MP abriu um inquérito para apurar se houve fraude na licitação. Há
suspeitas de uso de documentos falsos e de edital dirigido. “Se a Delta
cometeu essas irregularidades em outros Estados e municípios,
precisamos apurar se isso ocorreu também em São Paulo”, diz o promotor
Silvio Marques, do Patrimônio Público. Na quarta-feira 2, ele
encaminhou ofício à PF, solicitando acesso às investigações da Operação
Monte Carlo.
Entre a papelada, o promotor receberá a
transcrição de uma conversa gravada com autorização judicial ocorrida
em 4 de agosto do ano passado. No diálogo, a que ISTOÉ teve acesso, um
homem identificado como Jorge pergunta para Gleyb Ferreira, segundo a
PF uma espécie de “faz-tudo” de Cachoeira, sobre o edital de uma
licitação. “E aí, evoluiu aquele negócio?”, pergunta Jorge. “Aguardamos
estar com o edital hoje à tarde. O Carlinhos (Cachoeira) quer que a
gente converse com o Heraldo (Puccini Neto, representante da Delta na
região Sudeste). Já estamos conseguindo uma prorrogação com o
secretário para o dia 31 ao invés do dia 15”, responde Gleyb. Para a
PF, o diálogo se refere à concorrência de R$ 1,1 bilhão vencida pela
empresa ligada ao bicheiro. O Ministério Público já apurou que foram
necessários dois editais para a concorrência. No primeiro, a Delta foi
desclassificada.
Se a Delta multiplicou seus contratos
com a prefeitura entre 2005 e 2011, um movimento semelhante ocorreu com
o governo de São Paulo, quando Serra chegou ao Palácio dos
Bandeirantes em janeiro de 2007. Durante o mandato do tucano, a
construtora recebeu R$ 664 milhões do governo paulista. O valor
corresponde a 83% de todos os 27 convênios firmados pela Delta com o
Estado de São Paulo na última década. A obra mais polêmica é a
ampliação da Marginal Tietê, um dos cartões de visita da campanha
presidencial de Serra em 2010. Além de inúmeros problemas, como atrasos
e falta de compensação ambiental, o valor pago ao consórcio Nova
Tietê, liderado pela Delta, sofreu um reajuste de 75%. Na quarta-feira
2, o Ministério Público de São Paulo instaurou Inquérito Civil para
apurar a existência de irregularidades na licitação, superfaturamento e
conluio entre agentes públicos.
ELE DE NOVO
Então diretor da Dersa, Paulo Preto, o polêmico arrecadador tucano em 2010,
foi o responsável por contratar a construtora Delta para obras viárias em São Paulo
Segundo documentos obtidos por IstoÉ, a
obra da Marginal era acompanhada dentro do governo de São Paulo por
Delson José Amador e Paulo Vieira de Souza, conhecido como Paulo Preto,
que no PSDB é identificado como um dos arrecadadores das campanhas
eleitorais de Serra. Tanto Paulo Preto como Amador são citados na
Operação Castelo da Areia, da Polícia Federal, por suposto envolvimento
com empreiteiras. Pelo lado da Delta, o responsável pelo gerenciamento
da obra era o diretor da empreiteira para a região Sudeste, Heraldo
Puccini Neto. Ele está foragido, após ter a prisão preventiva decretada
por envolvimento em suposto esquema de fraude em licitações na área de
transporte público do Distrito Federal. “A apuração sobre os contratos
da Delta com o governo paulista pode levar ao caixa 2 dos tucanos em
São Paulo”, afirma o deputado estadual João Paulo Rillo (PT). “Não
podemos nos limitar a fazer uma análise política”, diz o líder tucano
Álvaro Dias (PR). “Devemos checar todos os contratos da Delta para
saber de que forma foram celebrados e se os preços praticados foram
justos. Afinal, a empresa foi a principal patrocinadora da relação do
bicheiro Cachoeira com os recursos públicos.”
NOVO INQUÉRITO
O MP de São Paulo encontrou indícios de conluio entre agentes públicos e
a construtora Delta para fraudar licitacões em obras realizadas na capital
paulista. O promotor vai investigar contratos da gestão Kassab (abaixo)
*comtextolivre
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