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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

domingo, janeiro 04, 2015

Como o Estado autoriza que um indivíduo possa se tratar com uma droga com altas quantidades de THC, se isso faz mal, e o mesmo Estado, prenda pessoas que utilizam a tal planta que com contém o tal THC?! Resolva esse enigma.

A CHARADA DO ANO: Brasil e sua política de drogas esquizofrênica


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Diego Ferreira¹, agente da lei, Conselheiro Estadual de Políticas sobre Drogas – CONED no Rio Grande do Sul e porta-voz da Leap Brasil, aborda a esquizofrenia acerca da nossa política de drogas, em que ao tempo que um indivíduo é autorizado a se tratar com uma droga com altas quantidades de THC, o mesmo Estado que autoriza, prende pessoas que utilizam a tal planta que com contém o tal THC!?
Resolva esse enigma, essa é a charada do ano, que coloca em xeque a política esquizofrênica de repressão das drogas.
Como já é notório na medicina e na ciência, as drogas, sejam elas legais ou ilegais, têm o potencial de causar dependência química, física ou apenas psicológica, sendo que sua classificação de risco, e de crime, hodiernamente, como ilícita ou lícita, é uma decisão político-econômica e não com fundamento nas ciências da saúde e de políticas públicas eficientes.
A história nos mostra que todas as substâncias em algum momento foram consideradas inapropriadas, do mal, e portanto proibidas e criminalizadas. O tabaco foi proibido e criminalizado e seus usuários eram condenados a penas duríssimas, como jogar chumbo derretido na garganta dos condenados e à pena de morte. O Álcool, foi proibido e criminalizado, sendo que seus usuários eram presos. Essas políticas de repressão baseadas nos preconceitos, controle de mercado e imposição de certos aspectos morais, não se sustentaram, haja vista sua impopularidade e por que geraram os maiores desastres sociais e econômicos para os países que as implementaram.
As nações que inteligentemente estão revendo e aperfeiçoando suas políticas de drogas e suas leis criminais sobre drogas, estão obtendo resultados satisfatórios, como redução drástica da criminalidade rasteira, da violência gratuita (homicídios), de doenças e, principalmente, a redução de dependentes, pelo seu acolhimento e tratamento.
Aperte e Leia: Polícia Drogada
Como sabemos, há níveis do consumo de drogas, sendo que o indivíduo pode ter um consumo moderado, de abuso ou compulsivo (que pode se tornar uma dependência). Segundo publicado noeditorial do NYT, o Tabaco é a droga com maior índice de dependência, com 32% dos casos, seguidos de Heroína 23%, Cocaína 16%, Álcool 15%, Ansiolíticos 9% e Maconha 9%. Sabemos também que essas pessoas do grupo de risco, podem ter sérios problemas com certas drogas, contudo elas são a exceção, pois a substância em si não é o problema, mas quem a consome, quanto e qual a relação que esse indivíduo tem com a substância.
Ótimo!, então chegamos a um consenso. As pessoas não usam drogas e saem matando, estuprando e todas as violências possíveis, como se tivessem se transformado no “Huck!”. A maconha, por exemplo, é uma droga sedativa, diferente da cocaína que é estimulante (café é estimulante).
O CFM aprovou que médicos prescrevessem o tal CBD, que é um composto da planta Cannabis Sativa. Esse CBD nada mais é que um extrato in natura retirado da planta, ou seja, é maconha líquida, e segundo os pesquisadores sempre contém traços de THC, pode zerar convulsões de criança com epilepsia, entre outras graves enfermidades. O senhor THC, que foi sempre o vilão e agora ficou isolado, segundo alguns especialistas faz com que as pessoas fiquem violentas. Todavia, pesquisas e prática da vida mostraram que o vilão do THC ajuda pessoas com outras enfermidades graves.
Diante disso, é que se instala no Brasil a charada do ano, que coloca em xeque a política de repressão esquizofrênica das drogas. Se o senhor THC faz todo esse mal que dizem que ele faz, se ele é o próprio anticristo na terra, quase se personificando em um “Ser” que mata, como explicar que o Estado Brasileiro, através do Poder Judiciário, permitiu que uma cidadã mineira pudesse se tratar com uma droga (SATIVEX) que contém de forma concentrada 45% de THC ?! (as plantas contém de 2% a 5%, sendo que o haxixe que é uma pasta quase sólida extraída da resina pode apresentar até 30%). Com o raciocínio de que o THC é próprio sujeito da capa preta com a foice, essa cidadã seria a próxima “serial killer”.
Como o Estado autoriza que um indivíduo possa se tratar com uma droga com altas quantidades de THC, se isso faz mal, e o mesmo Estado, prenda pessoas que utilizam a tal planta que com contém o tal THC?! Resolva esse enigma.
¹Inspetor de Polícia, pós-graduado em Segurança Pública e Cidadania pela UFRGS. Trabalha no Departamento Estadual de Investigações do Narcotráfico-DENARC, da Polícia Civil do Rio Grande do Sul. Conselheiro Estadual de Políticas sobre Drogas do RS. Membro e Porta-Voz do movimento Law Enforcement Against Prohibition (Leap- Brasil).
Foto de Capa: Renato Cinco - MM RJ 2014

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