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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

segunda-feira, fevereiro 04, 2013

POR QUE SÓ ATUAR POLITICAMENTE EM BENEFÍCIO DA SOCIEDADE DEPOIS DE UMA GRANDE E LANCINANTE DOR?

Imagem: gaf arq creative commons - flickrA história tem nos ensinado, pelo menos a história dos últimos séculos, que é na tragédia que o homem evolui. Essa é uma dialética cruel para nós humanos, mas parece ser esse o desafio da emancipação da razão. Depois da tragédia, a sociedade reage.

Parece muito fácil e raso culpar os músicos, os donos da boate e os bombeiros pela tragédia na boate Kiss em Santa Maria (RS), assim como fazem os programas policiais sensacionalistas da televisão brasileira ou a revista semanal Veja, que se limita a análises de dois neurônios, o do bem e o do mal, sempre que acontece algum grande drama social.

A culpabilidade serve para ver o passado, não o presente. É preciso pensar os sentidos humanos do problema para que se possa entendê-lo antecipadamente e talvez evitá-lo.

Existem inúmeras outras mortes traumáticas que acontecem constantemente por esse Brasil e que, após a tragédia, as pessoas agem da mesma forma que a sociedade age agora, com fiscalizações por todo o Brasil, tentando dar um resposta política.

Depois da tragédia, há a atuação politica na mobilização dos empresários de casa noturna, na imprensa, nos poderes públicos etc. Todos buscam na política e na solidariedade uma solução. Possivelmente emerge o sentimento de não querer passar por isso e nem que outras pessoas passem pelo que os parentes das vítimas passam.  Mas por que buscamos essa solidariedade e essa política somente depois da tragédia se somos suficientemente racionais para buscá-la preventivamente?

A tragédia, como a da boate Kiss,  é exposta mundialmente porque é coletiva, mas fica esquecida quando são vítimas individuais, uma tragédia familiar. Vale a pena recordar casos e histórias individuais. A primeira que me vem à cabeça é o Instituto Ives Ota, criado pelo pai do garoto de 8 anos do mesmo nome, após seu assassinato. Também há o caso dos pais de uma garota que criaram uma ong sobre segurança de esportes radicais após filmar a morte da filha em um bang jump, também  assisti a um vídeo sobre uma mãe que criou uma ong para segurança de turismo de aventura, após perder a filha em uma queda de cavalo em um resort e tantos outros.

Todos parecem fatalidades e é certo que essas coisas podem acontecer, mas é nesse momento de tragédia pessoal que atuação política surge e deixa a esfera do privado (prover e pensar somente na sua família) e passa a consciência dialética de que o bem estar da sua família precisa do bem estar também da sociedade. Nesse momento, país e mães com a dor da perda criam ongs, entidades e associações para que outras pessoas não sintam ou não passem pelo que passaram. Diante dessa dor impensável parece eclodir o gene social adormecido pelo capitalismo.

Por que não criar essas entidades antes da morte dos filhos? Por que só atuar politicamente e em benefício da sociedade depois de uma grande e lancinante dor? Por que não somos capazes de usar a razão e percebermos que é necessário que todos atuem de alguma forma socialmente, coletivamente e politicamente?

Parece triste reconhecer que no capitalismo a tragédia tornou-se a origem da ação política, seja na esfera pública ou privada.

*Educaçãopolitica

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