O Uruguai, por Eduardo Galeano
Até um certo momento o Uruguai só era mencionado no Brasil por duas
coisas: ricos iam se divorciar e/ou casar e ter lua-de-mel em Punta del
Este e pela derrota no fatídico dia 16 de julho de 1950 para a seleção
Uruguai no Maracanã, de virada, na Copa do Mundo feita para o Brasil ser
campeão. Alguns haviam passado por Montevidéu e diziam que ficava a
meio caminho entre Porto Alegre e Buenos Aires.
“Os uruguaios temos certa tendência a crer que nosso país existe, embora
o mundo não o perceba”, diz Galeano. “Os grandes meios de comunicação,
aqueles que têm influência universal, jamais mencionam esta nação
pequenina e perdida ao sul do mapa.”
Um país de poucos milhões de habitantes que, como diz ele, tem população
similar a alguns bairros das grandes cidades do mundo, mas que
provocaria algumas surpresas para quem se arriscasse a chegar por ali.
Um país que aboliu os castigos corporais nas escolas 120 anos antes da
Grã-Bretanha. O Uruguai adotou a jornada de trabalho de oito horas um
ano antes dos Estados Unidos e quatro anos antes da França. Teve lei do
divórcio setenta anos antes da Espanha e voto feminino quatorze anos
antes da França.
O Uruguai teve proporcionalmente o maior exílio durante a ditadura
militar, em comparação com sua população. Assim, tem cinco vezes mais
terra do que a Holanda e cinco vezes menos habitantes. Tem mais terra
cultivável que o Japão e uma população quarenta vezes menor.
O país ficou relegado a uma população escassa e envelhecida. Tristemente
Galeano diz que “poucas crianças nascem, nas ruas vêem-se mais cadeiras
de rodas do que carrinhos de nenês”.
Ainda assim, Galeano consigna bons motivos para gostar do seu país:
“Durante a ditadura militar, não houve no Uruguai nem um só intelectual
importante, nem um só cientista relevante, nem um só artista
representativo, único que fosse, disposto a aplaudir os mandões. E nos
tempos que correm, já na democracia, o Uruguai foi o único país do mundo
que derrotou as privatizações em consulta popular: no plebiscito de
fins de 92, 72% dos uruguaios decidiram que os serviços essenciais
continuaram sendo públicos. A notícia não mereceu sequer uma linha na
imprensa mundial, embora se constituísse numa insólita prova de senso
comum.” Talvez por esses “maus exemplos” tentam desconhecer o Uruguai,
apesar da insistência dos uruguaios de afirmar que seu país existe.
Por tudo isso, Galeno se orgulha do seu “paisito”, “este paradoxal país onde nasci e tornaria a nascer”.
* Blog do Emir
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