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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sábado, setembro 14, 2013

"Chamar cantada de elogio é uma ofensa."



Pesquisa afirma que 99,6% das mulheres já sofreram assédio nas ruas
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Cantada não é elogio. (Foto: Thinskstock)Chamar cantada de elogio é uma ofensa. Falar da beleza de uma mulher não é proibido, mas “te chupava toda” não fala exatamente sobre isso. E é esse tipo de comentário que mulheres escutam diariamente.
Buscando entender esse fenômeno, a jornalista Karin Hueck criou uma pesquisa para a campanha Chega de Fiu Fiu e descobriu que 99,6% das 7762 participantes já foi assediada em espaços públicos.
Você pode ver a pesquisa completa no site, mas vou usar os dados para contar uma história comum na vida de milhares de mulheres. Os números abaixo significam a porcentagem de mulheres que disseram já ter passado por aquilo. E antes que digam que mulheres gostam do assédio: 83% das entrevistadas não se sente lisonjeada com os comentários.
Uma mulher sai de casa pela manhã. Ao pisar na rua, ela recebe uma cantada (98%). Ao pegar o metrô ou ônibus, mais uma (64%). No trabalho (33%), outra, e se ela resolver ir dar uma voltinha no shopping, mais uma (80%).
Quando essa mulher resolve ir para a balada, é assediada verbalmente (86%), puxada pelo braço (68%), cabelo (22%) ou cintura (57%). E ainda corre o risco de levar uma passada de mão (85%) nos peitos (17%), bunda (73%), cintura (46%) ou no meio das pernas (14%).
E responder a esses assédios dá medo, então essa mulher se cala (74%). Quando ela reclama do “linda” (84%), “gostosa” (83%), “delícia” (78%), “fiu fiu” (assovio) (73%), “princesa” (71%), “nossa senhora” (64%), “ô lá em casa” (62%), “boneca” (47%), “vem cá, vem” (44%), “te pegava toda” (36%) ou “te chupava toda” (36%) ela é xingada (68%) e vira “metida” (45%), “baranga” (16%), “gorda” (13%), “feia” (23%) ou “mal-comida” (25%).
Tem alguma coisa errada em tudo isso, não tem?
Agressões passionais
Por algum motivo, as pessoas passaram a acreditam que desejo não pode ser unilateral e que quando reprimido é necessário agredir quem o fez. Isso pode ser visto em festas por todo o país. E não é uma questão de educação ou acesso a informação: mulheres são agredidas por recusar investidas em todo tipo de lugar.
Quando eu era mais nova lembro que um cara, uma vez, queria ficar comigo. Minhas amigas ficavam com amigos dele, sempre saíamos juntos, mas eu não tinha a mínima vontade de nada além de tomar cerveja e dar risada na companhia dele. Entender isso não foi fácil e, um dia, durante uma festa na casa de um amigo, ele me pegou pelo pescoço, como se fosse me enforcar, apertando, e tentou me beijar.
Eu dei um tapa na cara dele e uma amiga minha ficou chocada. Ela tinha achado bonitinho o que ele fez, era uma prova de que ele queria muito ficar comigo. Para mim era apenas uma prova de que ele era uma pessoa extremamente perigosa.
Por que eu contei essa história? Porque no fim da pesquisa havia um espaço para contar histórias que transformaram quem você é e muitas delas têm ligação com esse tipo de agressão, vista como bonitinha por algumas pessoas. Outras delas falam sobre abusos sofridos por mulheres quando ainda eram crianças. De quem é a culpa?
Atração é uma coisa ótima. Agressão, não.
Cantada dá multa
Na Bélgica, por exemplo, as mulheres cansaram do assédio e a estudante de cinema Sofie Peeters resolveu gravar a reação dos homens quando ela andava nas ruas. O vídeo “Femme de la Rue” foi feito durante meses com uma câmera caseira. Os insultos eram tão degradantes que a prefeitura de Bruxelas resolveu que os “insultos verbais na rua” vão custar aos mal educados uma multa que varia de 75 a 250 euros. O flagrante não é algo difícil de fazer, né?!
A transformação
Poder sair de casa sem se importar com a roupa que se está usando, com os impropérios que se vai ouvir ou com as agressões que terá que lidar é o desejo de grande parte das mulheres – aquelas que entenderam que não são um artigo de decoração e que não existem apenas para o deleite masculino.
Nenhuma roupa, nenhum comportamento, nenhuma atitude justifica o abuso. Ser mulher não é sinônimo de ter de lidar com esse tipo de situação; ou pelo menos não deveria ser. Respeito não é coisa de gente fraca. Coisa de gente fraca é abusar de seu poder para o próprio deleite.
*Mariadapenhaneles

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