Páginas

Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, fevereiro 17, 2012

Trabalho escravo na Avenida Paulista

 

Foi registrado nesta quinta-feira (16) um flagrante de trabalho escravo em plena Avenida Paulista, região central de São Paulo (SP). Onze pessoas que atuavam como pedreiros e serventes para a construtora Racional Engenharia, na ampliação do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, foram encontradas em condições análogas às de escravidão pelo Ministério do Trabalho e Emprego. A denúncia foi feita por um trabalhador que teve seu salário retido por dois meses.

Trabalho_Escravo01

Os representantes da Racional alegam que os trabalhadores respondiam a uma terceirizada, a Genecy, e que a direção desconhecia as irregularidades encontradas. No entanto, as investigações comprovaram a relação trabalhista entre eles e a Racional.
Uma boa parte dos trabalhadores são do Maranhão, Estado com o segundo pior Índice de Desenvolvimento Humano do país. Por conta da mecanização do corte da cana-de-açúcar, há uma tendência de migrantes que atuavam nesse setor passarem a trabalhar na construção civil.
Os operários tiveram a liberdade restringida, de acordo com Luís Alexandre Faria, coordenador do Grupo de Combate ao Trabalho Escravo Urbano da Superintendência do Trabalho e Emprego de São Paulo (SRTE/SP), devido à retenção de salários e às dívidas contraídas com o empreiteiro da obra. Sem dinheiro, eles não conseguiam voltar aos seus municípios maranhenses de origem, em Santa Quitéria e Tutóia.
Dos onze, quatro foram aliciados no Maranhão e já chegaram a São Paulo endividados. Os demais trabalhavam em outra obra na capital. Eles foram encaminhados para um alojamento em Itaquera, na Zona Leste de São Paulo, onde, sem dinheiro, passaram a viver em condições precárias. Os operários utilizavam espumas de colchão como papel higiênico e não tinham dinheiro sequer para comprar cartões telefônicos para contatar familiares ou mesmo para se locomover dentro da cidade, segundo os auditores.
Os trabalhadores dormiam em camas improvisadas: por conta da falta de espaço, elas eram empilhadas formando beliches “totalmente inseguros”, de acordo com Luís Alexandre Faria, coordenador do Grupo de Combate ao Trabalho Escravo Urbano da Superintendência do Trabalho e Emprego de São Paulo (SRTE/SP).
Dentro do alojamento, havia ainda instalações elétricas irregulares e um botijão de gás. O grupo dividia dois copos para beber água e os 11 trabalhadores se revezavam para utilizar o único banheiro do local. Além disso, o empregador não disponibilizou papel higiênico, roupas de cama ou mesmo itens como sabonete e pasta de dente.
A operação foi finalizada em 10 de fevereiro, quando a empresa recebeu os 28 autos de infração pelas irregularidades encontradas. Os trabalhadores retornaram ao Maranhão em 23 de janeiro, após receberem as verbas rescisórias.
A obra de ampliação do Hospital Oswaldo Cruz conta com cerca de 280 trabalhadores. No local, ocorreu um acidente fatal em novembro do ano passado. Um operário morreu ao cair de um andaime quando estava no oitavo andar. A Racional Engenharia é uma das maiores empresas do ramo no Brasil e, em São Paulo, foi responsável pela construção de shoppings como o Morumbi e o Pátio Higienópolis, de fábricas, hotéis e empresas, entre outras obras de grande porte.
A fiscalização durou de 6 de dezembro até dia 10 de fevereiro. Foram feitas cinco inspeções no alojamento e na obra. Em 11 de janeiro, a Racional foi comunicada pelo MTE sobre as irregularidades encontradas no local em que os trabalhadores estavam abrigados. A empresa limitou-se a rescindir o contrato com a empreiteira Genecy.
A Racional nega que tenha abandonado os trabalhadores após rescindir o contrato. “A Genecy quebrou o contrato ao não cumprir as suas obrigações, inclusive a de não declarar a existência de alojamento. Ao tomar conhecimento do fato, a Racional atuou para garantir que a Genecy garantisse os direitos das pessoas envolvidas, o que efetivamente ocorreu”, disse a empresa em nota.
Trabalho análogo ao de escravo é crime, previsto no artigo 149 do Código Penal, e já foi encontrado em fiscalizações do governo federal em obras do Programa de Aceleração do Crescimento PAC, na construção de moradias do “Minha Casa, Minha Vida”, na ampliação do Programa “Luz para Todos” (que leva energia para famílias e comunidades que não têm acesso à rede elétrica, como foi em Guajará-Mirim, Rondônia) e em obras da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), do governo estadual paulista. Os resgates de trabalhadores nesse setor são recentes, não porque o trabalho escravo surgiu apenas agora na construção civil, mas porque o poder público passou a dar mais atenção à fiscalização nessa área. Os números têm crescido e já é possível encontrar empreiteiras no cadastro de empregadores flagrados com mão-de-obra escrava.
Por: Vermelho
*Ocarcará

Nenhum comentário:

Postar um comentário