Discurso de Dilma colocou a direita na defensiva
A campanha começou
Dilma deixou a mensagem de que o país pode não estar muito bem com ela, mas estará muito pior com seus adversários. E agora?
Paulo Moreira Leite
O pronunciamento de Dilma Rousseff, na véspera do 1º de maio, foi o ato inicial da campanha presidencial de 2014.
Ao
defender o aumento de 10% no Bolsa Família, a correção das alíquotas do
Imposto de Renda e a política de valorização do Salário Mínimo, Dilma
traçou uma linha divisória na campanha presidencial.
Essas
medidas pegaram a oposição de surpresa e amarelaram os sorrisos do PSDB
e do PSB no palanque da Força Sindical, no dia seguinte, em São Paulo.
Em vez de anunciar suas propostas, Aécio Neves e Eduardo Campos tiveram de comentar as propostas de Dilma.
Dormiram na ofensiva e acordaram na defensiva.
Tudo estava pronto para transformar a defesa da lei do Salário Mínimo, obra do governo Lula, em bandeira da oposição.
A
Lei vai expirar em 2015 e, de olho no eleitorado trabalhador, o
deputado Paulinho da Força já tinha apresentado um projeto de lei no
Congresso.
Num
texto assinado em companhia de um parlamentar do Solidariedade e de
outro do PSDB, Paulinho reconhece a atuação do governo Lula-Dilma quando
diz, no preâmbulo, que “nesses últimos anos o Brasil vem enfrentando
profundas mudanças, sobretudo no âmbito social”.
O projeto de lei é favorável à renovação da lei em vigor.
Era,
naquele momento, uma tentativa de deixar o governo na defensiva. Teria,
sem dúvida, apoio popular durante a campanha, não mais do que isso.
O pré-Ministro da Fazenda de Aécio Neves, Armínio Fraga, já deixou claro que acha o mínimo alto demais.
O pronunciamento de Dilma eliminou essa possibilidade.
O mesmo vale para o Bolsa Família, revalorizado em 10%, e a correção do imposto de renda, em 4,5%.
A
oposição, que sempre bateu no Bolsa-Preguiça ou mesmo Bolsa-Esmola,
agora é obrigada a dizer que os benefícios subiram pouco. Risos. Nem é
preciso dizer quem ficou perdendo no debate.
Falar
em correção integral do IR é uma maravilha para quem está na oposição –
como sabem todos aqueles que já tiveram de fechar contas públicas,
inclusive reservando dinheiro para os lucros dos bancos e dos
especuladores financeiros, e não para a melhoria da vida dos pobres.
Você sabe a verdade secreta: ajuda
para os pobres é desperdício e demagogia. Pacote de bondades.
Eleitoreiro, Para os bem situados, é investimento e justiça. Pacote de
bom senso. É difícil saber até onde poderia ter ido a correção. Ninguém
gosta de pagar imposto.
Mas é bom entender a lição básica: a turma que denunciar a “carga tributária” também adora esconder para quem se destinam os tributos que recolhe.
A lógica é simples: Estado
mais pobre significa menos dinheiro para os mais pobres -- mesmo que
uma parte dos recursos continue chegando aos muito ricos.
A confusão no palanque da Força, mais uma vez, confundiu políticos e jornalistas. Estes descrevem um mundo em que tudo é festa.
Depois
que Paulinho causou constrangimento ao falar que Dilma acabaria na
Papuda, até Aécio achou melhor procurar outras companhias.
Aébrio e Paulinho da Tequila |
Chegou a dizer para o secretário geral da Força, João Carlos Juruna Gonçalves, que ele deveria entrar para a campanha do PSDB.
A Força é uma central que abriga várias correntes políticas.
“Fizemos uma festa democrática, onde os interesses dos trabalhadores estão acima das convicções partidárias,” diz Juruna.
“Nosso compromisso é com os assalariados.”
Há dirigentes da Força alinhados com Aécio, como Paulinho.
Outros apoiam Eduardo Campos.
Juruna fez campanha por Lula em 2006, por Dilma em 2010 e planeja seguir o mesmo caminho em 2014.
Ao defender reivindicações ligadas aos
interesses dos trabalhadores e dos mais pobres, Dilma marca o território
e obriga a oposição a buscar votos num terreno desfavorável.
O apoio irrestrito de Lula ajuda a reforçar essa situação.
Como já foi dito, estamos assistindo a reconstrução de políticas de classe.
Muita gente acha isso feio, anacrônico, pré-histórico.
É a mesma turma que saiu da esquerda, foi para a direita e agora diz que esquerda e direita não existem mais.
O condomínio Lula-Dilma encara, em 2014, a eleição mais difícil desde sua chegada ao Planalto, em 2003.
Após “profundas mudanças, sobretudo no âmbito social,” como admitia o
projeto de lei de Paulinho, a oposição procura todos os atalhos para
recuperar o poder de Estado.
Os donos de jornais nem
precisam mais dizer que resolveram ajudar uma oposição muito fraquinha,
como aconteceu em 2010. Está na cara.
Eduardo Campos chega a brigar com Marina Silva porque defende a independência do Banco Central, bandeira reacionária que faria corar o avô Miguel Arraes – e, provavelmente, o próprio Eduardo Campos há seis meses atrás.
Aécio Neves não teve receio de anunciar sua “coragem” para tomar “medidas impopulares” –
qualquer pessoa que entende um pouco de geopolítica social sabe que
isso equivale a falar grosso com a Bolívia e afinar a voz diante de
Washington.
No 1º de maio, no entanto, todos queriam mostrar-se preocupadíssimos como o bem-estar do povo.
A mensagem de Dilma é simples.
O país pode não estar muito bem com ela. Mas estará muito pior sem ela. Este é o debate em 2014.
do Blog SQN
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