Páginas

Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

domingo, abril 08, 2012

A Editora Abril nos tribunais

Guilherme Scalzilli, via Observatório da Imprensa

O jornalista Luis Nassif está mobilizando a blogosfera com seu dossiê Veja, série de artigos que denunciam o antijornalismo praticado pela revista nos últimos anos. Envolve interesses corporativos, destruição de reputações, tráfico de influência. Desmascara a diretoria editorial da revista e, principalmente, Reinaldo Azevedo e Diogo Mainardi. Trata-se de estudo avassalador, embora não surpreendente, que precisa ser lido e divulgado.

O material já causou estragos. A Veja esboça uma ligeira mudança de tom nas suas edições semanais e há suspeitas de que ela tem obstruído as ferramentas de busca eletrônica aos conteúdos de matérias e postagens antigas – especialmente as que corroborariam as denúncias. A revista processa Nassif e, aparentemente, utiliza funcionários anônimos (além dos supracitados) para espalhar ataques pessoais a ele.

É compreensível que Nassif tente evitar conotações político-partidárias em sua empreitada. Seria (e continua sendo) cômodo para a revista refugiar-se numa batalha moral contra o “lulo-petismo”. Quando se trata de ética jornalística, entretanto, não cabem desculpas ideológicas.

E o respaldo da imprensa?
Mas o público sabe que esse comportamento da Veja também possui um viés eleitoral. Ela é acusada de defender interesses que se beneficiam do poder conferido pelas urnas a eles próprios ou a terceiros. Se alguém escancara essa contaminação, direta ou indiretamente, mexe nas suas motivações. Por isso, é importante não esquecer que o gesto de Nassif insere-se num contexto político, pois assim será tratado pelos detratores.

Os grandes veículos, assim como a Associação Brasileira de Imprensa, fingem que a querela não existe. Não querem se expor a exumações semelhantes, principalmente depois que a Folha de S.Paulo foi envolvida num dos episódios denunciados. Os comentaristas abordam a questão com cuidado, sabedores do poder destrutivo de Veja.

Esse comportamento revela muito sobre a categoria. A manipulação teria sido aberta, conhecida por todos, durante anos. E a revista só foi confrontada por iniciativa de um indivíduo isolado que, apesar da força de sua biografia e de seus argumentos, não angariou o respaldo de uma imprensa que se diz combativa e independente (ou melhor, que é “combativa” e “independente” quando interessa).

Precedente histórico
Imagina-se que a direção da revista tenha instruído seus advogados a causarem o maior estrago possível, financeiro e pessoal, na vida de Nassif. As despesas são altíssimas, os prazos dilatados, os resultados incertos e as primeiras instâncias, imprevisíveis. A desigualdade de forças resvala na coerção do gigante empresarial que tenta destruir exemplarmente seus desafetos incômodos.

Mesmo assim, parece alvissareira a hipótese do Judiciário ser constrangido a se manifestar. Passou o tempo de tratar falsos depoimentos, incriminações indevidas, denúncias vazias, deturpações e mentiras como simples efeitos colaterais da liberdade de imprensa. A integridade moral dos indivíduos e o interesse coletivo são protegidos por leis que estão acima de couraças retóricas.

A nobre iniciativa de Nassif não envolve apenas os leitores de Veja e talvez nem o público genérico de periódicos. Trata-se de esclarecer o uso antiético e quiçá ilegal da grande imprensa para favorecer determinadas facções corporativas ou políticas. Tamanha abrangência só pode ser respeitada por um poder de envergadura equivalente, conferindo máxima lisura ideológica à decisão.

O desejável sucesso da defesa do jornalista, ainda que custoso e demorado, pode abrir um precedente histórico e contribuir para uma análise profunda sobre o jornalismo nacional.
*Limpinhoecheiroso

Nenhum comentário:

Postar um comentário