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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, agosto 27, 2013

O médico cubano negro e a intolerância da nossa elite branca



A foto que está circulando hoje pela internet de um médico negro de Cuba sendo vaiado por jovens brancas de jaleco branco em Fortaleza é ilustrativa do significado da insana luta a que se dispuseram muitos de nossos doutores. Eles não estão lutando pela saúde da população, mas pelos seus interesses mais mesquinhos. E por isso não aceitam que um negrão cubano, que se brasileiro fosse serviria pra catar suas latas de lixo num caminhão de coleta ou ainda carregar fardos de carga num armazém, venha para o Brasil ocupar um espaço que, inclusive, ele não deseja.
Boa parte da argumentação dos médicos que têm radicalizado no discurso xenófobo contra os que aceitaram trabalhar nos cantões do Brasil é a de que eles estudaram muito para conseguir passar num vestibular. E que os estrangeiros não. Que eles pagaram caro pelo curso. E que os estrangeiros não. Que eles investiram na carreira para ter retorno futuro. E que com a vinda dos estrangeiros isso está em risco. Este argumento final é o verdadeiro x da questão. Boa parte dos nossos médicos decidiram ser médicos para permanecer num patamar restrito da elite. Mas talvez não se deem conta de que esse corporativismo é a base da morte de milhares de brasileiros pobres e miseráveis.
Eles não são contra apenas os médicos estrangeiros ou de Cuba, mais especificamente. Eles também são contra a criação de novas faculdades de medicina. Os conselhos vivem desqualificando as iniciativas do governo pra criar novos cursos.
Ou seja, a foto que está ilustrando este post é significativa para pensar o país que queremos. Se queremos um Brasil da inclusão, onde seja algo normal ser atendido por médicos negros que não sejam cubanos. Se queremos um Brasil onde estrangeiros sejam recebidos com respeito. Se queremos um Brasil onde saúde seja um direito de todos. Ou se preferimos viver num país de brancos de jalecos brancos que exigem ser chamado de doutores exatamente porque se acham acima daqueles que deveriam tratar com respeito e dignidade.
O interesse de uma corporação não pode estar acima dos interesses de toda a sociedade. E os médicos que estão nas ruas vaiando os seus colegas cubanos nunca estiveram nas ruas lutando por melhorias na área da saúde. Os que estiveram e estão nesta luta por um sistema único de qualidade, por exemplo, não se dignam a participar de um papelão desses.
Essa foto fica pra história, como a daquelas dos navios negreiros. Mas neste caso, pelo seu inverso. Porque negros de Cuba aceitaram vir pra cá contribuir pra melhorar a vida de outros negros e brancos pobres. E foram açoitados pelas vaias de brancos e brancas que se lixam pra vida dessa enorme parcela da população. Porque eles são da Casa Grande. E a Casa Grande sempre se locupletou com a péssima qualidade de vida da senzala.
Assista abaixo ao vídeo, onde um grupo de cerca de 50 médicos vaiaram e xingaram os profissionais cubanos, chamando-os de “escravos“.

*revistaforum

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