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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sábado, maio 31, 2014

VI Cúpula dos BRICS

Em Fortaleza, mais um passo para detonar Bretton Woods


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Os BRICS e o fim de Bretton Woods
Fatos históricos importantes, muitas vezes, passam em branco para seus contemporâneos. Nos dias 15, 16 e 17 de julho, em Fortaleza, ocorre a VI Cúpula dos BRICS. As Cúpulas têm reunido os Chefes de Estado de Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul anualmente desde 2009. A reunião de Fortaleza deverá consolidar os BRICS como uma organização dotada de instrumentos concretos para influir na economia e política internacionais. Este evento não tem merecido a atenção devida na mídia, na academia e nos debates da internet.
por Igor Grabois, especial para o Viomundo, 25 de maio de 2014 às 13:07
Os círculos bem-pensantes e a mídia no Brasil se espelham na Europa e nos EUA. Desprezam a integração sul-americana e torcem o nariz para as iniciativas Sul-Sul. Uma política brasileira para a África provoca reações entre o escárnio e a ojeriza.
Promovem uma campanha sistemática contra o MERCOSUL. Querem a ALCA e o TAFTA (acordo de comércio e investimentos entre EUA e União Européia).
Quanto aos BRICS, a conversa é de que eles não têm nada em comum, exceto o tamanho. Pois eles têm muitas coisas em comum: o inimigo.

Os BRICS representam 43% da população mundial, 27% do PIB mundial e apenas 15% das cotas do FMI. Pelo critério do poder de compra, a China é a primeira economia mundial, a Índia a quarta, o Brasil a sétima e a Rússia a décima economia mundial. Estão fora do G-8, que voltou a ser G-7, após a expulsão da Rússia em função da crise ucraniana.
Crescimento econômico, agricultura, participação no comércio exterior, indústria, produção de energia etc, todos os dados mostram a ascensão dos BRICS e a estagnação do G-7.
 
Rússia, Índia. China e Brasil aumentam a cada ano fiscal seus gastos militares. Do G-7, apenas o Japão amplia seus gastos militares para se contrapor à China. Os outros cortam gastos, inclusive os EUA, apesar do gigantismo de sua máquina militar. A despeito da projeção dos países BRICS, há um movimento para obstar a influência política e econômica desses países.
Neste quadro, nada mais lógico do que a associação de Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Desde a primeira cúpula dos BRICS em Ekaterinenburgo, em 2009, os acordos multilaterais e bilaterais se multiplicaram. Ciência e tecnologia, energia, compartilhamento de estatísticas, agricultura, energia, educação, defesa, espaço, em suma, a materialização de uma tirada de um diretor do Goldman Sachs é veloz.
Enquanto os BRICS aprofundam os laços, a reação de EUA, União Européia e Japão é cada vez mais barulhenta.
Não pode haver dúvidas dos verdadeiros alvos dos ataques dos EUA e União Européia na Ucrânia, na Síria e na Venezuela. Os EUA resolveram, agora, indiciar oficiais chineses por ciberespionagem... Snowden que o diga.
The Economist e Financial Times assumiram o papel de porta-voz dos rentistas brasileiros e estrangeiros na luta contra o que a política econômica brasileira pode ter de intervenção estatal e distributivista.
Desde 1945, o mundo capitalista foi regido pelos acordos de Bretton Woods, cidade do Massachusets, onde os vitoriosos da segunda guerra - sem a União Soviética - se reuniram para elaborar medidas para evitar crises como a de 1929.
Foi criado um banco de desenvolvimento, o Banco Mundial e um fundo para prevenir e combater crises cambiais, o FMI. E mais importante, elegeram o dólar como moeda de conversibilidade internacional. A solvência de um país passou a ser medida pela quantidade de dólares que possui.
Porém, o arranjo de Bretton Woods mostrou sinais de esgotamento a partir da crise do petróleo nos anos 70. A dívida dos países latino-americanos e do leste europeu explodiu. A terapia do FMI matava os doentes, ao invés de curá-los.
A América Latina enfrentou a recessão econômica e a tragédia social sob a égide do Fundo. E a política do Fundo não preveniu as crises cambiais, ao contrário, contribuíram para agravá-las.
China e Rússia, após a queda do socialismo real em 1989/90, não foram absorvidos no sistema Bretton Woods. Argentina e Brasil, principais clientes do Fundo, se livraram dos "empréstimos-ponte" na década passada. O Fundo passa a ser visto como um estorvo, não uma solução. O FMI se dedica, agora, a detonar as economias da Grécia, Portugal, Espanha e Irlanda para garantir o euro e as aplicações de banqueiros alemães.
Em 2010, no auge da insolvência dos países do sul da Europa, chegou-se a um acordo no Conselho de Governadores do FMI. Haveria nova distribuição das cotas do Fundo, diminuindo o poder de EUA, União Européia e Japão. Em troca, os BRICS compareceriam com 70 bilhões de dólares. Um alívio para a Europa em crise. O Congresso estadunidense, simplesmente, rejeitou o acordo no início deste ano. A gestão do FMI continua como dantes e os 70 bilhões não vão aparecer. Como diz aquela subsecretária, f*-se a União Européia.
Fortaleza, julho de 2014. Os Chefes de Estado dos BRICS assinarão o acordo de criação do Novo Banco de Desenvolvimento, o Banco dos BRICS. Mais, assinarão um Acordo Contingente de Reservas. Um Banco Mundial e um FMI dos BRICS. China e Rússia fecharam acordo de fornecimento de gás nominado em rublos e yuans. Brasil e China já fazem parte do seu comércio nominado nas respectivas moedas nacionais.
As duas entidades financeiras, inicialmente, terão atuação nos países signatários. Nada impede que atuem junto a países fora dos BRICS. É só o começo. Afinal, para que acumular dólares, aturar as idiossincrasias das autoridades monetárias estadunidenses se os ventos batem em outra direção?
*Pravda

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