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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

domingo, outubro 27, 2013

Por que o apoio de atores da Globo às manifestações é visto com desconfiança



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Por que o apoio de atores da Globo às manifestações é visto com desconfiança

Mariana Ximenes

Atores da Globo, uns mais conhecidos que outros, fizeram um vídeo chamado “Grito da Liberdade”. Convocavam para uma manifestação no dia 31 de outubro no Rio de Janeiro. Wagner Moura, Leandra Leal, Marcos Palmeira, Mariana Ximenes, entre outros, falaram, de maneira difusa, da violência policial.

O vídeo foi postado aqui. Está em outros lugares. A reação não tem sido positiva. Por que duvidamos das intenções e do endosso desses artistas?

Primeiro porque existe um certo cheiro de oportunismo. O apoio de uma celebridade pode fazer bem ou mal a uma causa. Se ele, ou ela, é atuante e tem um histórico ligado a determinado assunto, não provoca estranhamento. Quando Mariana Ximenes fala para o pessoal aparecer num protesto porque ele vai ser lúdico (tipo tomar tiro de bala de borracha?) e terá intervenções artísticas, dá uma complicada.

Bono foi convidado a ser um dos rostos da campanha ONE, contra a miséria na África. A adequação era clara. Ele já era uma voz no combate à AIDS. Trouxe doações e ajudou a popularizar o tema. Madonna no Mali virou uma dor de cabeça para ela e para o país.

Globais gravaram, em 2011, um vídeo em protesto à construção da usina de Belo Monte. Virou piada. O que Bruno Mazzeo poderia contribuir ao debate? Depois foram as cinco atrizes da novela das 9 numa foto tétrica contra o voto do ministro Celso de Mello no mensalão. Um clássico.

No “Grito da Liberdade”, há dois nomes que têm alguma atuação na política. Marcos Palmeira, dono de uma fazenda de produtos orgânicos, teria sido sondado pelo PSB para concorrer ao governo no Rio. Wagner Moura militou a favor de Marcelo Freixo e se empenha em passar uma imagem contrária à do policial fascista que interpretou em “Tropa de Elite”.

Eu falei recentemente no humorista inglês Russell Brand. Brand foi receber um prêmio da revista de moda GQ. Subiu ao palco e lembrou que o patrocinador, Hugo Boss, produzia os uniformes dos nazistas. Foi expulso da festa. Tem insistido que haverá uma “revolução”. É bem informado, articulado e tem uma bandeira. Hoje é ouvido, respeitado e seguido.

Ninguém duvida das intenções dos globais. Mas ninguém esquece de onde eles são. Um trecho do “manifesto” diz o seguinte:

“Somos a rede social trazendo a contra-narrativa, já que a mídia comprada pelo poder atua como polícia para esvaziar as ruas e silenciar o clamor popular”.

Mídia comprada pelo poder é o Jornal Nacional?  Wagner Moura vai dizer isso? Camila Pitanga vai parar de dar entrevistas para o “Fantástico”?

Peraí, né? Aí já é querer demais.

Enquanto isso, os manifestantes continuarão confiando mais numa convocação feita por um anônimo no Facebook do que em celebridades que detonam o “sistema” na sexta-feira e, no domingo, estão no Faustão vendendo a nova novela das 7.

Kiko Nogueira No DCM
*comtextolivre

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