Mino: TV Cultura não
é pública. É tucana !
O
Conversa Afiada reproduz texto de Mino Carta, publicado na
Carta Capital:
Mino Carta
Uma tevê pública é uma tevê
pública, é uma tevê pública e é uma tevê pública, diria a senhora Stein.
Pública. Um bem de todos, sustentado pelo dinheiro dos contribuintes.
Uma instituição permanente, acima das contingências políticas, dos
interesses de grupos, facções, partidos. A Cultura de São Paulo já
cumpriu honrosamente a tarefa. Nas atuais mãos tucanas descumpre-a com
rara desfaçatez.
A perfeita afinação entre a
mídia nativa e o tucanato está à vista, escancarada, a ponto de sugerir
uma conexão ideológica entre nossos peculiares social-democratas e os
barões midiáticos e seus sabujos. A sugestão justifica-se, mas, a seu
modo, é generosa demais. Indicaria a existência de ideias e ideais
curtidos em uníssono, ao sabor de escolhas de vida orientadas no sentido
do bem-comum. De fato, estamos é assistindo ao natural conluio entre
herdeiros da casa-grande. -Nada de muito elaborado, entenda-se. Trata-se
apenas de agir com a soberana prepotência do dono da terra e da
senzala.
E no domingo 11 sou informado a
respeito do nascimento de uma TV Folha. Triunfa nas páginas 2 e 3 da
Folha de S.Paulo a certidão do evento, a prometer uma nova opção para as
noites de domingo na tevê, com a jactanciosa certeza de que no momento
não há opções. E qual seria o canal do novo programa? Ora, ora, o da
Cultura. Ocorre que a tevê pública paulista acaba de oferecer espaço não
somente à Folha, mas também a Estadão, Valor e Veja. Por enquanto, que
eu saiba, só o jornal da família Frias aproveitou a oportunidade, com
pífios resultados, aliás, em termos de audiência na noite de estreia.
Até o mundo mineral está em
condições de perceber o alcance da jogada. Trata-se de agradar aos mais
conspícuos barões da mídia, lance valioso às vésperas das eleições
municipais no estado e no País. E com senhorial arrogância, decide-se
enterrar de vez o sentido da missão de uma tevê pública. Tucanagens
similares já foram cometidas em diversas oportunidades nos últimos anos,
uma delas em 2010, o ano eleitoral que viu José Serra candidato à
Presidência da República. Ainda governador, antes da
desincompatibilização, Serra fechou ricos contratos de assinatura dos
jornalões destinados a iluminar o professorado paulista.
Do volumoso pacote não constava
obviamente CartaCapital, assim como somos excluídos do recente convite
da Cultura. O que nos honra sobremaneira. Diga-se que, caso convidados
(permito-me a hipótese absurda), recusaríamos para não participar de uma
ação antidemocrática ao comprometer o perfil de uma tevê pública,
amparada na indispensável contribuição de todos os cidadãos,
independentemente dos seus credos políticos ou da ausência deles.
Volta e meia, CartaCapital é
apontada como revista chapa-branca, simplesmente porque apoiou a
candidatura de Lula e Dilma Rousseff à Presidência da República. Em
democracias bem melhor definidas do que a nossa, este de apoiar
candidatos é direito da mídia e valioso serviço para o público. Aqui,
engole-se, sem o mais pálido arrepio de indignação, a hipocrisia de quem
se pretende isento enquanto exprime as vontades da casa-grande. Há quem
se abale até a contar os anúncios governistas nas páginas de
CartaCapital, e esqueça de computar aqueles saídos nas demais
publicações, para provar que estamos aos préstimos do poder petista.
Fomos boicotados durante os
dois mandatos de Fernando Henrique e nem sempre contamos com o trato
isonômico dos adversários que tomaram seu lugar. Fizemos honestas e
nítidas escolhas na hora eleitoral e nem por isso arrefecemos no alerta
perene do espírito crítico. Vimos em Lula o primeiro presidente
pós-ditadura empenhado no combate ao desequilíbrio social, embora
opinássemos que ficou amiúde aquém das chances à sua disposição. E fomos
críticos em inúmeras situações.
Exemplos: juros altos,
transgênicos, excesso de poder de Palocci e Zé Dirceu, Caso Battisti,
dúbio comportamento diante de prepotências fardadas. E nem se fale do
comportamento do executivo diante da Operação Satiagraha. Etc. etc.
Quanto ao Partido dos Trabalhadores, jamais fugimos da constatação de
que no poder portou-se como os demais.
Hoje confiamos em Dilma
Rousseff, de quem prevemos um desempenho digno e eficaz. O risco que ela
corre, volto a repetir na esteira de agudas observações de Marcos
Coimbra, está no fruto herdado de uma decisão apressada e populista, a
da Copa de 2014. Se o Brasil não se mostrar preparado para a empreitada,
Dilma sofrerá as consequências do descrédito global.
No mais, desta vez dirijo minha pergunta aos leitores em lugar dos meus botões: qual é a mídia chapa-branca?
*PHA
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