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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

domingo, agosto 18, 2013

A truculência de Barbosa é a mesma da Globo



Os massacres do Egito nos ensinam muita coisa. A mais importante delas é o risco de arruinar a democracia quando se a substitui descuidadamente por uma suposta “voz das ruas”. A demoracia é um regime baseado numa teoria de Estado já milenar, e que, apesar de seus incontáveis defeitos e contradições, revelou-se mais estável e progressista que todas as outras. E a base da democracia é o direito de cada um, não só nas ruas, mas nos campos, na beira dos rios, nas montanhas longínquas, ou mesmo apenas impossibilidade de sair de casa por alguma razão, de ter o mesmo direito à opinião e o mesmo peso em decisões políticas do que um manifestante acampado diante da casa do governador.



É incrível a hipocrisia da nossa imprensa. Quando governos de esquerda decidem consultar a população através da realização de plebiscitos, que são instrumentos legais e mesmo tradicionais, para ouvir a opinião da sociedade sobre temas importantes, nossos jornalões, repetindo a opinião do império, acusavam a tentativa de se criar uma “democracia plebiscitária”.

E aí, quando eles acham que a voz das ruas pode favorecer os seus interesses, eles dão uma pirueta conceitual e afirmam idiotices como “a voz das ruas ser a expressão da vontade do cidadão”, como fez Merval hoje em sua coluna.

Eu cito sempre Merval, quero deixar claro, porque ele é o porta-voz dos interesses daqueles que mandam na Casa Grande, dos mesmos que sempre se locupletaram com nossa miséria e subdesenvolvimento, a começar pela família Marinho. Merval é um lacaio deles.

E também porque é absolutamente chocante que, em pleno século XXI, vejamos a nossa grande mídia defendendo, despudoramente, teses linchatórias.

Está me parecendo que tudo é planejado. A grosseria de Joaquim Barbosa visa intimidar os outros juízes, como ele já fez na primeira fase do mensalão. Como imaginar as delicadas Carmen Lúcia e Rosa Weber enfrentando uma besta fera truculenta como esse homem?

Estaria certa a ex-ministra Ellen Gracie, quando reagiu assustada ao saber da nomeação de Barboas e disse: “Vai vir para cá um espancador de mulher?”

A crítica da imprensa à Barbosa é mascarada e maquiavelicamente preparada para fazê-lo parecer o “justiceiro do povo”. Tão grosso e tão justo! Como bons filisteus, eles criticam sua truculência de dia, mas a festejam à noite, entre risos e copos de uísque.

Alguns nem fingem. Merval acusa hoje, criminosamente, o ministro Lewandowski:

“desde o início do julgamento [Lewandowski] denota a intenção de retardá-lo ao máximo”

Isso não é acusar um ministro de fazer chicana?

A repreensão da Casa Grande midiática aos maus modos de Joaquim Barbosa visa parecer, deliberadamente, a crítica de um inglês pedante à maneira desleixada de Robin Wood se vestir. Só que Wood roubava dos ricos para dar aos pobres. Barbosa quer prender um punhado de pobres para agradar aos ricos. Sim, pobres. Pizzolato é pobre e sem poder. José Genoíno é pobre e sem poder. Os publicitários condenados já devem estar hoje empobrecidos e, definitivamente, não tem e nunca tiveram poder. Entre os réus do mensalão, estão secretárias subalternas, sem dinheiro e sem poder, condenadas a décadas de prisão, porque o STF tem de cumprir o teatro organizado pela Globo, de prender “poderosos”…

Prender José Dirceu, sem prova nenhuma, acusando-o do crime capital de fazer política, ganhar eleições e lutar pela governabilidade, será uma dulcíssima vingança para os donos da mídia. Mas ele também não tem dinheiro ou poder. Quando teve poder, era um poder alcançado via sufrágio universal. Era um poder imantado de democracia e soberania popular. Não era um poder amealhado com a venda do Brasil a interesses estrangeiros nem com a entrega de nossa democracia à sanha de ditadores, como é o poder da Globo. Um poder que lhe permitiu acumular uma fortuna hoje avaliada em 52 bilhões de reais!

Mas a Globo, com apoio de seus coxinhas de estimação, chama Pizzolato, um homem pacato que nunca exerceu cargo importante no PT, nunca foi influente no governo e jamais foi rico, de “réu poderoso”; e ameaça o STF com uma revolução egípcia se não prendê-lo. Diante da “voz das ruas” e dos editoriais raivosos, quem se importará com o sofrimento de sua família, não é? Um pequeno sacrifício humano aqui e ali não vai fazer mal a ninguém… Como diria Barbosa, em entrevista recente, ele é “personagem menor”…

Sem argumentos, os donos da mídia estão apelando, assim como Barbosa, à truculência, à ameaça. Enquanto Barbosa violenta o direito de um de seus pares de expor seu voto, e o calunia publicamente, diante das câmeras da TV Justiça, a Globo e seus satélites sabotam o direito à informação de seus leitores, usando concessões públicas que ganharam no regime militar para defender seus interesses politicamente reacionários e financeiramente escusos.
Por: Miguel do Rosário

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