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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quarta-feira, setembro 15, 2010

Livro : Presidencia e os Jornalistas

Livro faz raio-X dos responsáveis pela ponte entre governo e imprensa

O desafio de representar o posicionamento do governo, acompanhar os passos do presidente da República, fazer a mediação com a imprensa, marcar entrevistas, administrar escândalos e crises, fazer comunicados oficiais e responder às perguntas dos jornalistas faz parte da dura rotina dos secretários de Imprensa e porta-vozes que atuam no Palácio do Planalto, em Brasília (DF). Estão sob pressão constante e não podem errar. Como bem definiu Alexandre Parola, que foi porta-voz do governo Fernando Henrique Cardoso, é como um goleiro: “Só erra uma vez. Se tomar um frango, vai para o banco. Você não pode errar em um briefing. O briefing é ao vivo. Então, se você diz uma grande besteira ao vivo, normalmente submete a sua demissão no mesmo dia.”

Esse e outros depoimentos estão no livro No Planalto, com a Imprensa graças ao minucioso trabalho de André Singer, Mário Hélio Gomes, Carlos Villanova e Jorge Duarte, que será lançado nesta terça-feira (14/9) no Palácio do Planalto, em Brasília (DF), com a presença do presidente Lula. O livro reúne os depoimentos de secretários de Imprensa e porta-vozes da presidência da República do Brasil desde Autran Dourado, em 1958, até 2005.

O ineditismo e resgate histórico marcam o livro de 987 páginas, produzido pela Secretaria de Imprensa da Presidência da República em parceria com a Fundação Joaquim Nabuco e a editora Massangana. A publicação reúne entrevistas com 24 secretários. A pesquisa chegou a 32 pessoas que ocuparam os cargos no período, mas oito já haviam falecido e dois não aceitaram o convite para entrevistas – o general José Maria de Toledo Camargo, que chefiou o setor em parte do governo Ernesto Geisel, em 1977 e 1978, e a jornalista Ana Tavares, que exerceu o cargo no governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Além dos porta-vozes e secretários, foram ouvidas outras 20 pessoas para compor um quadro do período anterior ao de Juscelino Kubitschek.

A obra nasceu com o objetivo de resgatar a memória institucional da Secretaria de Imprensa. Na edição das entrevistas, os autores optaram por preservar a fala original dos entrevistados, sem checar as versões, para não fugir da proposta original de preservação de conteúdo histórico. O resultado foi uma coletânea rica em memórias, com revelações inéditas e, em alguns casos, bombásticas, e o desabafo de homens que se incumbiram de ser a ponte entre o governo e a mídia, tendo, muitas vezes, que lidar com crises e atritos decorrentes da situação.

“Esse livro é ecumênico e mostra que apesar dos atritos que sempre existiram entre a imprensa e o governo, no papel dos secretários de Imprensa e porta-vozes houve uma tentativa de se estabelecer o melhor relacionamento possível com os jornalistas que acompanham a pauta política”, afirma Jorge Duarte, um dos autores.

Confira alguns trechos do livro:

“O secretário de Imprensa deve ter amor à profissão de jornalista, porque o amor à profissão fará com que ele tenha uma relação muito civilizada, muito correta com seus interlocutores. Estar atento àqueles projetos que formam a essência do governo, que levarão ou não o presidente para a História. De que adianta um governo que se dispõe a fazer ‘a’ e acaba fazendo ‘b’? A fixação na divulgação do projeto, que é a essência do seu propósito de governo, é o que a História vai registrar”.
Toninho Drummond, secretário de Imprensa do governo José Sarney

“A cada dia era preciso bater o recode da véspera, ser mais duro, mais independente, mais atrevido, mais radical. Era a receita para disputar a credibilidade dos leitores, ouvintes e espectadores. Ou talvez dos chefes, dos editores, quem sabe?”
Carlos Henrique Santos, secretário de Imprensa do governo José Sarney

“Porta-Voz é igual a goleiro, só erra uma vez. Se tomar um frango, vai para o banco”.
Alexandre Parola, porta-voz do governo Fernando Henrique Cardoso

“Na hora em que você assume uma função dessas, por bem ou por mal, você se identifica com o governo, com o presidente, não tem jeito. Mesmo que eu não conseguisse entender algumas alianças que foram feitas, até porque eu não sou político, tinha que defender o governo, como eu defendi”.
Ricardo Kotscho, secretário de Imprensa do governo Lula

“Foi muito difícil porque a responsabilidade é muito grande. Você não pode errar, qualquer erro sempre tem consequências, e é difícil estar preparado para responder a todas as perguntas que vão surgir, são muitas perguntas”.
André Singer, secretário de Imprensa do governo Lula

“A primeira coisa, mais básica, foi perder o medo da imprensa. Acho que todo mundo que não lida com a imprensa, no governo em geral, em qualquer governo, tem muito medo da imprensa”.
Georges Lamaziére, porta-voz do governo Fernando Henrique Cardoso

“Como eu poderia ser porta-voz ou secretário de Imprensa, se não sabia das coisas que se passavam? Tinha que realmente saber de tudo. É uma condição sine qua non, senão a pessoa fica vendida. Agora, sempre faziam uma triagem: isso eu posso falar agora, posso falar mais tarde, posso falar depois de amanhã. Aquela história: reunião secreta? Não existe reunião secreta, o assunto é que pode ser secreto; não posso desmentir um fato”.
Humberto Barreto, secretário de Imprensa do governo Geisel

Ouça aqui a íntegra do discurso do presidente:

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