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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

segunda-feira, abril 09, 2012

Dilma e Obama: aparente calmaria

Por Altamiro Borges

A visita da presidenta Dilma Rousseff aos EUA, que se inicia nesta segunda-feira, tem gerado distintas expectativas. Até agora, a mídia imperial não deu maior destaque ao fato. Já a mídia colonizada do Brasil insiste em dizer que a viagem deverá reatar as relações “cordiais” entre os dois países, afetada pela postura “agressiva” do Itamaraty na gestão de Lula-Celso Amorim.
Na avaliação de Eliane Cantanhêde, a da “massa cheirosa” do PSDB, “a beligerância verbal e as idiossincrasias entre o Brasil e EUA esfriaram muito de Lula para Dilma... O Itamaraty está mais tímido e Dilma não é tão bom produto de política externa quanto Lula era”. No mesmo rumo, o Estadão avalia que a visita consolidará os laços de amizade entre os dois países.

Agenda esconde divergências

Pela agenda divulgada por ambos os governos, a tranquilidade reinará nos contatos entre Dilma e Obama. O principal ponto será sobre a implantação do programa “Ciência sem Fronteiras”, de intercâmbio entre estudantes. A presidenta brasileira inclusive visitará algumas universidades. Também estão previstas discussões sobre programas de ciência e tecnologia e política comercial.

A calmaria, porém, é apenas aparente. Os EUA nunca abdicaram da sua condição de império, que se mete e interfere nas políticas de todos os países periféricos. É evidente que Obama e seus aspones tentarão convencer o Brasil a endurecer suas relações com a Síria, o Irã ou Cuba. Como potência capitalista em declínio, eles também defenderão os interesses econômicos dos EUA.

Continuidade da política externa

Nestes pontos, entretanto, o governo Dilma parece manter a política externa do seu antecessor. É certo que a retórica é mais “tímida”, mas o conteúdo permanece, na essência, o mesmo. Na recente reunião dos Brics, por exemplo, a presidenta condenou as políticas de sanção ao Irã ou de intervenção militar na Síria. Já na visita a Cuba, ela defendeu a soberania desta nação sabotada pelo império.

As divergências entre Dilma e Obama também deverão se manifestar nas questões econômicas. O Brasil registra déficit comercial crescente com os EUA – de US$ 8,1 bilhões. O império tenta empurrar sua grave crise para as “nações emergentes”. E o Brasil tem adotado algumas medidas, ainda tímidas, de proteção a sua economia, o que deve gerar atritos entre os dois presidentes.

Como se nota, a calmaria é aparente. Neste sentido, a análise de Jânio de Freitas, também na Folha, é mais certeira. “Sejam quais forem os temas de seu encontro, Dilma Rousseff e Barack Obama só prometem desencontro. Se concordarem em alguma coisa, é improvável que seja a presidente a ceder: o Brasil está em lua de mel com sua afirmação. O presidente está em convívio duvidoso com a reeleição”.

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