A ciclista e o motoboy
Somos seletivos no nosso sofrimento e mais dispostos a prantear o infortúnio de quem nos pareça igual.
Um ciclista atropelado na avenida Paulista nos enche de comiseração enquanto a morte de um jovem mensageiro, em sua motocicleta comprada a prestação, mal nos chama a atenção.
Um ciclista atropelado na avenida Paulista nos enche de comiseração enquanto a morte de um jovem mensageiro, em sua motocicleta comprada a prestação, mal nos chama a atenção.
Dois casos acontecidos quase que
simultaneamente nas ruas de São Paulo deixaram há poucos dias essa
impressão. Um, a morte de uma jovem que rumava ao trabalho pela a
avenida paulista em sua bicicleta. O outro, o acidente fatal de um rapaz
sobre sua moto numa avenida menos conhecida da cidade chamada Cupecê.
O perecimento da moça foi noticiado nos
telejornais do dia com referências carinhosas ao nome que a vítima teve
em vida, Jú. No local em que se acidentou, uma multidão aglomerou-se sob
chuva intensa para homenageá-la com uma simbólica bicicleta branca.
A morte do outro jovem não mereceu menção,
exceto pela referência indireta do repórter que fazia sobrevoo de
helicóptero naquela tarde para informar a situação do trânsito. No mesmo
dia foram outros dois casos como o dele, em diferentes pontos da
cidade. No mês, dizem as estatísticas, quase 70.
Não houve culpados em nenhuma das
situações. Apenas a rotina da cidade que, nos interstícios do anonimato,
engendra todos os dias fatalidades. Há sim causas responsáveis, que
para a ciclista foi uma cidade cedida aos automóveis e para o
motociclista o subemprego a que se condenam garotos sem escolas e
paternidades precoces.
*Brasilquevai
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