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Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.
É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
Fernando Evangelista

sábado, maio 24, 2014

    Empresas de ônibus em SP receberam 22 estádios da Copa em dinheiro público desde 2010




Reprodução
Concessionárias e permissionárias não negociam reajuste superior a 10% com motoristas se prefeitura não aumentar repasses; desde 2010, R$ 22,2 bilhões foram pagos a empresas

23/05/2014
O movimento dos motoristas e cobradores de ônibus de São Paulo, que fechou 16 das 29 garagens do sistema de transporte público à revelia do sindicato dos trabalhadores e causou sérios problemas à mobilidade na cidade na terça e quarta-feiras (20 e 21), aliou-se ao SP Urbanuss, sindicato patronal que representa as empresas de ônibus, para cobrar da prefeitura a solução do impasse em torno do reajuste salarial da categoria: as empresas se recusam a oferecer reajuste acima dos 10% acordados com o sindicato – os trabalhadores pedem 13% – alegando falta de receita, mas podem rever a posição caso a prefeitura aumente os subsídios pagos às permissionárias e concessionárias por viagem realizada; na reunião realizada ontem, na Superintendência Regional do Trabalho de São Paulo, os trabalhadores reforçaram essa demanda.
As empresas, no entanto, receberam R$ 22,2 bilhões da SPTrans, de janeiro de 2010 a março de 2014, de acordo com dados do Portal da Transparência da Secretaria Municipal de Transportes. O valor, que representa os subsídios pagos pelo poder público e o valor da tarifa, que é registrada pela SPTrans e depois devolvida às empresas, é equivalente ao necessário para construir 22 arenas Corinthians, estádio de abertura da Copa, em Itaquera, na zona leste. Além disso, o último acordo pelo aumento dos subsídios mensais ocorreu há menos de um ano, após os protestos de junho de 2013. O aumento dos subsídios de uma média de R$ 230 milhões mensais pagos em 2012 para os cerca de R$ 300 milhões mensais pagos atualmente foi a forma encontrada pela prefeitura para atender à demanda dos movimentos de rua e congelar o preço da passagem em R$ 3.
Fora os valores pagos às empresas diretamente, a SP Urbanuss recebeu, no mesmo período, cerca de R$ 153 milhões da SPTrans em parcelas de R$ 3 milhões ao mês, em média.
Os custos operacionais das empresas de ônibus, no entanto, são desconhecidos: desde março deste ano, a auditoria e consultoria EY analisa as tabelas das empresas de ônibus com o objetivo de conferir se as informações prestadas pelas empresas são verdadeiras ou se mascaram os verdadeiros resultados financeiros para garantir maiores repasses do poder público e oferecer reajustes salariais menores aos trabalhadores.
"O grande problema, hoje, é que discutimos esse assunto no escuro. Nós já analisamos algumas planilhas e é difícil saber se é o que se refere à realidade. Só a auditoria pode nos revelar a relação entre o lucro delas e a manutenção do sistema", afirma Maurício Broinizi, coordenador da Rede Nossa São Paulo e integrante do Conselho da Cidade. "Mas, neste momento, me parece que não cabe novo reajuste", completa. A previsão é que a auditoria apresente relatórios em julho deste ano.
Além da auditoria, uma Comissão Parlamentar de Inquérito conduzida na Câmara entre fevereiro de 2013 e fevereiro de 2014 analisou as planilhas e chegou à conclusão de que é necessário modificar a forma de prestação de contas das empresas para garantir maior transparência aos indicadores, de difícil compreensão e verificação.
As empresas de ônibus operam as cerca de 1,3 mil linhas de ônibus que atendem à cidade, organizadas em oito áreas em torno da região central de São Paulo. As linhas são divididas ainda entre estruturais, que conectam diferentes zonas da cidade, e locais, que cuidam do transporte dentro dos bairros. Para essas linhas, há dois tipos de contratos diferentes, o de concessão, praticado para as linhas estruturais e para as quais são contratadas empresas de grande porte, e de permissão, praticado para as linhas locais e atendido por cooperativas e organizações de menor porte.
São, no total, 16 consórcios, um concessionário e um permissionário por área do transporte público. A paralisação iniciada nesta semana compreende funcionários de empresas concessionárias que ficam com, aproximadamente, 60% do valor pago pela SPTrans a todas as empresas de transporte que atendem linhas em São Paulo.

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