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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

segunda-feira, maio 20, 2013

Azenha rejeita culpar PIG e vê identidade entre Dilma e mídia

 

 do Cinema & Outras Artes
“Se a disseminação do acesso à internet trouxe em seu bojo uma saudável desconfiança para com a mídia corporativa, por outro lado - como o demonstra uma série de pesquisas -, tem aguçado a tendência para uma certa modalidade de sectarismo ideológico e para a formação de "igrejinhas" em que os membros se congraçam por preferências, afinidades e posicionamentos em comum.”
Mauricio Caleiro
As atuais relações entre o governo Dilma e a mídia foram desmistificadas e examinadas com raro rigor pelo jornalista Luiz Carlos Azenha, em um comentário postado este final de semana no Facebook, que me foi indicado pela blogueira Rosangela Basso, do Maria da Penha Neles.
O texto, que pode ser lido na íntegra aqui ou ao final deste post, rejeita o disseminado mito segundo o qual "o governo Dilma é refém da mídia ou sofre de síndrome de Estocolmo" e detalha, com argumentação e exemplos contundentes, a atual confluência de interesses entre um e outro ente a partir da aposta de Dilma em "despertar o 'espírito animal' do capital privado, nacional e internacional", como forma de alcançar o neste momento, segundo Azenha, imprescindível crescimento econômico.
Eu teria considerações a fazer quanto à primazia exclusiva que a análise de Azenha atribui ao crescimento econômico, à necessidade de analisar mais detidamente o modelo desenvolvimentista arcaico e autoritário escolhido pelo governo Dilma para propiciar tal desenvolvimento, bem como o fato de ele destoar do que foi prometido na campanha eleitoral – notadamente através do amplo recuso a privatizações, execradas pela então candidata - e, por fim mas não por último, à necessidade de contrastar, na análise, tais metas econômicas e tais meios para obtê-las a um crescimento que até agora tem se revelado pífio.
Mas deixemos tais reflexões para outra ocasião, pois o centro do meu interesse neste post é sublinhar causas e efeitos da negligência de parte da blogosfera e das redes sociais para a mudança nas relações entre governo e mídia, tais como apontadas por Azenha.
Se a disseminação do acesso à internet trouxe em seu bojo uma saudável desconfiança para com a mídia corporativa, por outro lado - como o demonstra uma série de pesquisas -, tem aguçado a tendência para uma certa modalidade de sectarismo ideológico e para a formação de "igrejinhas" em que os membros se congraçam por preferências, afinidades e posicionamentos em comum.
Tal dinâmica, entre diversos outros efeitos, tem feito com que um número considerável de blogueiros e ativistas de rede social continue, dia após dia, a insistir numa narrativa maniqueísta em que o centro de todos os males é o tal de PIG – a mídia corporativa -, enquanto a sacrossanta administração petista seria uma vítima inocente das deturpações alheias. Isso se dá a despeito do cada vez mais indisfarçável conservadorismo do governo Dilma e de uma relação deste com a mídia que, pelas razões que Azenha alude, há muito deixou de ser de aversão mútua e de hostilidade deliberada (como fora, em ampla medida, no tempo de Lula),
Um exemplo cabal das distorções desse processo vem da forma como o jornalismo econômico tem sido tratado, acusado de de fazer "terrorismo" com o governo Dilma como parte de seu antipetismo arraigado. Ora, a questão aqui não é se o presidente é do PT, do PSDB ou do PMDB; se ele se chama Dilma, Lula, Itamar Franco ou Figueiredo: o jornalismo econômico brasileiro é um braço do mercado financeiro global, ele ataca todo e qualquer governante e toda e qualquer medida que não se amolde ao paradigma neoliberal o qual cultua.
Se há uma maior identificação midiática com os tucanos, é, como ironiza Azenha, porque "eles prestam melhores serviços". Mas, ainda segundo ele, é evidente a identificação da mídia com o "novo PT" de Dilma e de Paulo Bernardo nos "objetivos macro".
Talvez a adoção de um critério de análises que, ao invés de adotar o antipetismo da mídia como uma premissa recorrente e onipresente, seja, atualmente, mas criterioso e preciso levar em conta fatores como o alinhamento ou não das medidas tomadas pelo governo Dilma em relação a uma agenda neoliberal e à postura que historicamente a mídia brasileira tem tomado no que concerne a questões sociais e desenvolvimentismo econômico.
Porém, ao insistirem nessa visão tão maniqueísta como caricata das relações entre mídia e governo, o que esses setores da blogosfera e das redes sociais fazem é, paradoxalmente, avalizarem o retrocesso conservador patrocinado pela gestão Dilma dotando-o de um viés anticorporativo e antimidiático que simplesmente não existe na atual administração federal – muito pelo contrário.
Abaixo, o texto de Azenha:
"Uma querida amiga disse num debate que o governo Dilma é refém da mídia ou sofre de síndrome de Estocolmo, a escolher. Discordei.
Acho que existe uma diferença de fundo entre os governos Lula e Dilma. Lula, sindicalista, estava aberto a atender aqui ou ali aos movimentos sociais, que o apoiaram com firmeza num momento em que os projetos sociais como o Bolsa Família enfrentaram forte oposição da direita.
Dilma sabe que seu futuro e o dos aliados depende de crescimento econômico. E claramente optou por despertar o "espírito animal" do capital privado, nacional e internacional.
Depois da ascensão social do precariado, através do fortalecimento do mercado interno, temos agora a ocupação de vazios geográficos do Brasil, especialmente no Nordeste, mas também na Amazônia.
Vi com meus próprios olhos, no caminho para Imperatriz, Maranhão, a expansão do agronegócio, nos mesmos moldes que se deu em outras regiões do Brasil: concentração de terras, transformação do pequeno agricultor em empregado e êxodo para as cidades; forte presença de empresas como a Monsanto e a Bunge, ou seja, do capital internacional que penetra no campo em associação com interesses locais. Nenhum sinal de reforma agrária.
Isso tem relação com um fenômeno que escapa ao nosso controle: o capital financeiro hj especula intensamente com o valor das commodities, da soja ao minério de ferro, do petróleo ao milho.
De tal forma que a tentativa de Hugo Chávez de interferir no preço internacional do petróleo rendeu a ele o papel de inimigo público número um da mídia internacional.
Até intangíveis "créditos de carbono" foram inventados para especular.
A especulação chega à posse da terra: é só olhar a compra ou o arrendamento de grandes extensões para a produção de alimentos na África, para atender ao imenso mercado asiático.
A ideia de que o neoliberalismo sofreu um golpe fatal com a crise de 2008 é uma farsa: a concentração de riqueza se aprofunda, com a formação de um punhado de oligopólios controlando cada setor da economia em escala global. Nunca na História deste planeta tão poucos foram tão influentes na política através da compra de mandatos populares via financiamento de campanha. Tanto faz se de partido de direita ou esquerda, republicano ou democrata, petista ou tucano.
Em vez destes mandatos moldarem o campo de jogo das grandes corporações, são elas que cada vez mais definem os limites aceitáveis da atuação política, especialmente em países nos quais o estado é historicamente frágil.
No Brasil, além da agregação de grandes áreas do Nordeste ao agronegócio, temos a continuidade do projeto dos militares para a Amazônia, que o Lúcio Flávio Pinto define como colonialismo interno: a produção de energia para uso pelas mineradoras se sobrepõe a qualquer outro objetivo estratégico do governo Dilma na região
Olhem os nomes das empresas que compõem os consórcios de construção e quais serão os grandes consumidores e vocês vão entender o jogo.
O desmonte do Ibama e do Incra, pois, não é por acaso. O distanciamento e a má vontade com os movimentos sociais não reflete autismo ou incapacidade política de Dilma: é uma escolha.
Em resumo, o PT no Executivo federal adota um rumo que não ofende, pelo contrário, que agrada tanto ao Jorge Gerdau, conselheiro da presidenta, quanto aos sócios internacionais da Vale.
Considerando que estes estão entre os grandes anunciantes da nossa mídia, faz todo o sentido que a Dilma injete dinheiro na Globo, na Veja e na Folha.
Para além das reportagens raivosas ou pisadas no tomate, que refletem a preferência dessa mídia pelos tucanos -- que, inegavelmente, prestam melhores serviços -- há uma identidade nos objetivos macro. O governo Dilma não é refém da mídia, mas parceiro, e ninguém reflete melhor isso que o ministro Paulo Bernardo, que consegue agradar ao mesmo tempo ao capital nacional (Globo) e ao internacional (teles).
Acreditem: Bernardo é Dilma e Dilma é Bernardo. Ambos representam, gostem ou não, a "nova face" do PT."
*GilsonSampaio

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