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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

domingo, maio 04, 2014

    Discurso de Dilma colocou a direita na defensiva



A campanha começou 

Dilma deixou a mensagem de que o país pode não estar muito bem com ela, mas estará muito pior com seus adversários. E agora? 

Paulo Moreira Leite 

O pronunciamento de Dilma Rousseff, na véspera do 1º de maio, foi o ato inicial da campanha presidencial de 2014.  

Ao defender o aumento de 10% no Bolsa Família, a correção das alíquotas do Imposto de Renda e a política de valorização do Salário Mínimo, Dilma traçou uma linha divisória na campanha presidencial. 

Essas medidas pegaram a oposição de surpresa e amarelaram os sorrisos do PSDB e do PSB no palanque da Força Sindical, no dia seguinte, em São Paulo. 

Em vez de anunciar suas propostas, Aécio Neves e Eduardo Campos tiveram de comentar as propostas de Dilma.  

Dormiram na ofensiva e acordaram na defensiva. 

Tudo estava pronto para transformar a defesa da lei do Salário Mínimo, obra do governo Lula, em bandeira da oposição. 

A Lei vai expirar em 2015 e, de olho no eleitorado trabalhador, o deputado Paulinho da Força já tinha apresentado um projeto de lei no Congresso. 

Num texto assinado em companhia de um parlamentar do Solidariedade e de outro do PSDB, Paulinho reconhece a atuação do governo Lula-Dilma quando diz, no preâmbulo, que “nesses últimos anos o Brasil vem enfrentando profundas mudanças, sobretudo no âmbito social”. 

O projeto de lei é favorável à renovação da lei em vigor.  

Era, naquele momento, uma tentativa de deixar o governo na defensiva. Teria, sem dúvida, apoio popular durante a campanha, não mais do que isso. 

O pré-Ministro da Fazenda de Aécio Neves, Armínio Fraga, já deixou claro que acha o mínimo alto demais. 

O pronunciamento de Dilma eliminou essa possibilidade. 

O mesmo vale para o Bolsa Família, revalorizado em 10%, e a correção do imposto de renda, em 4,5%. 

A oposição, que sempre bateu no Bolsa-Preguiça ou mesmo Bolsa-Esmola, agora é obrigada a dizer que os benefícios subiram pouco. Risos. Nem é preciso dizer quem ficou perdendo no debate. 

Falar em correção integral do IR é uma maravilha para quem está na oposição – como sabem todos aqueles que já tiveram de fechar contas públicas, inclusive reservando dinheiro para os lucros dos bancos e dos especuladores financeiros, e não para a melhoria da vida dos pobres. 

Você sabe a verdade secreta: ajuda para os pobres é desperdício e demagogia. Pacote de bondades. Eleitoreiro, Para os bem situados, é investimento e justiça. Pacote de bom senso. É difícil saber até onde poderia ter ido a correção. Ninguém gosta de pagar imposto. 

Mas é bom entender a lição básica: a turma que denunciar a “carga tributária” também adora esconder para quem se destinam os tributos que recolhe. 

A lógica é simples: Estado mais pobre significa menos dinheiro para os mais pobres -- mesmo que uma parte dos recursos continue chegando aos muito ricos. 

A confusão no palanque da Força, mais uma vez, confundiu políticos e jornalistas. Estes descrevem um mundo em que tudo é festa. 

Depois que Paulinho causou constrangimento ao falar que Dilma acabaria na Papuda, até Aécio achou melhor procurar outras companhias.


Aébrio e Paulinho da Tequila

Chegou a dizer para o secretário geral da Força, João Carlos Juruna Gonçalves, que ele deveria entrar para a campanha do PSDB. 

A Força é uma central que abriga várias correntes políticas.  

“Fizemos uma festa democrática, onde os interesses dos trabalhadores estão acima das convicções partidárias,” diz Juruna. 

“Nosso compromisso é com os assalariados.” 

Há dirigentes da Força alinhados com Aécio, como Paulinho. 

Outros apoiam Eduardo Campos. 

Juruna fez campanha por Lula em 2006, por Dilma em 2010 e planeja seguir o mesmo caminho em 2014. 

Ao defender reivindicações ligadas aos interesses dos trabalhadores e dos mais pobres, Dilma marca o território e obriga a oposição a buscar votos num terreno desfavorável. 

O apoio irrestrito de Lula ajuda a reforçar essa situação.  

Como já foi dito, estamos assistindo a reconstrução de políticas de classe. 

Muita gente acha isso feio, anacrônico, pré-histórico. 

É a mesma turma que saiu da esquerda, foi para a direita e agora diz que esquerda e direita não existem mais. 

O condomínio Lula-Dilma encara, em 2014, a eleição mais difícil desde sua chegada ao Planalto, em 2003. 

Após “profundas mudanças, sobretudo no âmbito social,” como admitia o projeto de lei de Paulinho, a oposição procura todos os atalhos para recuperar o poder de Estado. 

Os donos de jornais nem precisam mais dizer que resolveram ajudar uma oposição muito fraquinha, como aconteceu em 2010. Está na cara. 

Eduardo Campos chega a brigar com Marina Silva porque defende a independência do Banco Central, bandeira reacionária que faria corar o avô Miguel Arraes – e, provavelmente, o próprio Eduardo Campos há seis meses atrás. 

Aécio Neves não teve receio de anunciar sua “coragem” para tomar “medidas impopulares” – qualquer pessoa que entende um pouco de geopolítica social sabe que isso equivale a falar grosso com a Bolívia e afinar a voz diante de Washington. 

No 1º de maio, no entanto, todos queriam mostrar-se preocupadíssimos como o bem-estar do povo. 

A mensagem de Dilma é simples. 

O país pode não estar muito bem com ela. Mas estará muito pior sem ela. Este é o debate em 2014.

do Blog SQN

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