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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sábado, agosto 31, 2013

Leandro Fortes: “há motivos para temores dos aliados de FHC”


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Reproduzimos abaixo um artigo de Leandro Fortes publicado na edição desta semana da Carta Capital sobre o lançamento do novo livro de Palmério Dória, O príncipe da privataria. Fortes faz alguns comentários muito interessantes sobre o que livro traz sobre o escândalo do filho  de Fernando Henrique com uma jornalista da Globo, assunto mantido em segredo pela emissora por muitos anos.
Trecho do artigo:
“Há razão para os temores dos aliados de FHC. Na obra, Dória reconstituiu um assunto que os tucanos prefeririam ver enterrado: a compra de votos no Congresso para a emenda da reeleição que favorecia o ex-presidente. E detalha o “golpe da barriga” que o deixou refém das Organizações Globo, em especial, e do resto da mídia durante seus dois mandatos.”
Carta Capital n˚ 764
As Desventuras do Príncipe
Lançamento: Livro sobre a compra de votos para a emenda da reeleição e o caso extraconjugal de FHC alvoroçam os tucanos
Por Leandro Fortes, na Carta Capital
A obra chega às livrarias no sábado 31, mas antes mesmo de sua publicação tem causado desconforto no ninho tucano. Luiz Fernando Emediato, publisher da Geração Editorial, responsável pela edição, tem recebido recados. O último, poucos dias atrás, foi direto: um cacique do PSDB telefonou ao editor para pedir o cancelamento do livro e avisou que a legenda havia contratado um advogado para impedir a publicação, caso o apelo não fosse atendido.
Tanto alvoroço deve-se ao lançamento de O Príncipe da Privataria – A história secreta de como o Brasil perdeu seu patrimônio e Fernando Henrique Cardoso granhou sua reeleição, do jornalista Palmério Dória. O título da obra faz alusão à alcunha de “príncipe dos sociólogos”, sugestão de amigos do ex-presidente, e ao termo privataria, menção ao processo de privatização comandado pelo PSDB nos anos 1990 e eternizado por outra obra da Geração Editorial, A Privataria Tucana, de Amaury Ribeiro Jr.
Há razão para os temores dos aliados de FHC. Na obra, Dória reconstituiu um assunto que os tucanos prefeririam ver enterrado: a compra de votos no Congresso para a emenda da reeleição que favorecia o ex-presidente. E detalha o “golpe da barriga” que o deixou refém das Organizações Globo, em especial, e do resto da mídia durante seus dois mandatos.
A maior novidade é a confirmação da identidade do Senhor X, a fonte anônima responsável pela denúncia do esquema de compra de votos para a emenda da reeleição. O ex-deputado federal Narciso Mendes, do PP do Acre, precisou passar por uma experiência pessoal dolorosa (esteve entre a vida e a morte depois de uma cirurgia) para aceitar expor-se e contar novos detalhes do esquema.

A operação, explica Mendes no livro, foi montada para garantir a permanência de FHC na Presidência e fazer valer o projeto de 20 anos de poder dos tucanos. Para tanto, segundo o ex-parlamentar, foram subornados centenas de parlamentares, e não apenas a meia dúzia de gatos-pingados identificados pelo jornalista Fernando Rodrigues, da Folha de São Paulo, autor das reportagens que apresentaram em 1997 as gravações realizadas pelo Senhor X, apelido criado pelo repórter para preservar a identidade do colaborador, então deputado do antigo PPB.
Os mentores da operação que pagou 200 mil reais a cada deputado comprado para aprovar a reeleição, diz o Senhor X, foram os falecidos Sergio Motta, ex-ministro das Comunicações, e Luís Eduardo Magalhães, filho de Antonio Carlos Magalhães e então presidente da Câmara dos Deputados. Em maio de 1997, a Folha publicou a primeira reportagem com a transcrição da gravação de uma conversa entre os deputados Ronivon Santiago e João Maia, ambos do PFL do Acre. No áudio, a dupla confessava ter recebido dinheiro para votar a favor da emenda. Naquele momento, o projeto tinha sido aprovado na Câmara e encaminhado para votação no Senado.
À época, a oposição liderada pelo PT tentou instalar uma CPI para apurar as denúncias. Mendes resume os acontecimentos a Dória e ao jornalista Mylton Severiano, que participou das entrevistas com o ex-deputado em Rio Branco: “Nem o Sérgio Motta queria CPI, nem o Fernando Henrique queria CPI, nem o Luís Eduardo Magalhães queria CPI, ninguém queria. Sabiam que, estabelecida a CPI, o processo de impeachment ou no mínimo de anulação da emenda da reeleição teria vingado, pois seria comprovada a compra de votos”.
E assim aconteceu. A denúncia foi analisada por uma única comissão de sindicância no Congresso, que apresentou um relatório contrário à instalação de uma CPI. O assunto foi enviado ao Ministério Público Federal (MPF), então sob o comando de Geraldo Brindeiro. O procurador fez jus ao apelido de “engavetador-geral”, nascido da sua reconhecida leniência em investigar casos de corrupção do governo FHC. O MP nunca instalou um processo de investigação, a mídia nunca demonstrou o furor investigatório que a notabilizaria nestes anos de administração do PT e o Congresso aprovou a emenda, apesar da fraude.
O Príncipe da Privataria tenta reconstituir os passos da história que levou uma repórter da TV Globo em Brasília, a catarinense Miriam Dutra, a um longo exílio de oito anos na Europa. Repleta de detalhes, a obra reconstituiu o marco zero dessa trama, “nalgum dia do primeiro trimestre de 1991”, quando o jornalista Rubem Azevedo Lima, ao caminhar por um dos corredores do Senado, ouviu gritos do gabinete do então senador Fernando Henrique Cardoso. “Rameira, ponha-se daqui pra fora!”, bradava o então parlamentar, segundo relato de Lima, ex-editorialista da Folha de S.Paulo, enquanto de lá saía a colega da TV Globo, trêmula e às lágrimas. A notícia de um suposto filho bastardo não era apenas um problema familiar, embora não fosse pouco o que o tucano enfrentaria nessa seara. A mulher traída era a socióloga Ruth Cardoso, respeitada no mundo acadêmico e político. O caso extraconjugal poderia atrapalhar os planos futuros do senador. Apesar de se apresentar como um “presidente acidental”, em um tom de desapego, FHC sempre se imaginou fadado ao protagonismo na vida nacional.
Escreve Dória: “Entra em cena um corpo de bombeiros formado por Sérgio Motta, José Serra e Alberico de Souza Cruz – os dois primeiros, cabeças do “projeto presidencial”; o último, diretor de jornalismo da Rede Globo e futuro padrinho da criança”. Motta e Serra bolaram o plano de exílio da jornalista, mas quem tornou possível a operação foi Souza Cruz, de atuação memorável na edição fraudulenta do debate entre Collor e Lula na tevê da família Marinho às vésperas do segundo turno. A edição amiga, comandada diretamente por Roberto Marinho, dono da emissora, e exibida em todos os telejornais do canal, levaria o “caçador de marajás” ao poder. Acusado de corrupção, Collor renunciaria ao mandato para evitar o impeachment.
Miriam Dutra e o bebê foram viver na Europa e o caminho político de FHC foi novamente desinterditado. Poucos anos depois, ele se tornaria ministro da Fazenda do governo de Itamar Franco, surfaria no sucesso do Plano Real, a ponto de renegar a importância do falecido ex-presidente na implementação da estabilidade monetária no País, e venceria a eleição de 1994 no primeiro turno.
Por muito tempo, apesar de o assunto circular nas principais rodas políticas de Norte a Sul, Leste e Oeste, imperou nos principais meios de comunicação um bloqueio a respeito do relacionamento entre o presidente e a repórter. Há um pressuposto não totalmente verdadeiro de que a mídia brasileira evita menções à vida particular dos políticos, ao contrário das práticas jornalísticas nos EUA e Reino Unido. Não totalmente verdadeiro, pois a regra volta e meia é ignorada quando se trata dos adversários dessa mesma mídia.
No fim, o esforço para proteger FHC mostrou-se patético. Só depois da morte de Ruth Cardoso, em 2008, o ex-presidente decidiu assumir a paternidade do filho da jornalista. Mas um teste de DNA, feito por pressão dos herdeiros do tucano, provou que a criança não era dele.
Dória entrevistou inúmera personalidades, entre elas o ex-presidente da República Itamar Franco, o ex-ministro e ex-governador do Ceará Ciro Gomes e o senador Pedro Simon, do PMDB. Os três, por variadas razões, fizeram revelações polêmicas sobre FHC e o quadro político brasileiro. Há outras declarações pouco abonadoras da conduta do ex-presidente. A obra trata ainda do processo de privatização, da tentativa de venda da Petrobras e do plano de entrega da Caixa Econômica Federal e do Banco do Brasil ao setor privado. “O livro mostra que FHC é um caso de crime continuado”, resume o autor.
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Por: Miguel do Rosário
*Tijolaço 

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