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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

segunda-feira, março 05, 2012

A visão geo-estratégica de Bo

Obama e o conselheiro estratégico
Obama, o simpático Obama. Quantas esperanças da altura da sua eleição, alguém se lembra?
Pois.

Cá está o simpático Obama, na véspera das novas eleições presidenciais: uma longa entrevista, a mais comprida após a eclosão da crise com o Irão. Porque Obama, tal como o cão dele, o português Bo (ou será "Boh?"), não esquece do Islão. Nunca.

Quando Barack Obama falou na Universidade do Cairo pronunciou a histórica frase: O Islão é uma parte da América. O que é verdade, tal como a lebre faz parte da caça.
Hoje, após as derrotas do Iraque e do Afeganistão, a intervenção da Nato na Líbia, a guerra civil que irrompeu na Síria, as decepções da Primavera Árabe, a iminência dum ataque contra o Irão, Obama reafirma: o Islão faz parte da América. E também de israel. Reafirma isso poucos dias antes de encontrar o AIPAC, a mais importante lobby judia dos Estados Unidos e da reunião com o primeiro-ministro israelita Benjamin Netanyahu.

A entrevista, recolhida pelo jornalista Jeff Goldberg nas páginas da revista Atlantic, é explicita: a aliança entre Washington e Tel-Avive não pode ser posta em causa, os objectivos são comuns.

O facto é que fizemos um óptimo trabalho com israel nos últimos três anos, eu acho que o primeiro-ministro [Benjamin Netanyahu, ndt] e o ministro da Defesa [Ehud Barak, ndt] reconhecem que nunca tivemos uma cooperação. militar e de intelligence tão próxima como a actual.
Quando olharmos para o que eu fiz no âmbito da segurança de israel, os exercícios os treinos conjuntos que vai além de qualquer coisa que já fizemos no passado, o apoio financeiro e operacional no Programa Iron Dome [o sistema famoso anti-míssil israelita, ndt], que garante que as famílias israelitas sejam menos vulneráveis ​​aos ataques dos foguetes, o facto de que temos assegurado a superioridade militar de israel, a luta em favor da legitimação de israel, tanto no Conselho dos Direitos Humanos quanto na Assembleia Geral da ONU, no caso do relatório Goldstone [o relatório da ONU que condena duramente as violações israelitas durante o ataque contra a Faixa de Gaza na Operação Chumbo Fundido, em Dezembro de 2008], bem como após o incidente [freedom] flotilha, a verdade é que a relação com israel tem funcionado muito bem.
Olé.
Assegurar uma desproporcionada superioridade militar de israel na região, encobrir os crimes israelitas da Operação Chumbo Fundido, lutar contra o reconhecimento da Palestina na Assembleia das Nações Unidas, ajudar no boicote ao fornecimento de géneros de primeira necessidade para a Faixa de Gaza: tudo isso, que uma pessoa normal tenderia a esconder com uma certa vergonha, no caso do simpático Obama são "pontos fortes" da colaboração com israel.

A reivindicação dessa relação especial é explicitamente ligada pelo Presidente à dura controvérsia que os candidatos republicano, seus adversários nas eleições presidenciais de Novembro, têm levantado sobre a questão do Irão, acusando Obama de não ser suficientemente pró-Israel.
Neste ponto, Obama é muito claro, tão claro ao ponto de reconhecer a enorme influência da lobby israelita na campanha presidencial dos EUA:
Não existem razões válidas para duvidar de mim sobre este ponto [isso é, a segurança de israel] . Em parte, a questão tem a ver com o facto de que no nosso País e nos nossos media, o assunto se tornar inteiramente político. Acho que isso não é um segredo. Se existir um grupo político que quer criar tensão não entre os EUA e israel, mas entre Barack Obama e os votos dos judeus americanos, que historicamente sempre foram muito influentes na candidatura dele, então torna-se útil tentar criar dúvidas e levantar questões.
É, portanto, neste contexto eleitoral que devemos colocar a posição da administração Obama sobre o Irão, directamente influenciada pela necessidade de interceptar o total apoio da lobby judia que apoia Israel e exerce pressão directa sobre a política externa de Washington, e não apenas acerca das questões do Médio Oriente.

O presidente dos EUA reitera a própria determinação no uso da força militar como uma das quatro opções que compõem a estratégia norte-americana, juntamente com a política, económica e diplomática. As razões são bem conhecidas: o risco duma proliferação nuclear na região (as 2-300 ogivas nucleares de israel não contam, aliás, são ogivas bem democráticas), o perigo de que não bem identificados "terroristas" possam fazer uso de armas nucleares (lembramos que até hoje o único a utilizar tais armas contra civis foi o exército dos Estados Unidos), a postura do Irão contra a existência de Estado de israel.

A questão iraniana, afirma o simpático Obama, não diz respeito apenas a segurança do Estado judeu, mas também aos interesses estratégicos dos Estados Unidos:
Portanto, quando digo que nenhuma opção está excluída, quero dizer apenas que vamos continuar a exercer uma pressão até quando o Irão adoptar uma linha diferente.
E quando o repórter pergunta a opinião do presidente acerca da possibilidade de israel atacar o Irão? O sentido da resposta nem é demasiado disfarçado:
Acho que, instintivamente, nos Estados Unidos simpatizemos para israel.
Portanto, não surpreende a conexão que Obama estabelece entre a crise do regime de Assad na Síria e a necessidade de mudar o curso político do Irão: a queda do regime de Assad é crucial, pois seria uma "grande perda para o Irão".

Bastante claro, não é?


Ipse dixit.
*InformaçãoIncorreta

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