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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, abril 13, 2012

Espanha: cultivo de maconha atrai cidades afetadas por crise

Solução da droga encontrada por Raquera começa a ser sondada por outras cidades assoladas pela crise da Espanha. Foto: Getty Images
Solução da droga encontrada por Raquera começa a ser sondada por outras cidades assoladas pela crise da Espanha
Foto: Getty Images
ÉRICA CHAVES
Direto de Madri
A polêmica aprovação do aluguel de terrenos para o cultivo de maconha na cidade de Rasquera como antídoto à crise financeira gera repercussões e difunde a ideia pelo país. De acordo com representantes da Associação Barcelonesa Canábica de Autoconsumo (ABCDA), grupo que desfrutará do privilégio no município, a fama do caso já fez com que outros se interessassem por convênios semelhantes.
"Com a crise, estão todos endividados. Depois da notícia de Rasquera, outras cidades nos procuraram para que plantássemos maconha em parceria", explica Thais Santos, brasileira, sócia e colaboradora da ABCDA. O futuro cultivo aumentou a demanda pelo número de sócios, e cresce também a procura de pessoas que usam a erva com fins terapêuticos. "Foi incrível como cresceu o número de doentes que entraram em contato depois que a notícia sobre a possível plantação se espalhou", diz Vojislav Djordjevic, presidente da ABCDA.
O pequeno povoado da Catalunha tem cerca de 960 habitantes e uma dívida de 1,3 milhões de euros. A cidade já arrecadou 30 mil euros pelo contrato e receberá mais 50 mil ao mês para despesas com administração e segurança. Além disso, serão criados entre 40 e 50 novos postos de trabalho. "Muitos jovens saem daqui em busca de emprego e agora haverá mais oportunidades para que nossos filhos fiquem aqui com a família. Por isso, também os mais velhos estão contentes com a decisão", conta José María Insausti, colaborador da prefeitura.
"Vai ser aberta uma outra sede maior, porque esta já não comporta os membros agora. Depois de toda essa polêmica o telefone não para de tocar. Todo mundo quer ficar sócio também", fala um dos sócios que prefere não ser identificado.
Quem compõe e o que é a ABCDA
A ABCDA foi fundada há dois anos. Pagando uma taxa de 20 e 40 euros ao mês, os sócios têm direito a 27 gramas de cannabis por semana. Ela facilita o autoconsumo da droga, o que é considerado atividade legal na Espanha sempre que não haja lucro. O clube tem cerca de cinco mil membros. A maioria consome ludicamente, e 30% fumam a erva com fins terapêuticos. "São pessoas com doenças terminais como o câncer que mesmo não podendo fumar, bebem o chá da maconha", explica Thais Santos.
Para se tornar sócio, é preciso passar por uma entrevista e preencher um grande relatório antes que os membros organizadores aprovem a solicitação. "Aqui é tudo muito sério. No ano passado, declaramos quase meio milhão de euros e pagamos os impostos", afirma Djordjevic.
Percalços e dúvidas
Não foi fácil o caminho até o fim definitivo. Em 1º de março, depois de semanas de discussões entre políticos e conselheiros, a prefeitura de Rasquera aprovou a ideia como parte do plano para acabar com as dívidas da cidade. A ABCDA já havia repassado parte do dinheiro para o povoado, cujos habitantes, no entanto, exigiram um plebiscito, empurrando o início do cultivo ficou para o mês de julho.
Já no final de março, a pressão para que o clube desistisse do projeto veio de outro lado. A polícia apreendeu toda a maconha e o dinheiro arrecadado com o objetivo de demonstrar que os membros não consumiam a erva, mas a comercializavam. O caso continua sendo investigado, mas o dinheiro já foi devolvido. O cultivo no povoado começa em julho e o produto poderá ser consumido a partir de novembro deste ano até 2014, quando finalizam os dois anos de contrato.
*Terra

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