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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

quarta-feira, agosto 14, 2013

convenhamos que não deixa de ser comovente a lealdade da Veja ao PSDB, não?

 

Eduardo Guimarães

Alguns dirão que é jogo de cena, que toda vez que a grande mídia noticia alguma coisa desfavorável ao PSDB é porque, em seguida, virá bomba contra o PT. Essa, porém, seria uma explicação fácil para um grande noticiário que é preciso ter uma dose extra de má vontade para afirmar que tem poupado o tucanato paulista no âmbito do rumoroso “trensalão”.
Vá lá que não estejam existindo aquelas críticas furiosas e profusas que tonitruam sobre as nossas cabeças quando a acusação envolve petistas ou aliados tidos como mais fieis – ou algo próximo disso.
Porém, o que até a Globo vem divulgando sobre os escândalos Siemens-Alstom deixa o PSDB paulista em uma situação em que não há memória de ter sido igual ao menos no século XXI. Só para se ter uma ideia, denúncia do sindicato dos metroviários feita ao Cade na última terça-feira fora conhecida dias antes pelos telejornais.
O SBT, por exemplo, exibiu várias matérias mostrando que o Estado de São Paulo, ainda no governo Mario Covas, gastou R$ 1,7 bilhão com a modernização de 98 trens de metrô e que com um pouco mais seria possível comprar trens novos.
Segundo matéria publicada há vários dias pela tevê do Sílvio Santos, “O custo de reforma dos trens velhos foi de 85,7% do preço de um saído da fábrica e a base de comparação é outro contrato assinado no ano passado, em que um trem novo saiu por R$ 23,6 milhões. Já o reformado de 2009 custou, em média, R$ 17,1 milhões”.
Já a Globo, semana passada, gastou 8 minutos com denúncias menos detalhadas – e, portanto, menos comprometedoras –, mas que permitiram ao telespectador entender que há uma acusação grave contra os governos do Estado de São Paulo sob o comando do PSDB.
E não ficou só nisso. O caso foi parar até no tucanérrimo Jornal da Globo, exibido tarde da noite e, por isso, objeto das maiores, digamos assim, “licenças partidárias” da emissora.
Isso sem falar na Folha de São Paulo, que, como o resto da grande mídia, entrou timidamente no caso mas depois se soltou e já o está cobrindo com certo “gosto”, com manchetes em primeira página como não se via desde o escândalo da compra de votos para a reeleição de FHC, no século passado.
Não se descarta, porém, que, como no passado, tudo isso esteja ocorrendo como um álibi para um ataque muito mais forte ao PT, mas essa tese carece de lógica.
Após colocar os tucanos “no mesmo saco”, não haverá lucro político em mostrar que o PT lhes faz companhia. Até porque, a mídia já carimbou nos petistas tudo o que pôde em termos de corrupção, tanto justa quanto injustamente.
Claro que ficou bem difícil esconder o “trensalão” com a internet fervendo com o assunto, mas a mídia esconder escândalos graves do PSDB não chega a ser novidade. Aliás, ela parece disposta a não tomar mais furos – ou tomar menos – em um caso que só tem feito crescer.
Não se espera que, de uma hora para outra, corporações de mídia que se notabilizaram pelo partidarismo se tornem exemplos de profissionalismo jornalístico, que requer distanciamento ou, se possível, algo que se pareça razoavelmente com isenção. Mas o que parece é que, finalmente, essas corporações começam a entender que há muito menos idiotas por ai do que imaginava.
Excesso de otimismo? Ingenuidade? Talvez não, apesar de parecer. Essas corporações talvez não sejam tão idiotas a ponto de ainda não terem percebido que a continuidade do tratamento do público como débil mental se tornou inviável, sobretudo quando se vai descobrindo que ir à rua não é um jogo que só pode ser jogado por um lado.
Em um momento em que todo mundo começou a se manifestar por um sem-número de causas, ocultar um escândalo da magnitude desse que envolve o PSDB pode gerar resultados imprevisíveis.
Como as vítimas do mau serviço do metrô de São Paulo contam-se aos milhões, proteger quem essas massas vão descobrindo ser responsável por seu sofrimento no transporte público pode atrair ira popular de um tamanho como o que se viu em junho.
Imaginemos dezenas de milhares de pessoas diante de uma Globo dizendo umas verdades daquele tipo que os barões da mídia não podem se dar ao luxo de que sejam conhecidas… O prejuízo – inclusive financeiro – que envolveria uma situação dessas seria incalculável e, talvez, irremediável.
Se as coisas continuarem nesse rumo, portanto, logo, logo só vai restar a Veja bradando no deserto contra um lado só da política enquanto o outro se esbalda em corrupção e ela finge não ver. Eis porque um desembarque midiático em peso do “Tucanic” talvez não envolva esse tentáculo da mídia, que pode se dispor a afundar junto.
Aliás, convenhamos que não deixa de ser comovente a lealdade da Veja ao PSDB, não?
*AmoralNato

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