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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

domingo, março 18, 2012

Como deixar de ser um estado teocrático?

Apesar de teoricamente vivermos em um estado laico, na prática o estado não é tão laico assim.
Desde o descobrimento em 1500 até os dias de hoje, boa parte de nossos legisladores tentaram e tentam fazer uma nação cada vez mais livre e soberana, mas a forma como a nação foi formada e também a colonização, tornam esta tarefa realmente complicada.
O Brasil descoberto e colonizado pela coroa portuguesa quase sempre copiou leis e regras de outras nações, como da própria coroa portuguesa, dos cânones de Roma, das leis e sistemas ingleses, franceses e americanos.
A coisa era e é tão levada nas coxas que até a proclamação da república em 1889 não existia uma legislação brasileira que regulasse o casamento, este era regulamentado pelo de direito canônico da igreja de Roma.
“Cân. 1055 – § 1. O pacto matrimonial, pelo qual o homem e a mulher constituem entre si o consórcio de toda a vida, por sua índole natural ordenado ao bem dos cônjuges e a geração e educação da prole, entre batizados foi por Cristo Senhor elevado à dignidade de sacramento.”
(se o casal não fosse batizado na igreja, não era considerado um casal. É mole?)
Desde 1889 até a constituição de 1988 só eram legalmente reconhecidas as uniões oriundas do casamento. Qualquer outro tipo de união não tinha nenhum efeito legal e muitas mães viúvas ou abandonadas sofreram duras penas por este lapso da legislação.
Com a constituição de 1988 ficou estabelecido que:
Art. 1º É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família.
Depois, somente em 2011, o Supremo Tribunal Federal decidiu sobre o caso de uniões civis entre pessoas do mesmo sexo. Apesar da decisão, em partes, ser contraditória com a constituição, ficou definido que: Os direitos civis de casais do mesmo sexo não podem ser negados.
Neste caso um grande avanço, mas ainda há muito que fazer.
O aborto, por exemplo, não foi regulamentado ainda devido a pressões de religiosos sobre o tema. Uma miríade de discussões inúteis sobre o que pode ser considerado vida, já causou quantas mortes de mães que optaram por abortar e, sem amparo ou técnicas regulamentadas, perderam suas vidas no procedimento.
Eu aqui, Polaco, Doido e Ateu “por casualidad” também sou contra o aborto, mas não é um caso de ser contra ou a favor, é um caso de saúde pública! Que incoerência é essa? A lei protege fetos e condena as mães ao sofrimento e muitas vezes a morte?
E a prioridade que certos legislativos e judiciários dão as religiões católicas e neo-pentecostais?
Estamos em 2012 e o presidente da ALEP, Valdir Rossoni, ainda inicia as sessões da assembléia com a frase:
“Sob a proteção de deus… “
Sob a proteção de deus! Colé? E os ateus, hinduístas, budistas que não acreditam em um deus, não fazem parte do estado?
Meu amigo Cequinel do blog O Ornitorrinco, entrou com um requerimento para a retirada do crucifixo e pelo fim da leitura de versículo da bíblia no início das sessões da câmara municipal de Antonina.
O pedido foi analisado nas coxas e sumariamente negado. Agora, o Cequinel que apenas exerceu seu direito de cidadão, é diariamente vítima de impropérios caluniosos conta a sua pessoa numa rádio de propriedade da igreja católica!
E a constituição federal como fica nessa?
Artigo 5:
(…)
IV – É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
V – É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou imagem;
VI – É inviolável a liberdade de consciência e de crença (…)
O Cequinel não tem a quem recorrer e as religiões ganharam mais uma!
Apesar da população brasileira ser majoritariamente católica, existem uma infinidade de outras religiões que compõe todo esse sincretismo religioso do país. É garantido a todos os brasileiros a liberdade de crença (ou a falta dela), porém, não existe nenhuma lei ou artigo na constituição que corrobore a idéia de um estado realmente laico.
Ainda hoje, todas as associações religiosas no Brasil são livres de impostos (renda, IPTU, ISS etc.)  muitas delas ainda recebem subsídios financeiros para suas instituições de ensino e/ou assistência social. O ensino religioso faz parte do currículo de muitas escolas públicas e privilegia as religiões cristãs, principalmente católica e neo-pentecostal, em detrimento de todas as outras. Existe uma discriminação muito forte contra todos os “não crentes”.
Existem também fortes pressões das religiões em todos os legislativos do país e estas pressões dificultam muito a promulgação leis sobre pesquisas científicas, direitos aos homossexuais e tantas outras.
O estado brasileiro ainda tem muitos tratados com o vaticano (a igreja católica), coisas como o laudênio, um resquício medieval sobre a venda de imóveis sujeitos a esse laudênio, onde o estado paga de 2,5% a 5,5% do valor da transação para o vaticano. Muitos terrenos em áreas centrais das cidades mais antigas estão sujeitos a esse imposto ainda hoje.
Em contra partida, as igrejas evangélicas beneficiam-se de outros privilégios, como a facilitação para concessões de emissoras de rádio e TV.
Durante a preparação da visita do papa Bento XVI, em maio de 2007, o Vaticano pressionou o governo brasileiro a assinar um pacto para consolidar os privilégios da Igreja Católica, assim como para estabelecer outros, como o livre acesso às terras indígenas, para ação religiosa. Naquela ocasião, denúncias de entidades laicas e matérias na imprensa, de que um acordo secreto estava sendo elaborado, frustraram a iniciativa, que, aliás, recebeu a rejeição do Presidente da República Lula, que afirmou ser “o Brasil um Estado laico”. No entanto, os entendimentos continuaram, secretamente, e culminaram na assinatura da Concordata, em Roma, em novembro de 2008. O texto encontra-se no Congresso Nacional para ser homologado ou rejeitado. [para saber mais sobre essa Concondata Brasil-Vaticano, clique aqui] (http://www.nepp-dh.ufrj.br/ole/posicionamentos2.html)
Pois é, ao fim e ao cabo, chega-se a conclusão de que o Brasil não é, de maneira nenhuma, um estado verdadeira laico. Estamos nós brasileiros, sujeitos aos caprichos de líderes religiosos e de crenças e crentes muito dispostos a transformar esta nação num estado cada vez mais poli-teocrático (católico pentecostal). Claro que avançamos muito, mas ainda há muito que fazer.
Eu aqui, polaco doido e ateu, “por casualidad,” inevitavelmente tenho que concordar com a citação atribuída a Jesus Cristo:
“A César o que é de César, a Deus o que é de Deus”.
Não dá para usufruir de plenas liberdades individuais em um estado teocrático, para tanto, é imprescindível separar o que é de incumbência do “estado” das incumbências das “religiões,” qualquer religião!
Pensa nisso, mas não durante a missa ou o culto, seu padre ou pastor, se descobrir pode te excomungar!
*comtextolivre

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