Maria Clara Prates
Então chefe do SNI, Newton Cruz está entre os denunciados e pode pegar pena de 36 anos de prisão |
Pouco mais de um mês depois do aniversário dos 50 anos do golpe militar no Brasil, a Justiça Federal aceitou, em decisão histórica, pôr no banco dos réus peças importantes para manutenção do regime de exceção no país, que vão responder por um dos mais marcantes atos de terror do período: o fracassado atentado do Riocentro, em Jacarepaguá, ocorrido em 30 de abril de 1981. Trinta e três anos depois, o coronel da reserva Wilson Luiz Chaves Machado, o ex-delegado Cláudio Antônio Guerra e os generais reformados Nilton de Albuquerque Cerqueira, Edson Sá Rocha e Newton Araújo de Oliveira e Cruz e o major da reserva Divany Carvalho Barros responderão pelos crimes de tentativa de homicídio doloso (duplamente qualificado por motivo torpe e uso de explosivo), associação criminosa armada e transporte de explosivo, entre outros.
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"Os fatos narrados na denúncia encontram-se, em tese, dentro deste contexto, na medida em que, segundo a tese ministerial, a ser submetida ao contraditório, o atentado a bomba descrito fazia parte de uma série de outros 40 semelhantes, ocorridos no período de um ano e meio, direcionados à população civil, com o objetivo de retardar a reabertura política que naquele momento já se desenhava”, disse a juíza. E acrescentou: “Não por acaso teriam sido escolhidas as festividades do dia 1º de maio, no Riocentro, tidas como símbolo dos movimentos contrários à ditadura. Também a referendar essa ideia está a suposta tentativa de atribuir o atentado a movimentos de esquerda, narrada na inicial acusatória.”
De acordo com a denúncia – apresentada pelos procuradores procuradores Antônio Cabral, Andrey Mendonça e Marlon Weichert –, o general Newton Cruz, então chefe do temido Serviço Nacional de Informação (SNI), além dos outros crimes, vai responder também pelo delito de favorecimento pessoal. Também o general reformado Edson Sá Rocha vai responder ainda por associação criminosa armada, e o major reformado Divany Carvalho Barros, por fraude processual. Até oferecer a denúncia, os procuradores investigaram os fatos durante quase dois anos, o que significou a análise de 38 volumes de documentos. Além disso, foram ouvidas 42 testemunhas e investigado um total de 36 horas de gravação. O MPF contou com a cooperação internacional da França, Bélgica e Argélia.
Punição
Ao tomar conhecimento da decisão da Justiça Federal, os procuradores do Grupo de Trabalho Justiça de Transição afirmaram que “a decisão, além de reafirmar o compromisso do Estado brasileiro com as normas do direito internacional, reforça a compreensão disseminada na sociedade brasileira de que os crimes cometidos na época da ditadura militar devem ser punidos”. Para a juíza Ana Paula, “passados 50 anos do golpe militar de 1964, já não se ignora mais que a prática de tortura e homicídios contra dissidentes políticos naquele período fazia parte de uma política de Estado, conhecida, desejada e coordenada pela mais alta cúpula governamental.”
Penas Segundo o MPF, os denunciados planejaram minuciosamente o ataque um ano antes do dia do show, com a participação decisiva de outros nove militares também denunciados, mas que já morreram. Os procuradores definem a ação dos militares como uma atuação de “organização criminosa que tinha um núcleo de planejamento e um núcleo operacional (também denominado “Grupo Secreto”).” Em razão disso, os procuradores querem a pena mínima de 36 anos de prisão para Wilson Machado, Cláudio Guerra e Nilton Cerqueira, de 36 anos e 6 meses de reclusão para Newton Cruz, de dois anos e seis meses para Sá Rocha, e de um ano de detenção para Divany Barros.
Memória
Erro e morte
O atentado do Riocentro foi tramado por militares insatisfeitos com o processo de abertura política no governo do general João Figueiredo. O plano era detonar bombas e causar tumulto durante um show de celebração do Dia do Trabalho no Riocentro, em Jacarepaguá (Zona Oeste do Rio), e culpar movimentos de esquerda pelo ato. A ação fracassou porque um dos artefatos explodiu dentro do Puma (foto) usado pelos dois militares que executavam o atentado – o então capitão Wilson Machado e o sargento Guilherme Pereira do Rosário, ambos agentes do Destacamento de Operações de Informações do 1º Exército. Rosário morreu no ataque. Minutos depois, outra bomba abriu um buraco no chão em frente à central de energia, sem danos. O espetáculo continuou.
*em.com.br
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