Deputado petista contra o plebiscito
A presidente Dilma Rousseff discursava no Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. Marcante em sua intervenção era a defesa do plebiscito pela reforma política.
Poucas horas antes, um deputado de seu partido, Cândido Vaccarezza (SP), apresentava-se como o coveiro da consulta popular e decretava que nenhuma mudança seria válida antes de 2016 ou 2018.
O parlamentar paulista, coordenador do grupo de trabalho sobre sistema eleitoral, não afrontou apenas a convocação da chefe de Estado. Violou abertamente resolução da própria agremiação a que pertence desde sua fundação.
Indicado para a função atual pelo presidente da Câmara dos Deputados, o peemedebista Henrique Eduardo Alves (RN), Vaccarezza atua como um franco-atirador e se associa aos setores mais conservadores do parlamento.
Nunca escondeu que, em termos gerais, é um apoiador das regras atuais do jogo político-eleitoral. Essa talvez tenha sido sua principal credencial para o papel que lhe outorgaram.
É o homem certo para mudar alguma coisa e deixar tudo como está.
Mas o pior não são suas ideias sobre o funcionamento da democracia. Está no seu direito ter as posições que bem entender e escolher as companhias que preferir.
O mal maior que sua atitude produz é contribuir para a desmoralização dos partidos políticos, prato tão ao gosto do reacionarismo pátrio.
Ao formar na troika contra o plebiscito e a reforma política, ladeado por Alves e Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o deputado constrange o PT e o faz ficar parecido com as demais legendas.
Não é segredo para ninguém que, exceção normalmente feita aos partidos de esquerda, o restante das organizações é regido pela agregação de interesses pessoais e corporativos, cumprindo apenas a missão de legenda eleitoral.
O Partido dos Trabalhadores sempre foi muito cioso de sua disciplina interna, ciente que não há outro caminho para a disputa programática, o combate pela direção do Estado e a construção de hegemonia político-ideológica na sociedade.
Nos primeiros anos de vida, desligou três de seus sete parlamentares de então, em 1985, porque José Eudes, Bete Mendes e Airton Soares anunciaram que, contrariamente à decisão partidária, iriam ao Colégio Eleitoral que elegeu Tancredo Neves presidente por via indireta.
O PT sequer esperou a consumação da indisciplina, para evitar cair na vala comum.
A mesma norma valeu para a ex-prefeita de São Paulo, Luiza Erundina, quando decidiu, por conta e risco, ingressar no governo Itamar Franco, à revelia do que tinham deliberados as instâncias de seu partido.
A única diferença é que teve sua filiação suspensa e acabou por se retirar do PT, retornando em seguida e saindo novamente.
No início do governo Lula, houve novo exemplo de seriedade com a concepção de que um partido não é amontoado de pessoas que agem por conta própria.
A senadora Heloísa Helena e outros dois parlamentares receberam cartão vermelho por quebrarem a democracia partidária no curso dos debates sobre reforma da previdência.
O caso atual tem igual gravidade, ou até maior, que as demais situações citadas.
Pode um parlamentar do mesmo partido fazer o serviço dos que buscam travar a proposta da presidente em um momento de crise tão aguda?
É cabível um deputado rasgar a orientação de sua agremiação e se compor com os que querem derrotá-la?
A seu favor, Vaccarezza tem uma questão técnica. Não houve fechamento de questão, no diretório nacional do PT e na bancada, em torno da consulta popular, da Constituinte e da reforma política.
Esse é o instrumento estatutário para que sejam impostas as devidas sanções.
Bom aprendiz das afirmativas e negativas que marcam o cretinismo parlamentar, o deputado deu uma no cravo e outra na ferradura.
Declarou, em entrevista ao jornalista Paulo Henrique Amorim, serem "duas coisas diferentes", que não se contrapõem, a sua posição sobre a reforma política e o plebiscito proposto pelo PT e a presidente.
Tentou evitar, assim, uma trombada de frente, para comer pelas bordas.
De toda maneira, é triste ver a relação promíscua de ramos petistas com a rosca oligárquica que controla o parlamento. Faz parte dos problemas que arranham a reputação do partido nas ruas.
O PT deveria ser capaz de convencer seus parlamentares a andarem na linha. Ou oferecer a porta da rua como serventia da casa.
O retorno a uma conduta exemplar faria bem enorme à democracia.
Breno Altman é diretor editorial do site Opera Mundi e da revista Samuel
*O TERROR DO NORDESTE
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