SARAMAGO: 'TER OLHOS QUANDO OUTROS OS PERDERAM' - O ROMPIMENTO DO GENIAL PORTUGUÊS COM O MODELO REPRESSOR DA CUBA CASTRISTA
Wilman Villar, dissidente que morreu depois de greve de fome. |
O
prisioneiro cubano Wilman Villar, de 31 anos, morreu no dia
19 em Santiago de Cuba, vítima de pneumonia e infecção generalizada
em consequência de uma greve de fome que mantinha há 50 dias para
protestar contra a pena de quatro anos de prisão a que tinha
sido condenado por "desacato e atentado à autoridade".
Militante do movimento União Patriótica de Cuba, Villar foi preso no dia 14 de novembro do ano passado. E o
governo de Cuba sequer reconheceu o prisioneiro como dissidente
político, alegando que Villar seria um "preso comum", cujo motivo da
prisão tinha sido agressão à mulher e resistência às autoridades. Já a
Anistia Internacional informou que se tratava de um preso de
consciência, detido quando participava de uma manifestação em apoio às
Damas de Branco (mulheres de presos políticos). Em 2010, o regime
cubano também alegara que outro preso político, Orlando Zapata, era um
mero delinquente. Zapata também morreu depois de uma greve de fome.
É
lamentável o silêncio e a conivência de uma certa esquerda com a
violação de direitos humanos em Cuba. É uma espécie de fetichismo que,
em nome da "luta anti-imperialista", justifica não apenas a ditadura
castrista como também regimes genocidas como os de Gaddafi e Assad. Tal
postura deixa a direita com o monopólio da crítica aos
regimes stalinistas ou meramente nacionalistas. Essa esquerda ortodoxa é
incapaz de se dissociar do bolchevismo e menos ainda de aceitar a
crítica à ditadura de partido único feita por Rosa Luxemburgo, Victor
Serge, George Orwell, Cornelius Castoriadis e Claude Lefort, entre
outros.
Em abril de 2003, quando o escritor português José Saramago rompeu com Cuba, escrevi o seguinte na revista ISTOÉ:
"O livro Ensaio sobre a cegueira,
do escritor português José Saramago, Prêmio Nobel de Literatura de
1998, tem uma epígrafe que diz: “Se podes olhar, vê. Se podes ver,
repara.” Em determinado ponto do romance, Saramago fala da
“responsabilidade de ter olhos quando os outros os perderam”. Comunista
de carteirinha e de velha cepa – ele aderiu ao Partido Comunista
Português antes de se tornar escritor, em 1947 –, Saramago sempre
defendeu o regime de Cuba e seu comandante-em-chefe, Fidel Castro, de
quem era amigo.
Na
segunda-feira 14, o escritor finalmente abriu os olhos para uma
realidade que ele sempre preferiu enxergar sob lentes opacas: num
pequeno artigo para o jornal espanhol El Pais, Saramago desanca o
regime castrista pela condenação de 75 dissidentes, muitos a penas de
20 a 25 anos de prisão, e pelo julgamento e fuzilamento sumários de
três cubanos que tentaram sequestrar uma balsa para fugir para Miami.
“De agora em diante, Cuba seguirá seu caminho e eu ficarei. Dissentir é
um direito que se encontra inscrito com tinta invisível em todas as
declarações de direitos humanos passadas, presentes e futuras.
Dissentir é um ato irrenunciável de consciência. Pode ser que a
dissidência conduza à traição, mas isso sempre tem que ser demonstrado
com provas irrefutáveis”, escreve o português. “Não creio que se haja
atuado sem deixar lugar a dúvidas no julgamento recente em que foram
condenados a penas desproporcionadas os dissidentes cubanos. (...)
Agora, chegam os fuzilamentos. Sequestrar um barco ou avião é um crime
severamente punível em qualquer país do mundo, mas não se condena à
morte os sequestradores, sobretudo tendo em conta que não houve
vítimas. Cuba não ganhou nenhuma batalha heróica fuzilando esses três
homens, mas perdeu minha confiança, arrasou minhas esperanças e
frustrou minhas ilusões. Até aqui cheguei”, lamentou o escritor.
Nota do militanciaviva
O
SAGRADO DIREITO AO CONTRADITÓRIO, É UMA EXPRESSÃO UNIVERSAL E
DIALÉTICA QUE O VERDADEIRO SOCIALISTA PROFESSA E DEFENDE COM
RESPONSABILIDADE HISTÓRICA, E COM CORAGEM, SEM TITUBEAR.
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