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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sexta-feira, abril 20, 2012

Franceses mudam de rumo domingo


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Reprodução
Sondagens não deixam dúvidas, presidente francês, Nicolas Sarkozy, não será reeleito.
Já não há mais supresa – os franceses votarão domingo contra o atual presidente NicolasSarkozy e confirmarão esse voto, no segundo turno, no começo de maio. A diferença mostrada pelas sondagens de opinião pública é muito grande para poder ser suplantada pelos eleitores de Sarkozy.
O baixinho hiperativo não conseguiu ganhar a confiança dos franceses nestes cinco anos, ao contrário, mesmo eleitores de direita dizem não suportar mais seu irriquieto presidente. Embora, na França, os presidentes costumem ser reeleitos, isso não acontecerá com Sarkozy.
O vencedor e próximo presidente francês será o ex-dirigente do Partido Socialista, François Hollande, ex-marido da candidata derrotada faz cinco anos, a também socialista Segolène Royal. Além da diferença de programa político entre Sarkozy e Hollande, existe uma enorme diferença de personalidade – Hollande não é hiperativo e tem tudo de um francês comum, com sorrisos e gestos controlados de um homem normal.
Parece que os francês aspiram justamente isso – um presidente normal, mesmo um tanto devagar, mais próximo do comum dos mortais, pois isso acaba inspirando mais confiança e segurança. Dizem que, depois da revolta estudantil de maio 68, os franceses elegeram Georges Pompidou, por ter cara de senhor bonachão e tranquilo.
Politicamente Hollande não é também nenhum revolucionário; é um socialdemocrata típico, sem grande arrojos, consciente dos limites de um político na cena nacional, sujeito na maioria das vezes às pressões da máquina do capital e das grandes empresas multinacionais, sem se esquecer as limitações impostas pela União Européia atualmente dominada por uma maioria neoliberal.
Quem quer sonhar com um mundo sem as especulações financeiras, sem a força e vantagens dos bancos e sem os jogos nas bolsas de valores, responsáveis pela liquidação econômica da Grécia, Portugal, Irlanda e Espanha, como se uma revolução ainda fosse possível, votará domingo no candidato da esquerda unida, Jean-Luc Mélenchon, cuja plataforma considerada anacrônica, consegue entusiasmar centenas de milhares de pessoas nos comícios e irá garantir 15% dos votos.
É ainda possível se mudar o rumo do mundo ocidental neoliberal, baseado num capitalismo faminto de mais lucros e insensível às multidões de desempregados na Europa ?
Mélenchon, certo ou errado, sonhador, visionário ou irrealista, garante podermos chegar a um mundo mais justo e menos desigual, livre dos tentáculos dos grande conglomerados, onde os operários podem ter salários maiores e sem o endividamento colossal dos países. Quem ainda acredita ser possível se mudar o mundo, num utópico novo formato econômico, votará Mélenchon, mas, no segundo turno, terá de cair na realidade, votar Hollande, aceitar algo menos ambicioso para se evitar a reeleição de Sarkozy.
O presidente francês deixará saudades na imprensa people pelo seu gosto do luxo, por sua vida romanesca, pela incrível capacidade de refazer suas próprias propostas e pela sua megalomania. Ninguém esquecerá o presidente na fossa, abandonado pela esposa Cecília, apaixonada por um publicitário, nem de seu rápido amor e casamento com a cantora Carla.
De suas promessas é melhor esquecer, a França com seus sobressaltos pouco mudou depois de seus cinco anos de presidência, que Sarkozy bem gostaria terem sido de reinado.
Publicado originalmente no site Direto da Redação.
Rui Martins, jornalista, escritor, correspondente em Genebra.
*correiodoBrasil

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