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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quarta-feira, maio 22, 2013

Tortura era praticada na ditadura militar antes da luta armada, diz Comissão da Verdade


Luciano Nascimento
Repórter da Agência Brasil
A Comissão Nacional da Verdade informou que a tortura passou a ser prática sistemática da ditadura militar logo após o golpe, em 1964. Durante o balanço de um ano de atividades, os integrantes da comissão desmentiram a versão de que a prática tenha sido efetivada em resposta à luta armada contra a ditadura, iniciada em 1969.
“A prática da tortura no Brasil como técnica de interrogatório nos quartéis é anterior ao período da luta armada, ela começa a ser praticada em 1964”, disse a historiadora Heloísa Starling, assessora da comissão. "O que é importante notar é que ao contrário do que supunha boa parte da nossa bibliografia, o que nós temos é a tortura sendo introduzida como padrão de interrogação nos quartéis em 64 e explodindo a partir de 69," argumentou.
O balanço divulgado pela comissão considera que o uso da violência política permitiu ao regime construir um Estado sem limites repressivos. “Fez da tortura força motriz da repressão no Brasil. E levou a uma política sistemática de assassinatos, desaparecimentos e sequestros.”
A comissão revelou ainda que a Marinha ocultou informações sobre mortes na ditadura, quando foi questionada em 1993 pelo governo Itamar Franco.
De acordo com levantamentos da Comissão da Verdade, cerca de 50 mil pessoas foram presas só no ano de 1964, em operações nos estados da Guanabara (atual Rio de Janeiro), de Minas Gerais, de Pernambuco, do Rio Grande do Sul e de São Paulo. A comissão identificou prisões em massa em navios-presídios.
A comissão também relatou ter identificado 36 centros de tortura em sete estados, inclusive em duas universidades - na Universidade Federal do Recife e na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. “Nós identificamos que as pessoas foram presas dentro dos campus da universidade e as práticas de violência ocorreram dentro do campus”, disse Heloísa Starling.
A historiadora disse que a comissão está no caminho de desmontar a tese de que a tortura foi praticada sem o consentimento do alto escalão militar. Ela apresentou um organograma de 1970, ano de criação do Centro de Operações de Defesa Interna (Codi), que mostra que as informações sobre o que ocorria no órgão eram de conhecimento do alto escalão do Exército, da Marinha e da Aeronáutica.
Toda a bibliografia, segundo a assessora, mostra que a estrutura de comando vai até o segundo nível, onde está o Centro de Informações da Aeronáutica (Cisa), Centro de Informações do Exército (CIE) e o Centro de Informações da Marinha. “É muito pouco provável que o general Médici [presidente Emílio Garrastazu Médici] não recebesse informações do seu ministro mais importante, que era o ministro do Exército, Orlando Geisel”, disse.
Edição: Carolina Pimentel
*Saraiva

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