Azenha rejeita culpar PIG e vê identidade entre Dilma e mídia
do Cinema & Outras Artes
“Se a disseminação do acesso à internet trouxe em seu bojo uma saudável desconfiança para com a mídia corporativa, por outro lado - como o demonstra uma série de pesquisas -, tem aguçado a tendência para uma certa modalidade de sectarismo ideológico e para a formação de "igrejinhas" em que os membros se congraçam por preferências, afinidades e posicionamentos em comum.”
Mauricio Caleiro
As
atuais relações entre o governo Dilma e a mídia foram desmistificadas e
examinadas com raro rigor pelo jornalista Luiz Carlos Azenha, em um
comentário postado este final de semana no Facebook, que me foi indicado
pela blogueira Rosangela Basso, do Maria da Penha Neles.
O texto, que pode ser lido na íntegra aqui
ou ao final deste post, rejeita o disseminado mito segundo o qual "o
governo Dilma é refém da mídia ou sofre de síndrome de Estocolmo" e
detalha, com argumentação e exemplos contundentes, a atual confluência
de interesses entre um e outro ente a partir da aposta de Dilma em
"despertar o 'espírito animal' do capital privado, nacional e
internacional", como forma de alcançar o neste momento, segundo Azenha,
imprescindível crescimento econômico.
Eu teria
considerações a fazer quanto à primazia exclusiva que a análise de
Azenha atribui ao crescimento econômico, à necessidade de analisar mais
detidamente o modelo desenvolvimentista arcaico e autoritário escolhido
pelo governo Dilma para propiciar tal desenvolvimento, bem como o fato
de ele destoar do que foi prometido na campanha eleitoral – notadamente
através do amplo recuso a privatizações, execradas pela então candidata -
e, por fim mas não por último, à necessidade de contrastar, na análise,
tais metas econômicas e tais meios para obtê-las a um crescimento que
até agora tem se revelado pífio.
Mas deixemos
tais reflexões para outra ocasião, pois o centro do meu interesse neste
post é sublinhar causas e efeitos da negligência de parte da blogosfera e
das redes sociais para a mudança nas relações entre governo e mídia,
tais como apontadas por Azenha.
Se a
disseminação do acesso à internet trouxe em seu bojo uma saudável
desconfiança para com a mídia corporativa, por outro lado - como o
demonstra uma série de pesquisas -, tem aguçado a tendência para uma
certa modalidade de sectarismo ideológico e para a formação de
"igrejinhas" em que os membros se congraçam por preferências, afinidades
e posicionamentos em comum.
Tal dinâmica, entre
diversos outros efeitos, tem feito com que um número considerável de
blogueiros e ativistas de rede social continue, dia após dia, a insistir
numa narrativa maniqueísta em que o centro de todos os males é o tal de
PIG – a mídia corporativa -, enquanto a sacrossanta administração
petista seria uma vítima inocente das deturpações alheias. Isso se dá a
despeito do cada vez mais indisfarçável conservadorismo do governo Dilma
e de uma relação deste com a mídia que, pelas razões que Azenha alude,
há muito deixou de ser de aversão mútua e de hostilidade deliberada
(como fora, em ampla medida, no tempo de Lula),
Um
exemplo cabal das distorções desse processo vem da forma como o
jornalismo econômico tem sido tratado, acusado de de fazer "terrorismo"
com o governo Dilma como parte de seu antipetismo arraigado. Ora, a
questão aqui não é se o presidente é do PT, do PSDB ou do PMDB; se ele
se chama Dilma, Lula, Itamar Franco ou Figueiredo: o jornalismo
econômico brasileiro é um braço do mercado financeiro global, ele ataca
todo e qualquer governante e toda e qualquer medida que não se amolde ao
paradigma neoliberal o qual cultua.
Se há uma
maior identificação midiática com os tucanos, é, como ironiza Azenha,
porque "eles prestam melhores serviços". Mas, ainda segundo ele, é
evidente a identificação da mídia com o "novo PT" de Dilma e de Paulo
Bernardo nos "objetivos macro".
Talvez a adoção
de um critério de análises que, ao invés de adotar o antipetismo da
mídia como uma premissa recorrente e onipresente, seja, atualmente, mas
criterioso e preciso levar em conta fatores como o alinhamento ou não
das medidas tomadas pelo governo Dilma em relação a uma agenda
neoliberal e à postura que historicamente a mídia brasileira tem tomado
no que concerne a questões sociais e desenvolvimentismo econômico.
Porém,
ao insistirem nessa visão tão maniqueísta como caricata das relações
entre mídia e governo, o que esses setores da blogosfera e das redes
sociais fazem é, paradoxalmente, avalizarem o retrocesso conservador
patrocinado pela gestão Dilma dotando-o de um viés anticorporativo e
antimidiático que simplesmente não existe na atual administração federal
– muito pelo contrário.
Abaixo, o texto de Azenha:
"Uma
querida amiga disse num debate que o governo Dilma é refém da mídia ou
sofre de síndrome de Estocolmo, a escolher. Discordei.
Acho
que existe uma diferença de fundo entre os governos Lula e Dilma. Lula,
sindicalista, estava aberto a atender aqui ou ali aos movimentos
sociais, que o apoiaram com firmeza num momento em que os projetos
sociais como o Bolsa Família enfrentaram forte oposição da direita.
Dilma
sabe que seu futuro e o dos aliados depende de crescimento econômico. E
claramente optou por despertar o "espírito animal" do capital privado,
nacional e internacional.
Depois da ascensão
social do precariado, através do fortalecimento do mercado interno,
temos agora a ocupação de vazios geográficos do Brasil, especialmente no
Nordeste, mas também na Amazônia.
Vi com meus
próprios olhos, no caminho para Imperatriz, Maranhão, a expansão do
agronegócio, nos mesmos moldes que se deu em outras regiões do Brasil:
concentração de terras, transformação do pequeno agricultor em empregado
e êxodo para as cidades; forte presença de empresas como a Monsanto e a
Bunge, ou seja, do capital internacional que penetra no campo em
associação com interesses locais. Nenhum sinal de reforma agrária.
Isso
tem relação com um fenômeno que escapa ao nosso controle: o capital
financeiro hj especula intensamente com o valor das commodities, da soja
ao minério de ferro, do petróleo ao milho.
De
tal forma que a tentativa de Hugo Chávez de interferir no preço
internacional do petróleo rendeu a ele o papel de inimigo público número
um da mídia internacional.
Até intangíveis "créditos de carbono" foram inventados para especular.
A
especulação chega à posse da terra: é só olhar a compra ou o
arrendamento de grandes extensões para a produção de alimentos na
África, para atender ao imenso mercado asiático.
A
ideia de que o neoliberalismo sofreu um golpe fatal com a crise de 2008
é uma farsa: a concentração de riqueza se aprofunda, com a formação de
um punhado de oligopólios controlando cada setor da economia em escala
global. Nunca na História deste planeta tão poucos foram tão influentes
na política através da compra de mandatos populares via financiamento de
campanha. Tanto faz se de partido de direita ou esquerda, republicano
ou democrata, petista ou tucano.
Em vez destes
mandatos moldarem o campo de jogo das grandes corporações, são elas que
cada vez mais definem os limites aceitáveis da atuação política,
especialmente em países nos quais o estado é historicamente frágil.
No
Brasil, além da agregação de grandes áreas do Nordeste ao agronegócio,
temos a continuidade do projeto dos militares para a Amazônia, que o
Lúcio Flávio Pinto define como colonialismo interno: a produção de
energia para uso pelas mineradoras se sobrepõe a qualquer outro objetivo
estratégico do governo Dilma na região
Olhem os
nomes das empresas que compõem os consórcios de construção e quais
serão os grandes consumidores e vocês vão entender o jogo.
O
desmonte do Ibama e do Incra, pois, não é por acaso. O distanciamento e
a má vontade com os movimentos sociais não reflete autismo ou
incapacidade política de Dilma: é uma escolha.
Em
resumo, o PT no Executivo federal adota um rumo que não ofende, pelo
contrário, que agrada tanto ao Jorge Gerdau, conselheiro da presidenta,
quanto aos sócios internacionais da Vale.
Considerando
que estes estão entre os grandes anunciantes da nossa mídia, faz todo o
sentido que a Dilma injete dinheiro na Globo, na Veja e na Folha.
Para
além das reportagens raivosas ou pisadas no tomate, que refletem a
preferência dessa mídia pelos tucanos -- que, inegavelmente, prestam
melhores serviços -- há uma identidade nos objetivos macro. O governo
Dilma não é refém da mídia, mas parceiro, e ninguém reflete melhor isso
que o ministro Paulo Bernardo, que consegue agradar ao mesmo tempo ao
capital nacional (Globo) e ao internacional (teles).
Acreditem: Bernardo é Dilma e Dilma é Bernardo. Ambos representam, gostem ou não, a "nova face" do PT."
*GilsonSampaio
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