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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

terça-feira, setembro 03, 2013

ARROGÂNCIA IMPERIAL, TIRO PELA CULATRA E OCASO MELANCÓLICO

Os Estados Unidos, com extrema arrogância, recusam-se a encarar a arapongagem  que praticam sob a ótica das leis internacionais. Mesmo agora, ao serem flagrados espionando ninguém menos do que a presidenta do Brasil, deixam claro que continuarão agindo de acordo com as próprias leis e o resto do mundo que se dane. 

Da mesma forma, o presidente Barack Obama considera que só precisa do aval do seu Congresso para ordenar bombardeios à Síria. Com isto, a ONU perde a razão de existir. 

Se tivessem um pingo de dignidade, as demais nações dela se retirariam, já que seu papel é apenas de figurantes, enquanto o protagonista aplica a seu bel prazer a lei do mais forte.

* * *

Se dúvida havia sobre a perda de mandato de João Paulo Cunha, Valdemar Costa Neto, Pedro Henry e José Genoíno, condenados à prisão como  mensaleiros, não há mais nenhuma. A péssima repercussão da lambança perpetrada pela Câmara Federal, ao permitir que o presidiário Natan Donadon continuasse deputado, selou-lhes o destino e fechou o caixão. 

Então, se houve quem tenha livrado a cara de Donadon para abrir um precedente favorável ao quarteto, deu um formidável tiro pela culatra.

Certos aprendizes de feiticeiro de Brasília continuam ignorando os humores do cidadão comum e a capacidade da indústria cultural, de amplificar rejeições ao máximo. 

Quem é burro, pede a Deus que o mate e ao diabo que o carregue...

* * *

A imprensa dá destaque excessivo ao julgamento do  mensalão, como se ainda existisse algum coelho para ser tirado da cartola. 

Não há. As condenações serão confirmadas e as penas, cumpridas. A esta altura do campeonato, qualquer outra decisão deixaria a imagem do STF em frangalhos. E os ministros estão bem cientes disto.

Os advogados deram o seu showzinho, mas de antemão sabiam que nada mudaria. Os acusados jogaram fora o dinheiro que melhor fariam se tivessem guardado para pagar as multas.

É comum os revolucionários, tendo meios para escapar, não cumprirem decisões judiciais que consideram injustas. A questão é: o Zé Dirceu e o Genoíno ainda se veem como tais? 

E há outro aspecto, o da própria injustiça. Pois a opção pela fuga só se justificaria na hipótese de inocência, não na de terem sido condenados por práticas nas quais quase todos os políticos incidem sem ser punidos. 

Incomoda-me muito, admito, a perspectiva de ver o Dirceu e o Genoíno presos. O simbolismo será deprimente ao extremo. Por mais que eles tenham se distanciado dos ideais de 1968, a direita vai celebrar como uma vitória sobre os revolucionários da nossa geração.  Posso imaginar o triunfalismo estampado na capa da Veja, que tanto fez para colocar o Dirceu no pelourinho, chegando até a espioná-lo da forma mais abjeta.
Sem afirmá-lo taxativamente, o Cesare Battisti várias vezes deu a entender que, caso se tornasse inexorável sua extradição, preferiria a morte do que oferecer a cabeça para ser exibida na sala de troféus do Berlusconi. 

Mas, claro, tudo depende da convicção íntima de cada um. 

Melhor teria sido se os ex companheiros jamais houvessem superestimado seu poder e exposto o flanco de forma tão temerária. Deram sopa pro azar e estão pagando caro por isso.
*naufragodautopia

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