Crise aumenta prostituição de idosos na Coreia do Sul
Mais de 400 mulheres entre 50 e 70
anos de idade circulam diariamente no parque Jongmyo, no coração de
Seul, capital da Coreia do Sul, vendendo o corpo para sobreviver. Muitas
não conseguem e, sem outra opção, cometem suicídio. Os dados e relatos
deste texto foram extraídos do jornal New York Times e da BBC News, em
Seul.
O parque Jongmyo foi construído em torno
de um templo que homenageia o filósofo chinês Confúcio, cujas ideias
sobre a veneração aos idosos foram centrais à cultura oriental durante
séculos. Os coreanos viviam na certeza de que, um dia, quando chegassem à
velhice, seriam cuidados por seus filhos.
Hoje, os tempos são outros. As novas
gerações não têm condições de cuidar dos seus idosos, e o Governo não
atende às necessidades mínimas da população. Não existe
seguro-desemprego ou previdenciário e nem de saúde. Então, os homens e
mulheres se veem sem poupança, sem uma aposentadoria que garanta o
básico e sem uma família em que se apoiar. A taxa de pobreza na terceira
idade, na Coreia do Sul, é de quase 50%, já que 70% dos aposentados
recebem apenas 5% do salário médio.
Kim Eun-ja é uma entre as várias idosas
coreanas que ganham a vida vendendo pequenas garrafas que contêm uma
bebida chamada Bacchus, um energético muito comum entre os coreanos.
Ela, aos 71 anos, usa batom vermelho e casaco da mesma cor. Segura uma
sacola grande com a bebida que vende, além de se prostituir. Com
frequência, essas senhoras também oferecem aos fregueses uma injeção
especial que, supostamente, ajuda os clientes a conseguirem uma ereção.
As agulhas usadas para essas injeções chegam a ser reutilizadas até 20
vezes. Como resultado, 40% dos homens que frequentam o parque estão
infectados por várias doenças.
“Tenho 60 anos e não tenho dinheiro. Não
posso contar com meus filhos. Eles também estão em apuros. Praticamente
todas as pessoas idosas aqui neste parque estão na mesma situação”,
afirma Kim. Outra senhora sentada no parque se desespera: “Estou com
fome; não preciso de respeito, não preciso de honra, só quero fazer três
refeições ao dia”.
Muitas idosas que não admitem vender o
corpo para sobreviver comentem suicídio. Foi o caso de uma viúva, de 78
anos, que chocou a população: em vez de tirar a própria vida em casa,
silenciosamente, como muitos sul-coreanos o fazem, a mulher fez de sua
morte um ato final de protesto público contra uma sociedade que a
abandonou. Ela bebeu pesticida durante a noite em frente à Prefeitura de
Seul, após ter suspensos seus benefícios de assistência social,
afirmando que não precisavam mais sustentá-la, agora que seu genro havia
encontrado emprego. “Como podem fazer isso comigo?”, perguntava no
bilhete de suicídio encontrado pela Polícia. “Uma lei deveria servir ao
povo, mas ela não me protegeu”, dizia o bilhete.
As taxas de suicídio entre pessoas com mais de 65 anos subiram para 4.378, em 2010, contra 1.161 em 2000.
Mais uma cruel consequência do capitalismo
A situação da população da Coreia do Sul
se agravou a partir de 1997 com a grave crise do capitalismo que abalou o
Leste da Ásia, atingindo principalmente Coreia do Sul, Tailândia,
Malásia e Indonésia.
Porém, o período crucial foi depois do
programa de ajustamento imposto pelo FMI em troca de um financiamento de
54 bilhões de dólares. O país, então, empreendeu um conjunto de
reformas. A maioria das empresas públicas foi privatizada, e as empresas
privadas foram liberadas para despedir os trabalhadores em função da
conjuntura de crise. Milhares de trabalhadores ficaram desempregados, o
que levou a não poderem mais arcar com o sustento de seus pais.
Então, num parque onde essas senhoras
deveriam passear, sentar nos bancos rodeados de árvores para ler um
livro, conversar com as amigas, ou simplesmente sentir o calor do sol no
corpo ou o pinicar da neve no rosto, elas são obrigadas a se despir da
sua dignidade, do acalento espiritual que a idade propicia, para uma
realidade que as leva a viver uma vida desregrada, agressiva,
devastadora, um estupro físico e social na dura escolha entre a
prostituição ou a morte.
Denise Maia, Rio de Janeiro
*AVerdade
Nenhum comentário:
Postar um comentário