Acertos EUA-Israel impedem qualquer avanço...
do redecastorphoto
…nas conversações nucleares com o Irã
Gareth Porter, Asia Times Online
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
Gareth Porter é historiador, analista político e jornalista investigativo sobre a política externa e militar americana.
WASHINGTON
– O governo Barack Obama encampou a exigência, nas conversações
nucleares com o Irã que começam sábado em Istambul, de que a usina
Fordow de enriquecimento de urânio seja fechada e eventualmente
desmontada; essa exigência é parte de uma negociação paralela entre EUA e
Israel e é meio caminho andado para levar ao fracasso qualquer
conversação com o Irã.
Ainda não se sabe,
contudo, se o governo Obama introduzirá essa exigência seja qual for a
posição inicial do Irã, ou se a exigência será “guardada” para ser
apresentada adiante, nas conversações. Supõe-se que Washington tenha
interesse em obter, no mínimo, algum acordo que mantenha as conversações
abertas e em andamento durante a campanha eleitoral e, se possível,
depois dela.
O governo do primeiro-ministro
Benjamin Netanyahu, por sua vez, anda extremamente ansioso quanto à
possibilidade de algum acordo que admita a continuação do programa
iraniano de enriquecimento de urânio. Os israelenses contam, portanto,
com a “pílula de veneno”: a exigência de que Fordow seja fechada e
desmontada, que tem potencial para interromper qualquer conversação com o
Irã.
Em entrevista à agência Inter Press Service
(IPS), Reza Marashi, que trabalhou no setor do Departamento de Estado
para Assuntos Iranianos entre 2006 e 2010, disse que “Se a exigência de
que os iranianos fechem Fordow for apresentada como inegociável, o mais
provável é que fracasse qualquer conversação com o Irã”.
O
Irã já disse que não aceita essa exigência. Em resposta à exigência já
noticiada de que suspenda o enriquecimento de urânio a 20% e feche a
usina Fordow, Fereydoun Abbasi-Davani, presidente da Organização
Iraniana de Energia Atômica [orig. Iran’s Atomic Energy Organization]
disse: “Os iranianos não vemos qualquer justificativa para essa
exigência do Grupo P5+1”. P5+1, conhecido também como os “Irã-6”, é o
grupo em que se reúnem os cinco membros permanentes do Conselho de
Segurança da ONU – EUA, Grã-Bretanha, França, Rússia e China, mais a Alemanha – que está envolvido nas negociações sobre o programa nuclear iraniano.
Ahmadinejad na Usina de Fordow
Pelo
que já se pode ver, o governo Obama fez o que Israel exigiu e incluiu o
fechamento da usina Fordow na lista de exigências do grupo
EUA-europeus, em troca de Israel aceitar que, no primeiro estágio das
conversações, só se discuta a questão do enriquecimento do urânio
iraniano até 20%.
Há crença generalizada de que é
possível que os iranianos aceitem pôr fim ao enriquecimento de urânio
até 20% e entreguem seus estoques de urânio enriquecido, que seriam
trocados por bastonetes de combustível nuclear fabricados em outros
países, mantendo em funcionamento, assim, o Reator de Pesquisas de
Teerã. Isso, se houver alguma troca, e se os iranianos entenderem que
obterão algum benefício significativo em troca do que venham a conceder.
Dia
4/4/2012, o ministro da Defesa de Israel Ehud Barak revelou que
mantivera conversações com autoridades dos EUA e de países europeus no
final de março, nas quais trabalhara para convencer todos a aceitar as
exigências israelenses, de que Fordow seja fechada; de que todos os
processos de enriquecimento de urânio a 20% sejam cancelados; e que todo
o enriquecimento de urânio, mesmo abaixo de 20%, seja deslocado para
outros países.
Barak não disse a que resultados levaram esses seus contatos, mas três dias depois o New York Times noticiou
que funcionários dos EUA e de países europeus exigiriam, nas
negociações com o Irã, “o imediato fechamento e desmonte definitivo” da
usina Fordow como “urgente prioridade”, além da transferência para fora
do Irã do estoque de urânio enriquecido a 20% que há no país. [1]
A
agência Reuters noticiou, dia 8/4, que “altos funcionários dos EUA”
disseram que a suspensão do enriquecimento de urânio a 20% e o
fechamento da usina Fordow são “prioridades de curto prazo” para os EUA e
aliados. [2]
A Reuters também noticiou,
no mesmo dia, que Israel concordara, em março, com uma “abordagem por
etapas” nas conversações nucleares; e que, na primeira etapa, as
conversações seriam focadas só no fim do enriquecimento do urânio a 20%.
Localização das plantas de enriquecimento de urânio do Irã
(Clique na imagem para visualizar melhor)
Nem
Israel nem os estados ocidentais disseram qualquer coisa, até agora,
sobre a transferência para fora do Irã, do urânio iraniano enriquecido, o
que sugere que a questão ainda não esteja acertada entre eles.
Os
encontros de alto nível e a conexão evidente entre as posições que EUA,
europeus e israelenses vazaram simultaneamente para a imprensa não
deixam qualquer dúvida sobre o fato de que, sim, já há uma posição
conjunta; e que os EUA levarão a posição de Israel às conversações com o
Irã.
Respondendo à agência IPS, Erin Pelton,
secretária-assistente de imprensa do Conselho de Segurança Nacional dos
EUA, disse que não tinha qualquer informação sobre acertos explícitos
entre EUA e Israel sobre a posição dos EUA nas conversações nucleares. E
explicou: “Houve consultas entre EUA e Israel sobre a política para o
Irã. Não é preciso que haja qualquer tipo de acordo explícito”.
Israel
continua a usar, para pressionar as políticas de EUA e europeus, a
ameaça sempre repetida de atacar o Irã. Um dia antes de Barak falar
sobre suas conversas com funcionários norte-americanos e europeus sobre a
estratégia da negociação com o Irã, o jornal Jerusalem Post noticiou que “altos funcionários da Defesa” disseram que o possível ataque ao Irã “pode ser adiado até 2013”, porque o “establishment da Defesa” esperará o resultado das conversações nucleares. [3]
Já
há muito tempo Barak fala da capacidade que o Irã tem para transferir
suas centrífugas para Fordow – construída num túnel de grande
profundidade na encosta de uma montanha, o que neutralizaria a
capacidade de destruição dos aviões israelenses. Esse, aliás, é o único
argumento que Israel tem repetido nos últimos meses, como única
justificativa para a ameaça de ataque militar contra o Irã.
Em postado no blog The National Interest,
Paul Pillar, ex-agente de inteligência e especialista em Oriente
Próximo e Sul da Ásia, escreveu que “a mensagem ocidental a Teerã”
parece ser que “nós [o “ocidente”, quer dizer, EUA e Israel] podemos até
aceitar que o Irã mantenha algum tipo de programa nuclear, mas só no
caso de o programa ser instalado em local acessível a bombas, para o
caso de EUA ou Israel, a qualquer momento, decidirem bombardear tudo”. [4]
Greg Thielmann, alto membro da Associação para o Controle de Armas [orig. Arms Control Association],
disse em entrevista a IPS: “Alguns americanos acreditam que é
importante manter sob ameaça todas as instalações nucleares do Irã, para
o caso de Teerã decidir construir armas atômicas”.
Mas
para Thielmann, ex-diretor do setor de Assuntos Militares, Estratégicos
e de Proliferação do Gabinete de Inteligência e Pesquisa do
Departamento de Estado dos EUA, disse também que o fechamento e desmonte
das instalações de Fordow “interessa mais aos israelenses que aos EUA”.
Reza
Marashi, ex-especialista em Irã do Departamento de Estado, atualmente
diretor de pesquisas do Conselho Nacional Irã-EUA, disse que
funcionários dos EUA têm algumas preocupações com Fordow, mas foram os
israelenses que converteram em questão central a evidência de que Israel
não tem capacidade para destruir Fordow”.
Thielmann
disse que espera que o governo Obama esteja “fazendo isso para acalmar
os israelenses; e que não insistirá nessa exigência, depois de os
iranianos a terem rejeitado”.
Embora a exigência
de fechar e destruir Fordow pareça ser resposta dos EUA para acalmar
Israel, mesmo assim faz pleno sentido no conjunto de esforços do governo
Obama para intimidar o Irã, fazendo crer que só restaria uma “janela”
de tempo aos iranianos, para encontrar solução diplomática. O governo
Obama deixou bem claro, nas últimas semanas, que Israel atacaria as
instalações nucleares iranianas, caso não haja qualquer avanço na
direção de um acordo que assegure que o Irã não terá armas atômicas.
Esse
tom de ameaças sempre repetidas corresponde ao que dizem os
‘linha-dura’ desde o início do governo Obama. Dennis Ross,
ex-conselheiro de Obama, que se acredita que ainda tenha acesso pessoal
direto ao presidente, foi citado no New York Times dia 29/3. Ross
disse que “para que a diplomacia funcione, é preciso haver alguma
capacidade de coação. Se os iranianos pensarem que estejamos blefando,
nada conseguiremos deles”. [5]
Em artigo recente publicado em Times of Israel,
Ross deixou claro que o que chama de “diplomacia coercitiva” de modo
algum envolveria a promessa de suspender as sanções, porque os EUA
continuam a exigir “mudança de atitude do Irã em relação ao terrorismo,
aos seus vizinhos e aos seus próprios cidadãos”. [6]
Essa
“diplomacia coercitiva”, se esse for, mesmo, o conceito que subjaz à
estratégia de negociação do governo Obama, explicaria o absoluto
silêncio de qualquer vazamento para a imprensa sobre o que os EUA
planejam oferecer aos iranianos, em troca das concessões que exigirão.
Reza Marashi observou que o governo “esconde bem as próprias cartas, bem
fechadas sobre a mesa”, sobre o que será oferecido ao Irã, nas
negociações nucleares.
A ausência de qualquer
incentivo significativo leva Marashi a concluir que o governo Obama está
confiando mais em ameaças do que em incentivos para levar o Irã a
render-se às suas demandas.
O governo Obama
parece estar apostando tudo no único incentivo que está disposto a
oferecer nas conversações: o reconhecimento do direito do Irã a
enriquecer urânio em instalações em solo iraniano (mas EUA e europeus,
certamente, continuarão a impor limites estritos ao número de
centrífugas e ao nível máximo de enriquecimento admitido).
Se
os EUA e Israel esperam que o Irã aceite essas limitações, terão de
considerar a introdução de mudanças significativas nas políticas
norte-americanas para o Irã: fim das sanções e reconhecimento de que o
Irã tem papel político-diplomático plenamente legítimo a desempenhar na
região.
Notas dos tradutores
[1 ] 9/4/2012, New York Times em: “Iran's Nuclear Program (Nuclear Talks, 2012)”
[2] 8/4/2012, Reuters em: “West to target Iran's nuclear fuel work”
[3] 4/4/2012, Jerusalem Post em: “Confrontation with Iran may be delayed to 2013”
[4 12/4/2012, The National Interest – Paul Pilar em: “Self-Fulfilling Prophecy on Iran”
[5] 29/3/2012, New York Times em: “Hard Line on Iran Places White House in a Bind”
[6] 6/4/2012, The Times of Israel em: “What could diplomacy with Iran produce?”
*Gilsonsampaio
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